O governo americano comprou acesso a um banco de dados capaz de mapear os movimentos de milhões de celulares nos EUA e tem usado a localização para fiscalizar as fronteiras. As revelações são do jornal The Wall Street Journal, que teve acesso a documentos sigilosos e conversou com pessoas envolvidas na operação.
Os dados de localização vêm de aplicativos comuns em muitos smartphones, como jogos, serviços de previsão do tempo e até de comércio eletrônico – é normal que usuários concedam permissão para registrar a localização dos telefones durante o cadastro.
O jornal informa que os dados serviram para identificar imigrantes que foram presos e procurar atividades de telefones celulares em locais incomuns, como áreas remotas do deserto nas proximidades da fronteira mexicana.
O Departamento de Segurança Interna dos EUA usou as informações para detectar imigrantes sem documentos e outras pessoas que possam estar entrando ilegalmente no país, de acordo com funcionários e documentos oficiais. É a primeira vez que se fala nesse tipo de monitoramento de celular por parte do governo americano.
De acordo com contratos analisados pelo jornal, o governo começou a comprar os dados em 2017. No ano seguinte, o Departamento de Imigração e Alfândega dos EUA (ICE, na sigla em inglês), responsável pelas deportações, gastou US$ 190 mil nesse tipo de serviço.
Os dados também são utilizados pelo Escritório de Alfândega e Proteção de Fronteiras (CBP, na sigla em inglês) para, por exemplo, rastrear atividades incomuns em áreas do deserto e combater travessias ilegais e o narcotráfico. Em setembro do ano passado, o CBP pagou mais de US$ 1 milhão (R$ 4,3 milhões) por licenças de software para acessar dados de localização procedentes de telefones celulares.
"Esta é uma situação clássica em que a crescente vigilância no setor privado está agora indo diretamente para o governo", afirmou ao jornal Alan Butler, conselheiro do Centro de Informações sobre Privacidade Eletrônica, um centro de estudos que defende leis de privacidade mais duras.
De acordo com analistas, a dimensão das informações configuram "uma das maiores quantidades de dados em massa acessados pela polícia dos EUA". Apesar disso, os dados foram comprados de um fornecedor comercial, o que é permitido por lei, assim como qualquer empresa privada poderia ter feito. Mesmo assim, o Wall Street Journal lembra ainda que o tema pode acabar sendo contestado nos tribunais.
A reportagem cita que os dados detectaram celulares se movendo por uma região onde mais tarde seria descoberto um túnel construído por narcotraficantes, entre EUA e México, que terminava em uma loja fechada da Kentucky Fried Chicken, no lado americano, perto de San Luis, no Arizona.
Por fim, o Wall Street Journal diz que o governo americano reconheceu a compra do acesso aos dados, mas não deu detalhes sobre seu uso. "Pessoas envolvidas na operação dizem que os dados são usados para produzir pistas de investigação sobre possíveis travessias ilegais e para rastrear grupos de migrantes", afirma o jornal.
Um relatório de 2017, publicado pelo Detroit News, mostrou que agentes americanos estavam usando um dispositivo de espionagem conhecido como "Stingray" – capaz de interceptar ligações e mensagens – para vigiar imigrantes ilegais em Detroit. O aparelho foi usado para capturar salvadorenhos ilegais que trabalhavam em um restaurante da cidade.
Segundo relatório recente do Congresso dos EUA, o Departamento de Segurança Interna trabalha com quase 124 dispositivos de vigilância que simulam o funcionamento das torres de telefonia e são capazes de detectar sinais de celular.
O governo americano também passou a usar as redes sociais na repressão à imigração ilegal. Em outubro, o New York Times revelou como os agentes do ICE usavam vários métodos online para atrair, vigiar e rastrear imigrantes ilegais que viviam no Estado de Washington. (Com agências internacionais)
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>