Em discurso nas redes sociais e em informativo para a imprensa, o prefeito de Guarulhos Lucas Sanches disse que um mutirão para acabar com as filas de consultas em Guarulhos atendeu mais de mil pessoas no HMU no último sábado. Porém, o GWeb constatou que o local não tem capacidade para realizar esse número de atendimentos em um dia. O número não teria chegado nem à metade do anunciado.
Em resposta a perguntas feitas pelo GWeb, a Prefeitura mudou o discurso. Em vez de afirmar que realizou as mil consultas, usou o termo “agendou”. Mesmo assim, o número de médicos disponibilizados para o mutirão não conseguiriam atender o número anunciado, o que confirma que o anúncio de Lucas foi superestimado.
Para atender mil pessoas no período de oito horas, entre 8h e 17h, por exemplo, com uma hora de almoço, seria necessário que 125 pessoas passassem por hora pelos médicos. Como cada médico, por determinação dos órgãos de saúde, deve realizar uma consulta em 15 minutos, cada profissional teria a capacidade de atender 4 pacientes por hora. Ou seja, para atender 125 pessoas por hora, o HMU precisaria ter disponibilizado 31 médicos em consultórios diferentes.
Mesmo que se admita que cada atendimento seja realizado em 10 minutos, o que não é indicado, um médico atenderia 6 pacientes por hora. Desta forma, o número de profissionais necessários para atender a demanda cairia para 20. Porém, o hospital escolhido para tal mutirão não tem nem espaço nem mesmo capacidade para dar fluidez a essa quantidade de atendimentos.
Na resposta, o Governo Lucas confirmou que disponibilizou apenas 10 médicos, no período das 7h às 19h, ou seja durante 12 horas. Não informou, entretanto, se todos os 10 atenderam 12 horas de forma ininterrupta, o que seria impossível, já que os profissionais precisam ter descanso e horário para refeição.
O GWeb, a partir de informações de funcionários do HMU que não quiseram se identificar temendo represálias, também constatou que o atendimento no sábado utilizou entre 6 e 10 consultórios. Desta forma, levando em consideração que pudessem ser 10, seria necessário que cada um deles prestasse atendimento à população durante 16 horas seguidas ininterruptas, ou seja, desde às 6h ou 8h até às 22h ou meia-noite respectivamente. No entanto, isso não ocorreu.
Como o mutirão no último sábado, que não foi informado à população com antecedência, durou no máximo oito horas e admitindo que 10 consultórios tenham sido utilizados o tempo todo neste período, chega-se a no máximo 480 atendimentos, ou seja, menos da metade do anunciado e comemorado em redes sociais.
A imprensa oficial
Em material divulgado nesta segunda-feira, a Prefeitura informa que realizou uma força-tarefa, que batizou de Fila Zero, no último sábado com um mutirão de atendimentos no HMU. “Durante todo o dia, guarulhenses cadastrados receberam atendimento agilizado e sem filas, com especialistas nas áreas de urologia, cirurgia vascular e cirurgia geral. Mais de 1.000 atendimentos foram realizados”, informa o texto oficial.
Segundo a Secretaria de Saúde, foram atendidos “pacientes pré-agendados que aguardavam o serviço por dois ou até quatro anos”. No entanto, a ação não foi comunicada à população com antecedência. O HMU também não é o local apropriado para tal tipo de atendimento, já que atua como hospital de urgências, atendendo outras prioridades da população.
Para a realização de consultas de especialidades, Guarulhos conta com 5 Cemegs (Centros de Especialidades Médicas) espalhados pelos municípios e também nos bairros. Aliás, essas unidades não estão realizando os atendimentos à população, já que os contratos com a empresa terceirizada que fornece esses profissionais não foi renovada no final de novembro. Licitação marcada para o início de dezembro acabou sendo barrada pela Justiça.
A secretária-adjunta da Saúde, Flávia Verdugo, no informe à imprensa, classificou como positivo o mutirão como uma das medidas da Prefeitura de Guarulhos para agilizar o atendimento da saúde aos munícipes. “Estudamos as maiores filas de espera de acordo com a especialidade, que são os pontos críticos da saúde. Estamos muito felizes com os resultados. Este é o pontapé inicial do programa Fila Zero, vamos trabalhar para zerar as filas de exames e consultas para a população ter finalmente ter um melhor acesso à saúde”, declarou.
Fila Zero X Zera Fila
Há dois anos, o governo Guti promoveu o “Zera Fila”, quando a Secretaria Municipal de Saúde precisou de duas a três semanas para o planejamento das ações, contratação de médicos, construção de estruturas alternativas para não atrapalhar os atendimentos de rotina, além de divulgação e convocação da população.
No início de dezembro de 2022, quando o programa teve início com o apoio do Governo do Estado, que custeou os investimentos necessários para a contratação de profissionais, Guarulhos tinha 380.520 consultas, cirurgias e exames na fila de espera. Eram 207.828 pacientes esperando consultas especializadas, 171.560 que aguardavam exames e 1.132 solicitações de cirurgias eletivas.
No final de janeiro, a Prefeitura anunciou que tinha realizado até ali 182.378 procedimentos de saúde em todas as regiões da cidade, sendo 116.698 consultas e 65.680 exames. O esforço significou uma redução de 53,64% nos cerca de 340 mil exames e consultas em fila de espera no município à época. Muitas pessoas contatadas e que constavam estar na fila sequer responderam aos chamados na Prefeitura à época, o que revelava que a demanda era menor do que a registrada.
Perguntas enviadas ao Governo Lucas
Abaixo, a íntegra da demanda enviada pelo GWeb à Subsecretaria de Comunicação da Prefeitura de Guarulhos:
Caros, no último sábado em vídeo postado nas redes sociais o prefeito Lucas Sanches afirmou que Guarulhos tem 500 mil pessoas na fila por atendimentos, somando consultas e exames.
Também disse que lançou o programa Fila Zero que atendeu 1.000 pessoas no HMU no sábado. No mesmo dia, a Prefeitura divulgou um post sobre o programa Mutirão HMU.
Porém, nada havia sido divulgado sobre isso antecipadamente.
Gostaríamos de saber:
– Que tipos de procedimentos essas 500 mil pessoas esperam para realizar?
SEM RESPOSTA
– Quantas consultas? Em quais especialidades?
SEM RESPOSTA
– Quantos exames? Quais seriam esses exames?
SEM RESPOSTA
– Quantas cirurgias? Quais?
SEM RESPOSTA
Sobre os atendimentos no último sábado, gostaríamos de saber
– Quantos pessoas foram atendidas no HMU no sábado?
R – Foram agendados 1.000 pacientes nas especialidades de Urologia, Cirurgia Geral e Vascular.
– Como essas pessoas foram chamadas já que não houve uma convocação prévia?
R – Os pacientes foram agendados via Regulação Ambulatorial, pacientes estes que se encontravam em fila de espera e foram acionados por meio de ligações telefônicas e via SMS. Além disso, ocorreu uma busca ativa nas unidades de saúde de referência de cada paciente, garantindo um processo eficiente de comunicação e agendamento.
– Quantos médicos participaram desses atendimentos?
R – Participaram do mutirão dez profissionais médicos.
– Quem contratou esses médicos, já que é de conhecimento público que a Prefeitura não conta com profissionais nem mesmo para atender a demanda diária?
R – Os recursos utilizados para a execução do mutirão foram contemplados no contrato vigente do Hospital Municipal de Urgências (HMU).
– Foram contratados via alguma empresa terceirizada? Por qual valor?
R – Os recursos utilizados para a execução do mutirão foram contemplados no contrato vigente do Hospital Municipal de Urgências (HMU).
– Em qual período foi realizado esse “mutirão”?
R – O mutirão foi realizado no dia 18 de janeiro de 2025, sábado, com atividades ocorrendo das 7h às 19h. As consultas foram efetuadas nos consultórios de atendimento ambulatorial do Hospital Municipal de Urgências (HMU).
– Qual estrutura do HMU foi utilizada para realizar essas consultas, já que o Hospital não conta com um número de consultórios capaz de atender essa grande demanda?
SEM RESPOSTA
– Por fim, qual o nome deste programa, já que o prefeito anunciou um nome e a Prefeitura outro?
R – O programa é oficialmente denominado Fila Zero. Os mutirões, por sua vez, são iniciativas específicas implementadas para garantir que o programa opere de maneira eficaz, atendendo à demanda existente.