Eles chegaram a Guarulhos na década de 1940. Na Europa, a guerra arrasava famílias e muitas delas encontraram no Brasil, uma alternativa, às vezes a única para sobreviverem e darem condições de seus filhos crescerem em paz.
Foi assim com a família alemã Falkeburg. Quando Hans Richard e Frida chegaram ao Brasil, apostaram em uma padaria como meio de manter financeiramente a família, além de preservar aspectos da cultura do país por meio dos quitutes alemães. O ponto mudou de acordo com o tempo. Hoje, a pequena padaria funciona na Rua Lourdes Rabello, 217, na Vila Galvão.
Com a morte de Hans e Frida, a missão de continuar a tradição ficou com a nora, dona Lourdes Falkenburg, que ficou casada por 34 anos com Richard Falkeburg. “Acho que era uma missão de vida, continuar esse trabalho. Espero que meus netos continuem”, disse Lourdes, referindo-se a Camila, 26 anos, e a Mateus, 22.
Conversamos com Camila, entre uma fornada e outra de um sábado bem movimentado na padaria. Às 10h já havia clientes no balcão da padaria provando as Nozes de Mel, um pãozinho cheiroso com toques de canela bem açucarado. “Acabei de tirar do forno, veja se gosta”, disse a jovem fotógrafa que está em fase de aprendizado.
Escola – Ela aprende tudo com Domingos Stambone, o padeiro de 74 anos, que desde os 12 trabalha na padaria da família Falkenburg. “O Mingo (como chamam carinhosamente senhor Domingos) é como meu avô. Ele é essencial aqui. Sem ele não teria padaria, ele aprendeu tudo com o meu opa (avô)”, disse a brasileira Camila, com seu jeito alemão herdado.
Ela conta que como Mingo morava no mesmo quarteirão da padaria, ele sempre estava por lá aprendendo em cima de um latão, já que não tinha altura para acompanhar os trabalhos do senhor Hans. Foram muitas as tentativas de entrevista com Mingo, mas sem sucesso, o trabalho o impediu de que falasse mais sobre o passado da padaria. Em um breve momento, enquanto tirava os biscoitos – dos tradições latões – para um dos clientes, desabafou.
“Isso aqui é minha vida. Aprendi tudo com o senhor Hans e tem sempre muito trabalho a fazer. Desculpe se não posso falar com você, agora”, disse o homem com os olhos azuis marejados. Emocionado. “Esse rapaz aí, o Mingo, eu o conheço desde sempre e ele mantém a qualidade dos produtos”, contou um dos clientes mais fieis da padaria dos Falkenburg, José Alberto Alrajec, 66 anos.
Desde 1962, Albert conhece a padaria. Ia com o pai, no antigo Chevrolet. “A gente vinha buscar aqui (os biscoitos). Era quase todo final de semana. Antes era fabricado em um local com forno à lenha, e eu sempre considerava como um local sagrado, cheio de segredos. O senhor Hans gostava de pescar no Pantanal, tinha um barco no quintal e fazia tudo muito bem feito, tanto que os biscoitos continuam até hoje”.
A qualidade dos biscoitos é tão elogiada, que comprá-los ali, na rua de paralelepípedos da Vila Galvão passou a ser tradição na família dos clientes. “Já tenho netos que gostam de comprar. Vir aqui já é tradição na minha família. Recomendamos muito. É excelente”, disse Vilma Alrajec, 68 anos, casada há 42 com José Alberto.
Engana-se quem pensa que a padaria funciona em um grande e bem decorado espaço de Guarulhos. A pequena padaria, localizada na Rua Lourdes Rabello, é discreta. Tem um toldo amarelo, um jardim bonito e um sino, que serve como campainha. No portão de ferro marcado pelo tempo há um cartaz simples com o nome das guloseimas.
Quem quiser conhecer alguns dos sabores da cultura alemã pode se aventurar por ali. Além dos biscoitos amanteigados, há o stollen, o pão alemão de Natal, o strudel e o apfelstrudel, as nozes de mel, além dos pães de centeio, glúten e integral. Não esqueça de levar dinheiro, pois a pequena e artesanal padaria não aceita pagamentos em cartão.