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HTML – O Corpo Hypertexto segue em cartaz até este sábado

HTML, você sabe, é o conjunto das iniciais, em inglês, de Linguagem de Marcação de Hipertexto (Hyper Text Markup Language), e identifica um padrão empregado na construção de páginas web. Agrega distintos textos, que vão se reunindo no hipertexto. Pois bem, é exatamente isso que Luís Ferron e Daniela Dini, acompanhados pelo músico Teo Ponciano, fazem na sua mais recente criação, que se chama, com toda a propriedade, HTML – O Corpo Hypertexto, em cartaz até este sábado, 13, no Centro de Referência da Dança – CRD.

Ser levado pelo tipo de linkagem que pipoca durante a navegação na internet. Ser levado pelo que antes pareceria aleatório, mas hoje funciona como um modo de existir cotidiano. Ser capturado pela inteligência que não cessa de jorrar durante os 50 minutos em que os três artistas se dedicam a montar legos, que não estão lá para se encaixar, apenas para um tirar o outro para dançar.

Por que é de dança mesmo que se trata. Dança stricto sensu. As referências do percurso de cada um assomam, mas só para dizer presente, sem nenhuma ambição de protagonismo. Parece um chafariz de coexistências do on com o off line. Jorra um rastro de candomblé aqui, um vestígio de samba ali, de danças de salão e de danças da night e da mídia, e as informações migram de um para o outro corpo, que vão parecendo telas nas quais as encontramos. As referências kitsch dos clichês das danças também se enroscam nas frases coreográficas que surgem. Vão jorrando como se fossem pecinhas de um quebra-cabeça gigante, que não vai ficar pronto porque as pecinhas não vão parar de ser produzidas.

Esse HTML hipertextualiza uma coleção de associações, às vezes mais, às vezes menos livres – porque é desse tipo de convivência, hoje normalizada pelos nossos hábitos de internautas, que se trata. Talvez possa ser identificada como uma lógica da conectividade expansiva, porque não se tece apenas pelo aumento da coleção de associações. Essa conectividade vai operando em níveis diferentes, é ela mesma que se expande, como se abolisse a necessidade de se manter dentro do critério que iniciou a conexão.

No corpo dos dois intérpretes, as informações particulares que os constituem se atraem como ímãs e vão transbordando referências às culturas pop e populares. A certa altura, precisam que o espaço, já materializado nas sonoridades de Teo Ponciano, que o desenham como um mosaico de mesma lógica, permanentemente desencaixado, seja complementado por outras referências. Da plateia, dois são convidados a pilotar brinquedos de controle remoto travestidos – metáforas para a infantilização dos sujeitos mimados que agora somos (na internet, só fazemos o que queremos), para a conversa sobre quem comanda quem, para refletirmos sobre esse emaranhado cada vez mais denso de simultaneidades que não se tocam, não se olham e, portanto, não se reconhecem como partes de um mesmo todo.

Não faltam boas escolhas para a torrente de imagens e sons que Ferron, Dani Dini e Teo põem em cena. Quem vem pensando sobre as relações entre o estar diante das telas e o comportamento fora delas, encontra muitos estímulos instigantes em HTML, a sua mais recente criação. O analógico está perfurado pela traça do digital, expondo, com muita potência, que o mundo que produz o Pokémon Go não pode ser entendido fora da moldura política da sociedade.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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