Um personagem da Casa da Morte, local de tortura do regime militar em Petrópolis, no Rio de Janeiro, teve a identidade revelada. O ex-agente militar Antonio Waneir Pinheiro Lima, o “Camarão”, de 71 anos, foi identificado por procuradores federais como o homem que atuava como carcereiro na residência. Ele chegou a ser detido e interrogado, no último fim de semana, pela Polícia Federal no Ceará.
A Comissão Nacional da Verdade (CNV) e a Comissão Estadual da Verdade do Rio de Janeiro, grupos criados para investigar crimes praticados por agentes do Estado, decidiram fazer uma convocação conjunta do soldado reformado do Exército. Até o começo da noite desta terça-feira, a data do depoimento ainda não tinha sido fechada. A expectativa é de que Lima seja ouvido até o final deste mês, pois a CNV praticamente encerrou seus trabalhos e deve apresentar um relatório final no dia 10 de dezembro.
A busca pelo paradeiro do ex-agente começou há dois meses. Uma equipe da Justiça de Transição, grupo de trabalho do Ministério Público Federal, conseguiu localizá-lo em Tauá, cidade a 337 quilômetros de Fortaleza. Ele foi levado por policiais federais até a capital, onde prestou depoimento. A história da identificação e detenção de Lima foi divulgada hoje pelo jornal O Globo.
A Casa da Morte de Petrópolis, como ficou conhecida a residência localizada no Caxambu, bairro da cidade serrana do Rio, era mantida pelo Centro de Informações do Exército (CIE), órgão que centralizava o combate às guerrilhas urbanas e rurais. A estrutura do local foi revelada por Inês Etienne Romeu, ativista de direitos humanos e ex-militante da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR). Em depoimento à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em 1979, ela contou que ficou em cárcere privado na residência entre maio e agosto de 1971, período em que passou por sessões de tortura. Inês apresentou uma lista de 19 militares que torturavam prisioneiros no centro clandestino. Um deles tinha o codinome de “Camarão”. Ela relatou ainda que foi estuprada duas vezes pelo então carcereiro da casa.
Na Polícia Federal, em Fortaleza, no último fim de semana, Antonio Waneir Pinheiro Lima admitiu ter atuado como “vigia” da Casa de Petrópolis, mas não respondeu a perguntas sobre o que se passava no interior da residência. Ele reside em Araruama, no Rio, mas teria se mudado para casa de parentes no Ceará com intuito de ficar longe de procuradores e jornalistas.
A história do ex-agente Lima e de outros torturadores da Casa de Petrópolis não chegou a ser aprofundada pela Comissão Nacional da Verdade. Entidades de direitos humanos dizem não ter expectativa em relação ao relatório que será apresentado. A comissão chegou ouvir o ex-agente Marival Dias Chaves do Canto, em maio do ano passado, e o coronel da reserva Paulo Malhães, em maio deste ano, sem avançar nas informações divulgadas pela imprensa. Em 1992, Marival relatou à revista Veja que presos políticos como David Capistrano, José Roman, Rosa Kucinski e Wilson Silva foram mortos e esquartejados no centro de tortura de Petrópolis. Ele ainda divulgou os nomes dos oficiais Paulo Malhães e Fred Perdigão que atuaram na residência.