A pressão inflacionária sobre o orçamento das famílias já implica em aumento na inadimplência. Na capital paulista, os atrasos nos pagamentos em março atingiam 23,1% dos lares e alcançaram o maior nível da série histórica iniciada em 2010. É o que mostra a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP).
Ainda, de acordo com os técnicos da FecomercioSP, a limitação das compras em decorrência do aumento da inadimplência ditará um ritmo mais fraco nas vendas no primeiro semestre.
Atualmente, aponta a Peic, 927 mil lares estão com as contas em atraso. São 55 mil a mais do que em fevereiro e 194 mil acima do registrado no mesmo período de 2021. O porcentual de famílias que já afirmam que não conseguirão pagar as dívidas atingiu o maior patamar desde outubro de 2018. São 9,4% nesta situação.
"Em termos absolutos, 374,7 mil vão precisar renegociar com bancos, financeiras e lojas para evitar multas e juros elevados, que já agravam a situação, pois há mais incidência de taxas, e, consequentemente, sobram menos recursos para o consumo diário", preveem os técnicos da FecomercioSP.
Quando se analisa a relação dos dados com as faixas de renda, a pesquisa mostra que a inadimplência atinge 27,7% das famílias que recebem menos de dez salários mínimos. Já o endividamento impacta 77,2%.
"Apesar de os efeitos serem mais sentidos entre os menos favorecidos, em março, o endividamento e a inadimplência das famílias com renda superior a dez salários mínimos atingiram recordes históricos: 66,1% e 11,4%, respectivamente", observam os responsáveis pelo levantamento.
Em março, o endividamento voltou a subir e alcançou 74,3% dos lares. São 2,98 milhões com algum tipo de dívida – aumento anual de 627 mil.
Para 88,5%, o cartão de crédito continua sendo o principal meio para compras a prazo. Na segunda posição, ficaram os carnês, com 18,3%. O porcentual registrou a segunda queda consecutiva e o menor patamar desde julho do ano passado, reflexo dos aumentos dos juros e do risco de inadimplência, que têm levado os estabelecimentos a restringirem este tipo de crédito. Na sequência, ficaram o financiamento de carro (14,4%) e o crédito pessoal (10,7%).
<b>Crédito</b>
De acordo com a pesquisa da FecomercioSP, 7,2% dos entrevistados pensam em contrair crédito ou financiamento nos próximos três meses – maior porcentual desde maio de 2020. Destes, 66,4%, afirmam que usariam o crédito para consumo; 21,5%, para quitação de dívida; e 9,4%, para pagamento de contas. Entretanto, apesar de a maior parte ser destinada às compras, diante do cenário atual, o que pode justificar esta intenção são os gastos básicos com alimentos, e não a expansão do consumo em bens duráveis, por exemplo.
Exemplo disso é o Índice de Intenção de Consumo das Famílias (ICF), que registrou alta de 1,5% em março (76,4 pontos), mas alavancado pelos itens de emprego. O Emprego Atual avançou 5,7%, chegando aos 97,7 pontos, quase o mesmo nível da Perspectiva Profissional (97,9), que apontou aumento de 3% em março. Ambos estão nos maiores patamares desde o início da pandemia, em abril de 2020.
A melhoria do mercado de trabalho, segundo a FecomercioSP, consegue recompor a renda das famílias para se protegerem da inflação. Entretanto, seria necessário um volume maior de investimentos para criar mais oportunidade e de maneira mais rápida. Na avaliação da FecomercioSP, porém, o aumento dos juros deve limitar a intenção de investimentos das empresas, mantendo a situação ainda delicada para o resto do ano.