Estadão

Informações enviadas pelo Telegram ao STF destravam investigação do MPF sobre combate de fake news

As informações prestadas pelo aplicativo de mensagens Telegram ao Supremo Tribunal Federal (STF) no último domingo, 20, para reverter a ordem de bloqueio "completa e integral" do funcionamento da plataforma no Brasil dada pelo ministro Alexandre de Moraes, devem ser aproveitadas em outra frente de investigação: a que apura a conduta das principais redes sociais para conter o compartilhamento de conteúdos falsos e radicais.

Embora tenham garantido em um primeiro momento a continuidade das operações da empresa em território brasileiro, as medidas anunciadas pelo Telegram estão sendo analisadas pela Procuradoria dos Direitos do Cidadão em São Paulo no inquérito aberto em novembro do ano passado para minimizar o impacto da desinformação na internet em direitos fundamentais, como saúde pública e exercício de direitos políticos. O foco da investigação são as medidas adotadas pelas plataformas de redes sociais e de mensagens contra a disseminação organizada e dolosa de conteúdos falsos, sobretudo nos casos em que há ganhos políticos ou financeiros.

O <b>Estadão </b>apurou que, a partir desses primeiros elementos fornecidos pelo Telegram, o Ministério Público Federal (MPF) vai começar o escrutínio sobre a política de moderação e autorregulação da plataforma. Há uma preocupação com o efetivo cumprimento dos compromissos sinalizados ao STF. Um dos pontos de interesse é sobre como se dará a operacionalização do monitoramento manual dos canais mais populares no Brasil.

A resposta do Telegram ao Supremo Tribunal Federal, sob ameaça de suspensão das atividades, inaugura o diálogo do aplicativo russo com as autoridades brasileiras. Até então, a plataforma vinha ignorando todas as tentativas de contato. O próprio MPF tentava notificar o aplicativo em busca de informações desde dezembro do ano passado. O órgão chegou a mobilizar, inclusive, o setor de cooperação internacional e a obter uma autorização da Justiça Federal para intimar escritórios do Telegram em Dubai e no Reino Unido. Em paralelo, estudava medidas de contenção caso a empresa não respondesse as cobranças, como a suspensão nas lojas virtuais de aplicativos e o ajuizamento de ação para impor sanções. Com a designação de um representante legal da empresa no País, também por ordem do STF, o Ministério Público Federal finalmente conseguiu um canal de contato para requisitar as primeiras informações sobre a política de enfrentamento da plataforma a práticas de desinformação e violência digital.

Outras seis plataformas também são investigadas no mesmo inquérito – Facebook, Twitter, WhatsApp, TikTok, YouTube e Instagram. Todas receberam questionamentos individualizados, de acordo com as especificidades de cada rede social ou aplicativo, e já enviaram suas respostas em mais de uma centena de páginas cada. Para três delas houve uma rodada adicional de perguntas. As dúvidas giram em torno dos mecanismos usados para identificar o comportamento de robôs e a disseminação organizada de fake news; os canais de denúncia disponibilizados aos usuários e se estão em português; as sanções previstas nos termos de uso para o compartilhamento de conteúdos falsos; a taxa de publicações inverídicas derrubados automaticamente e por determinação judicial, entre outros.

Após a análise de todas as informações prestadas, o MPF vai começar a organizar audiências públicas para sabatinar individualmente cada uma das empresas. A ideia é engajar representantes de organizações da sociedade civil e pesquisadores da área de tecnologia no debate.

Uma das alternativas estudadas pela procuradoria é propor Termos de Ajustamento de Conduta (TACs), o que na prática livraria as plataformas de eventuais ações judiciais em troca do cumprimento de exigências fixadas pelo Ministério Público Federal para corrigir falhas e melhorar mecanismos de controle de fake news. Caso as negociações não avancem, o órgão poderá considerar medidas mais duras na Justiça.

Procurado pela reportagem, o escritório Campos Thomaz Advogados, que representa o Telegram, informou que "não comenta os casos envolvendo os seus clientes, incluindo o Telegram".

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