Exatos oito meses após o envio da proposta de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2021, a equipe econômica definiu um valor para a meta fiscal e prevê rombo de até R$ 247 bilhões no ano que vem. Com despesas limitadas pelo teto, que restringe o avanço dos gastos à inflação, o texto agora está sendo usado pelo Congresso Nacional como instrumento de manobra para dar mais poder ao relator do Orçamento na destinação de recursos e para retirar qualquer barreira à execução de obras no ano que vem. A votação está prevista para hoje.
A votação da LDO ocorre a 15 dias do fim do ano. Ela precisa acontecer para evitar um apagão no governo no início de 2021, já que faltaria base legal até para pagar aposentadorias, salários e benefícios sociais.
O relator da LDO, senador Irajá (PSD-TO), voltou a incorporar a previsão de emendas apontadas pelo relator-geral do Orçamento e pelas comissões do Legislativo, medida que já havia sido polêmica no ano passado e que tentou ser combatida pela equipe econômica, sem sucesso. Na prática, o dispositivo dá ao relator poderes para cortar gastos de ministérios para alocar em despesas de seu interesse. Em 2019, as negociações resultaram em R$ 30,8 bilhões abocanhados pelo relator-geral do Orçamento e pelas comissões, valor que só diminuiu porque os gastos com a pandemia foram prioritários.
Neste ano, o relator do Orçamento é o senador Marcio Bittar (MDB-AC), que foi o responsável pelo parecer do Senado sobre o programa habitacional Casa Verde Amarela e também vai relatar a PEC emergencial, que contém gatilhos de contenção de despesas e teve a votação adiada para 2021 para evitar desidratação das medidas mais radicais, como a proposta de reduzir jornada e salário de servidores.
A apropriação de uma parte do Orçamento pelo relator-geral está sendo vista como uma chance para maior poder de barganha em negociações delicadas para o governo. A proposta ainda incluiu outros pontos vistos como "tradicional populismo", como restringir bloqueios de algumas categorias de despesa e aumentar as emendas de bancada para o máximo permitido na constituição.
A votação da LDO ocorre em meio à acirrada disputa pela eleição dos presidentes da Câmara e do Senado. Por conta disso, a atuação da equipe econômica nas negociações tem sido contida pela articulação política do Palácio do Planalto sob o comando do ministro-chefe da Secretaria de governo, Luiz Eduardo Ramos. O governo não quer confusão com parlamentares com chances de ganhar as eleições do Senado.
<b>Obras</b>
O relator também incluiu em seu parecer um dispositivo que abre a porteira para ministérios empenharem gastos que serão executados apenas em anos seguintes, o que poderia ampliar o valor de despesas roladas de um ano para o outro e pressionar ainda mais o teto de gastos. Na prática, se esse instrumento for aprovado, um ministério poderá usar espaço no Orçamento de 2021 para destinar recursos a obras que serão tocadas apenas em 2022 ou 2023, por exemplo. Entre os beneficiários da medida está o Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR).
O MDR, apurou a reportagem, celebrou a manutenção do artigo. A equipe econômica, que geralmente se posiciona na trincheira oposta à do MDR na batalha por gastos, entende que a redação ficou adequada e aposta na manutenção de outras regras fiscais para conter o apetite gastador dos ministérios. Técnicos de fora do governo, por sua vez, veem brechas para se criar uma bola de neve de gastos para anos seguintes. A própria "concordância" entre MDR e Economia é vista como sinal de alerta de que o dispositivo representa perigo a um dos lados.
Em outra manobra para remover barreiras às obras, o parecer da LDO livra os municípios com até 50 mil habitantes de ficarem sem transferências do governo federal quando estiverem inadimplentes. O relator também acatou emendas de parlamentares para incluir o Casa Verde Amarela, programa do MDR de Rogério Marinho, entre as prioridades para 2021.
O governo reduziu em R$ 8,1 bilhões a previsão para as chamadas despesas discricionárias, que incluem custeio da máquina e investimentos, para 2021. Na prática, significa que a situação fiscal dos ministérios para fazer obras e adquirir bens e serviços ficou ainda mais apertada para o ano que vem. A previsão do governo é um gasto de R$ 83,932 com as discricionárias em 2021.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>