Estadão

Lula e Biden aceleram reunião para mostrar afinidade contra extrema-direita

A reunião dos presidentes do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e dos Estados Unidos, Joe Biden, nesta sexta-feira, 10, na Casa Branca, foi acelerada para mostrar afinidade contra a extrema direita. Diferentemente de outras visitas precedidas por semanas de intensa negociação bilateral e articulação diplomática para fechar anúncios em comum, desta vez não há a expectativa de um grande acordo. O mais importante, para petista e democrata, será o próprio encontro – e a foto dos dois juntos.

"O principal elemento a se destacar desta visita é o seu caráter político, a simbologia de ocorrer logo no início do mandato do presidente Lula", afirmou ontem o embaixador Michel Arslanian, a jornalistas, em Brasília.

Lula e Biden cogitaram se encontrar ainda antes da posse do brasileiro. Seria uma forma, na leitura dos dois lados, de expor o respaldo da comunidade internacional ao resultado da eleição no Brasil e tentar, com isso, arrefecer narrativas golpistas que estavam no radar de Washington desde 2021. Pelo mesmo motivo, a Casa Branca disparou um e-mail com reconhecimento do resultado das eleições brasileiras assim que viu o anúncio por parte do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em outubro do ano passado.

A reunião entre os dois presidentes não ocorreu em dezembro por incompatibilidade de agenda, e os americanos sugeriram, então, que Lula viajasse aos EUA na segunda semana de governo. O Planalto respondeu que logo no início do governo seria inviável e considerou o mês de fevereiro como a primeira data possível para o encontro.

Demonstrar apoio mútuo e discutir publicamente formas de conter o avanço de autoritarismos interessam a Biden e a Lula. Os dois se apresentaram aos eleitores como alternativa ao extremismo e prometeram fazer da defesa da democracia um pilar de seus governos, dentro e fora dos dois países.

Diplomatas envolvidos na organização da visita ressaltam o "caráter político" da viagem e o componente simbólico de indicar que, nos EUA e no Brasil, líderes populistas de direita que empreenderam ataques à democracia foram derrotados nas urnas. "Os dois países (estão) experimentando desafios semelhantes, há uma preocupação comum com o tema da radicalização, da violência política, do uso das redes para difusão de desinformação e discurso de ódio", afirmou Arslanian.

<b>Tratamento</b>

A pressa de Biden para se encontrar com Lula contrasta com o tratamento dispensado ao ex-presidente Jair Bolsonaro. Biden fugiu de uma foto com Bolsonaro o quanto pôde. Nunca falou por telefone com o ex-presidente, chamado pela imprensa americana de "Trump dos trópicos".

Os dois só se encontraram pessoalmente após Biden ver-se sem saída para convencer o Brasil a participar da esvaziada Cúpula das Américas, realizada em Los Angeles em 2022. Na ocasião, o americano fez questão de manter semblante sério diante das câmeras, ao se reunir com Bolsonaro.

Biden e Lula também querem indicar que vão tirar a relação bilateral do "banho-maria", como definiu Arslanian. Desde a eleição de Biden, Washington deu um gelo diplomático em Brasília, depois dos dois anos de "bromance" entre Bolsonaro e Donald Trump. O contato diplomático continuou a ocorrer, mas sem relação presidencial.

"Um encontro entre presidentes em que se consiga impulsionar, mesmo que do ponto de vista político, a relação bilateral, tem um significado e um valor muito grandes. Quando se tem um impulso político, isso ajuda a canalizar as burocracias na direção de resultados concretos", afirmou o CEO da Amcham Brasil, Abrão Neto.

<b>Clima</b>

Lula quer mostrar que há disposição para discutir questões climáticas, proteção da Amazônia e modelos de transição energética – por isso, levará em sua comitiva a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva -, e os EUA dão sinais de que vão retribuir os gestos.

O Brasil espera que os americanos anunciem na sexta-feira a entrada no Fundo Amazônia para destinar recursos para a preservação da floresta. Também há expectativa de que confirmem a vinda de John Kerry, enviado especial do clima, para visitar o Brasil.

Sobre questões econômicas, o CEO da Amcham ponderou que a ambição de Biden de aproximar dos EUA as cadeias de produção, tema recorrente entre americanos desde que eclodiram a pandemia de covid-19 e a guerra na Ucrânia, interessa a Lula, que defende uma política de reindustrialização nacional. O governo brasileiro considera, por exemplo, que algumas fases da cadeia de produção de semicondutores, incentivada pelos EUA, poderiam ser realizadas no Brasil.

<b> Clube da paz </b>

Mas Lula busca um protagonismo no plano multilateral maior do que o que a Casa Branca parece destinar a ele. O petista quer se colocar como um intermediador da paz na Ucrânia, com a criação do que chama de "clube da paz". O tema não consta da lista dos assuntos prioritários da Casa Branca, que espera ouvir do brasileiro como ele pode se posicionar como um intermediador para construir uma saída para a situação política da Venezuela de Nicolás Maduro.

Além de Marina, vão compor a comitiva de Lula a primeira-dama, Janja, o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, o assessor especial para assuntos internacionais, Celso Amorim, e a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco. O presidente pretende passar só um dia em Washington e terá encontro com parlamentares de esquerda, como o senador Bernie Sanders.

As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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