O procurador-geral da República, Augusto Aras, entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) contra leis estaduais do Maranhão que regulam a prestação do serviço de capelania nos quadros da Polícia Militar, Corpo de Bombeiros, Polícia Civil e Secretarias de Administração Penitenciária e de Segurança Pública. O Estado conta hoje com 60 servidores na função.
Os capelães são representantes religiosos que trabalham na prestação de assistência espiritual a pessoas presas e agentes das forças de Segurança. Pelas leis maranhenses, as vagas podem ser preenchidas por nomeação do governador. No entanto, na avaliação do chefe do Ministério Público Federal, a seleção deve ser feita via concurso público.
"As atividades dos capelães não pressupõem nenhum vínculo de confiança com o Governador do Estado ou com qualquer outra autoridade pública", argumenta Aras. "A realização de concurso para provimento de tais cargos (..) evita, ainda, prática recorrente e censurável de agentes dedicados à atividade política, consistente no uso de estruturas da administração pública para alojar correligionários e outras pessoas como forma de favorecimento, com fins pessoais ou eleitorais, sem maior apreço por sua qualificação profissional", acrescenta.
Há pelo menos um mês, uma equipe do Ministério Público Federal especializada em matéria constitucional analisa as leis e a viabilidade de acionar o Supremo para contestá-las. O procedimento administrativo interno foi aberto na esteira de representação, encaminhada ainda em 2018 pelo ex-procurador regional Eleitoral Pedro Henrique Oliveira Castelo Branco, pedindo a formalização de uma ação direta de inconstitucionalidade para derrubar os dispositivos.
No final de dezembro, o governador Flávio Dino (PCdoB) publicou um decreto para regulamentar a prestação do serviço de capelania no Estado. Desde então, os cargos já passaram a ser preenchidos exclusivamente via processo seletivo e não mais por nomeação. No entanto, o decreto, que não é submetido do Legislativo, tem força menor que a lei.
A reportagem procurou a advogada Anna Graziella, que encabeça uma ação na Justiça Eleitoral do Maranhão contra os dispositivos, para analisar a ação proposta por Aras. Ela considera que o caso pode virar um leading case nos tribunais superiores.
"Em boa hora o Procurador Geral da República reconhece a utilização espúria desses elevados cargos públicos, não para atender a valores republicanos, mas para satisfação de interesses eleitorais", afirma. "O tema está na pauta do dia da Justiça Eleitoral do Brasil e, o caso do Maranhão, chegará ao Tribunal Superior Eleitoral", acrescenta.
Procurado pela reportagem, o governo do Maranhão se manifestou.
"Sobre os cargos de capelania, a Secretaria Extraordinária de Relações Institucionais (SRI) esclarece que:
1. O serviço de Capelania Religiosa no Estado do Maranhão foi instituído no ano de 1943, sendo regulado por diversas leis, ao longo de décadas. Atualmente o serviço contempla diversas religiões existentes e encontra-se distribuído da seguinte forma:
a)- Na Polícia Militar: 20 cargos de capelães religiosos;
b)- No Corpo de Bombeiros Militar: 10 cargos de capelães religiosos;
c)- No Sistema Penitenciário: 20 cargos de capelães religiosos;
d)- Na Polícia Civil: 10 cargos de capelães religiosos.
2. Os capelães executam um trabalho respeitado pelo Sistema de Segurança e Penitenciário. Houve apenas uma ação judicial, de caráter puramente eleitoreiro, em 2018, que foi rejeitada por unanimidade no Tribunal Regional Eleitoral.
3. Lamentamos que alguns segmentos políticos queiram impedir a assistência religiosa garantida pela Constituição Federal. A Procuradoria Geral do Estado do Maranhão irá defender esse direito e o trabalho dos capelães, quando for necessário.
4. Quanto ao Decreto 36.422/2020, este é resultado de uma construção administrativa visando aperfeiçoar o trabalho das capelanias, estabelecendo inclusive, uma agenda de capacitação dos capelães, na busca por melhor integração entre as diversas capelanias existentes no governo do Estado do Maranhão.
Uma de suas finalidades é estabelecer uma coordenação para elaboração de um plano de trabalho anual que possibilite outras ações das capelanias do Estado junto à sociedade civil e órgãos do governo, como ocorreu durante período mais grave da pandemia de Covid-19, quando capelães prestaram assistência espiritual aos pacientes, familiares e profissionais da saúde, em hospitais de referência no tratamento da doença.
Outro objetivo do Decreto é estreitar a comunicação institucional com organizações religiosas por meio da SRI, visando a coordenação e supervisão do serviço de capelania. Portanto, o Decreto nada tem a ver com injustos e incompreensíveis ataques políticos aos capelães religiosos."
A reportagem busca contato com a Assembleia do Maranhão desde quarta-feira, 10. O espaço está aberto para manifestações.