Pouco antes do fechamento da Esplanada dos Ministérios para veículos e pedestres a partir da 0h deste domingo, cerca de 30 manifestantes bolsonaristas autodenominados "300 do Brasil" simularam com fogos de artifício um ataque ao Supremo Tribunal Federal (STF). Os fogos foram disparados às 21h30 na direção do edifício principal do STF, na Praça dos Três Poderes, enquanto os manifestantes xingavam ministros da Suprema Corte.
"Isso para mostrar ao STF e ao (Governo do Distrito Federal) GDF que nós não vamos arregar. Repararam que ângulo dos fogos está diferente da última vez? Se preparem, Supremo dos bandidos, aqui é o povo que manda. Tá entendendo o recado?", ameaçou um manifestante em vídeo nas redes sociais.
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, reagiu neste domingo, 14, aos ataques e lamentou que os episódios têm sido estimulados por integrantes do próprio Estado. Em nota divulgada nesta tarde, Toffoli disse que "o Supremo jamais se sujeitará, como não se sujeitou em toda a sua história, a nenhum tipo de ameaça, seja velada, indireta ou direta e continuará cumprindo sua missão".
"Infelizmente, na noite de sábado, o Brasil vivenciou mais um ataque ao Supremo Tribunal Federal, que também simboliza um ataque a todas as instituições democraticamente constituídas", diz Toffoli na nota. "Financiadas ilegalmente, essas atitudes têm sido reiteradas e estimuladas por uma minoria da população e por integrantes do próprio Estado, apesar da tentativa de diálogo que o Supremo Tribunal Federal tenta estabelecer com todos, Poderes, instituições e sociedade civil, em prol do progresso da nação brasileira."
O ministro do STF e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luís Roberto Barroso, escreveu em sua conta no Twitter que há diferença entre "militância e bandidagem" e que é preciso dar limites aos grupos chamados por ele de "guetos pré-iluministas".
"Há no Brasil, hoje, alguns guetos pré-iluministas. Irrelevantes na quantidade de integrantes e na qualidade das manifestações. Mas isso não torna menos grave a sua atuação. Instituições e pessoas de bem devem dar limites a esses grupos. Há diferença entre militância e bandidagem", escreveu Barroso.
O ministro Alexandre de Moraes, relator do inquérito das fake news na Corte, afirmou que o STF jamais se curvará ante "agressões covardes" de "organizações criminosas financiadas por grupos antidemocráticos que desrespeitam a Constituição Federal, a Democracia e o Estado de Direito".
O Ministro da Secretaria-Geral, Jorge de Oliveira Francisco, afirmou que ataque ao Supremo ou a qualquer instituição de Estado é contrário à democracia e deve ser repudiado. "Atitudes e pensamentos individuais não são mais importantes que nossos ideais", escreveu no Twitter.
Neste domingo, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, se reuniu com cerca de 15 manifestantes bolsonaristas que desrespeitaram a ordem do governo do Distrito Federal proibindo protestos na Esplanada dos Ministérios. Trechos das conversas entre Weintraub e os manifestantes foram divulgados nas redes sociais. Em um deles, o ministro diz "eu já falei a minha opinião, o que faria com esses vagabundos". O restante da fala é encoberto por aplausos dos manifestantes, que gritam "Weintraub tem razão".
Já o ataque com fogos à sede do Supremo foi divulgado em vídeo nas redes sociais. Nele, um homem profere insultos e menciona alguns nomes de ministros: Cármen Lúcia, Rosa Weber, Ricardo Lewandovski e Gilmar Mendes, além do próprio Dias Toffoli. "Desafiem o povo. Vocês vão cair. Nós vamos derrubar vocês, seus comunistas", ameaça um manifestante em outro vídeo, no qual também xinga o ministro do STF, Gilmar Mendes.
De acordo com a Polícia Militar do Distrito Federal, o grupo, que tinha cerca de 30 pessoas, realizou um culto na Praça dos Três Poderes antes de lançar os fogos.
Esse foi o último da sequência de atos realizados ontem pelo grupo liderado pela militante Sara Winter, ex-assessora de confiança da ministra Damares Alves, da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Após ter acampamentos ilegais desmantelados pela Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF), cerca de uma dúzia de manifestantes invadiu a cúpula do Senado. O grupo deixou o prédio do Congresso pacificamente após intervenção da Polícia Legislativa.
Na manhã de sábado, agentes da PMDF, do Corpo de Bombeiros e da Secretaria de Estado de Proteção da Ordem Urbanística (DF Legal) desmontaram e recolheram faixas, material de lona e estrutura metálica dos acampamentos. A PM usou gás de pimenta para dispersar um pequeno grupo que resistiu à ação.
Ainda ontem, o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB) decretou o fechamento da Esplanada dos Ministérios durante todo o domingo. No texto, Ibaneis cita "ameaças declaradas por alguns dos manifestantes" e destaca necessidade de "contenção de riscos, danos e agravos à saúde pública". A medida proíbe trânsito de veículos e determina acesso aos prédios apenas por autoridades, da 0h até as 23h59 de domingo.
O texto prevê que manifestações poderão ser realizadas, "desde que comunicada com antecedência e devidamente autorizada pelo Secretário de Segurança do Distrito Federal". O governo local, no entanto, não informou se há algum protesto marcado para este domingo com autorização para ocorrer.
Apesar da proibição para pedestres e veículos na Esplanada dos Ministérios, cerca de 15 apoiadores do presidente Jair Bolsonaro circulam pela Praça dos Três Poderes com bandeiras. Apesar de não ocorrer uma manifestação no momento, policiais tentam convencer essas pessoas a deixarem o local.
Em suas redes sociais, Sara Winter acusou o governador Ibaneis Rocha de "ditador" e cobrou a revogação do decreto que fechou a Esplanada, "Revogue agora mesmo esse decreto inconstitucional ou haverá consequências! Se você tirar o direito de ir e vir do povo, tiraremos o seu também!", escreveu.
Nos últimos domingos, a Esplanada foi palco de manifestações e carreatas por apoiadores e contrários ao governo Jair Bolsonaro. O presidente compareceu em alguns desses atos e já chegou a até sobrevoar manifestações de helicóptero.
Abaixo, a nota divulgada pelo ministro Dias Toffoli:
<i>Infelizmente, na noite de sábado, o Brasil vivenciou mais um ataque ao Supremo Tribunal Federal, que também simboliza um ataque a todas as instituições democraticamente constituídas.
Financiadas ilegalmente, essas atitudes têm sido reiteradas e estimuladas por uma minoria da população e por integrantes do próprio Estado, apesar da tentativa de diálogo que o Supremo Tribunal Federal tenta estabelecer com todos – Poderes, instituições e sociedade civil, em prol do progresso da nação brasileira.
O Supremo jamais se sujeitará, como não se sujeitou em toda a sua história, a nenhum tipo de ameaça, seja velada, indireta ou direta e continuará cumprindo a sua missão.
Guardião da Constituição, o Supremo Tribunal Federal repudia tais condutas e se socorrerá de todos os remédios, constitucional e legalmente postos, para sua defesa, de seus Ministros e da democracia brasileira.
Ministro Dias Toffoli
</i>
Presidente do Supremo Tribunal Federal