Jerry Lewis não desejava perder a parceria com Dean Martin, mas, ao iniciar sua carreira solo, sua vitalidade cômica tornou-se mais evidente, a ponto de ser aclamado pela crítica internacional, especialmente a francesa, que o via como gênio, enquanto era tratado apenas como um humorista em seu próprio país.
Com “Delinquente Delicado” (1957), direção e roteiro de Don McGuire, Lewis faz sua primeira aparição sem a companhia de Martin. Também responsável pela produção, ele interpreta o tal delinquente, que é protegido por um policial e se transforma em um brilhante recruta. Já “O Mensageiro Trapalhão” (1960) marca a estreia de Lewis na direção, além de ser o autor do roteiro. Ele vive um mensageiro trapalhão, que trabalha em um hotel onde se mete em diversas confusões.
Nesse início solo, também se destaca “Mocinho Encrenqueiro” (1961), o segundo filme dirigido por Lewis, que também escreveu o roteiro e ainda compôs algumas canções da trilha sonora. Como sempre, ele faz o papel de um atrapalhado (aqui, um contínuo), que espiona seus colegas de trabalho.
O melhor, no entanto, estava por vir. Em 1963, Lewis dirigiu sua obra-prima, “O Professor Aloprado”. Clássico insuperável da comédia, Lewis inverte o tema de “O Médico e o Monstro”, de Robert Louis Stevenson, e faz o que não deixa de ser a psicanálise da América, refletindo sobre os papéis sexuais na sociedade de seu país. A trama trata de um professor tímido e desajeitado que, cansado de ser motivo de piada, inventa uma fórmula capaz de transformá-lo em um conquistador seguro e habilidoso. O problema é que, nas horas mais impróprias, a fórmula começa a perder efeito e o professor perde o controle da situação.
Foi o suficiente para a crítica francesa, capitaneada por nomes da vanguarda como François Truffaut e Jean-Luc Godard, tratá-lo como um gênio. Se, por um lado, o excesso de tapinha nas costas contribuiu para o reconhecimento de seu talento, também o encheu de confiança, o que deixou alguns de seus filmes tendendo ao sentimentalismo. Até que, em 1970, com “Qual É o Caminho do Front?”, o público o abandonou.
Os tempos haviam mudado e o humor de Lewis parecia não mais se encaixar no gosto popular. Ele, na verdade, ainda ambicionava ganhar um Oscar (algo que só acabou acontecendo em 2009, quando levou um prêmio humanitário). Para isso, pensou em um papel sério e escreveu “The Day the Clown Cried” (O Dia em que o Palhaço Chorou), em 1972. O tema era pesado: um palhaço tenta ajudar prisioneiros de um campo de concentração durante um espetáculo circense. O resultado, no entanto, não agradou a Lewis, que nem liberou sua veiculação.
Suas aparições rarearam e ele só voltou a ser notícia ao estrelar “O Rei da Comédia” (1983), de Martin Scorsese, no qual está estupendo no papel sério de um mal-humorado comediante que é feito refém em seu apartamento por um humorista fracassado (o não menos brilhante Robert De Niro). Lewis também fez o sucesso na Broadway com o musical “Malditos Ianques”, em 1995. Sua reputação foi arranhada com o lançamento de biografias que o apontam como um ególatra insuportável, mas Lewis, apesar de aposentado do showbiz, continuou fazendo aparições, especialmente em programas beneficentes como o Teleton.
Sua saúde, na verdade, o preocupou nos últimos anos, quando sofreu uma cirurgia no coração em 1983 e outra para tratar de um câncer, em 1992. Em 2003, submeteu-se a um processo de recuperação do vício de drogas legais e sofreu um ataque do coração em 2006.
Mesmo assim, continuou em ação, fazendo pontas em filmes como em “Até que a Sorte Nos Separe 2”, de 2013. Rodado nos EUA, o longa estrelado por Leandro Hassum traz o veterano comediante como um carregador de malas, papel que já havia interpretado em “O Mensageiro Trapalhão”, de 1960. Um breve momento, mas que comprovou o que os franceses sempre souberam: mesmo debilitado, Jerry Lewis continuava um gênio. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.