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Os Sabiás da Crônica reúne seis autores que se tornaram especialistas no gênero

Tudo começou com uma fotografia – ao observar uma imagem que reunia a fina-flor da crônica brasileira, a editora Maria Amélia Mello, uma das mais experientes do mercado editorial nacional, teve a ideia de reunir textos escritos por aqueles senhores. Depois de um longo período de negociações ("Passei um ano conversando com herdeiros e agentes para conseguir a liberação", diz ela), finalmente será lançado Os Sabiás da Crônica (editora Autêntica), com a inédita reunião de 90 textos de seis autores que ainda não tinham sido publicados em um único volume. A obra deve chegar às livrarias no final de outubro, mas já está em pré-venda.

O livro traz uma sequência de fotos feitas por Paulo Garcez em novembro de 1967. Na cobertura de Rubem Braga (que contava com um incrível jardim), reuniram-se com ele Paulo Mendes Campos, Fernando Sabino, José Carlos (ou Carlinhos) Oliveira, Vinicius de Moraes e Sérgio Porto. Com todos devidamente engravatados, o objetivo era realizar um ensaio fotográfico para divulgar uma editora que estava nascendo, a Sabiá, surgida a partir de uma divisão da Editora do Autor, em 1966.

As imagens mostram momentos deliciosos, como o grupo observando a Praia de Ipanema ou descansando na sala do apartamento, onde Braga ostentava uma admirável pinacoteca – o relaxamento é visível com o descarte do paletó por alguns e dos sapatos por outros. Alguns levantam copos, outros aparecem fumando.

"O divertido é o surgimento, em uma imagem, de um jovem que acompanhava a sessão de fotos: Chico Buarque, que logo se revelaria um talento na música", conta Maria Amélia, que convidou o crítico e professor de Literatura Brasileira da USP Augusto Massi para fazer a seleção das crônicas. Ele escolheu 15 textos de cada autor, com datas de publicação que variam de 1930 até 2004, justamente quando morreu o último do grupo, Fernando Sabino.

"Fiel ao projeto original, organizei a antologia de modo que correspondesse, no plano textual, a um retrato de grupo", afirma Massi, no texto de apresentação do livro. "Talvez, por causa disso, o conjunto tenha adquirido a configuração de um panorama no qual a totalidade dos textos revela temas e tramas que nos remetem às características fundamentais de um romance de formação."

Segundo ele, a seleção permitiu que diferentes personalidades e visões de mundo viessem à tona e, "apesar das discordâncias estéticas, sociais e políticas, não impedem o enriquecimento da reflexão coletiva". Continua ele: "Se, de uma perspectiva crítica atual, a amizade parece a muitos uma espécie de idealização, é interessante observar como o senso de humor desses cronistas permitia que transitassem com desenvoltura da conversa lúcida para a réplica lúdica. Havia muita invenção, quebra de convenções, abertura para novas formas de vida".

Para uma melhor compreensão da importância da obra daqueles seis escritores para além do âmbito literário, Massi traça um panorama da origem da crônica no Brasil (cujo primeiro ciclo, entre 1852 e 1897, foi marcado pelos fundadores do gênero: Francisco Otaviano, José de Alencar e Machado de Assis) até chegar ao estilo dos seis sabiás, cuja obra "maturou uma linguagem cotidiana e, na esteira das principais conquistas modernistas, abreviou consideravelmente a distância entre a língua falada e a escrita, incorporando contribuições de distintos segmentos da sociedade e preservando registros da cultura popular no bojo das manifestações ditas eruditas".

A crônica, afinal, sempre foi definida como uma forma brasileira de aparentemente jogar conversa fora, só que, dependendo de quem a escreve, resulta em algo de extraordinária qualidade literária. Massi primeiro destaca Rubem Braga, que "pavimenta o caminho para que a alma inconstante da crônica seja fixada em livro".

Segundo o crítico, tal gênero está no centro das preocupações do autor capixaba. "Ele a pensa de forma centrípeta: a poesia, a reportagem de guerra, os quase contos e a maré agitada da memória se banha sempre nas praias da crônica."

Afinal, gênero difícil, a crônica é realmente saborosa quando seu autor encontra o equilíbrio perfeito entre informação e diversão. É o que se observa nos textos selecionados de Vinicius de Moraes que, poeta, exercita seu lirismo em outras formas estéticas. "Em suas mãos, a crônica atravessa as fronteiras do conto, da música popular, da peça teatral e da crítica cinematográfica", observa Massi. "A qualquer momento, o caldo saboroso de sua prosa dissolve uma receita de feijoada no caldeirão do poema. O extraordinário mergulha no cotidiano e o prosaico deságua no sagrado."

Em sua alentada introdução, Massi detalha a forma como o exercício da crônica estava intimamente ligado ao trabalho dos escritores em jornais e revistas, tornando a atualidade muitas vezes o tema principal. Para o também escritor Ignácio de Loyola Brandão, Fernando Sabino foi o ponto de transição entre a crônica antiga (Machado de Assis, José de Alencar, João do Rio) e a moderna. "Ele ajudou a modificar conceitos, a modernizar", disse ele ao <b>Estadão</b>, em 2003. De fato, suas crônicas na imprensa, carregadas de lirismo, permitiram traçar as fronteiras do gênero.

Do humor de Sérgio Porto ao lirismo de Paulo Mendes Campos, a diversidade era marca registrada daqueles seis sabiás. Como bem diz Massi, sobre a foto de Paulo Garcez: "Repare bem, leitor, algo no retrato já se movimenta, não se deixa capturar. Dentro de minutos, eles vão se dispersar, levantar voo, sair do enquadramento".

<b>OS SEIS SABIÁS</b>

Rubem Braga (1913-1990)
Chamado de o sabiá da crônica, conseguia detectar a importância de detalhes insignificantes, conferindo-lhes toques de genialidade.

Fernando Sabino (1923-2004)
O cronista delicado, cujas estripulias pelas ruas da juventude inspiraram histórias que conquistaram importante lugar na literatura brasileira do século passado.

Sérgio Porto (1923-1968)
Também conhecido como Stanislaw Ponte Preta, transformava em pequenas pepitas de ouro as notícias absurdas que descobria na imprensa.

Paulo Mendes Campos (1922-1991)
Exímio tradutor, imprimiu às suas crônicas uma boa dose de delicadeza e atemporalidade.

Vinicius de Moraes (1913-1980)
Poeta da crônica, guiava-se pelas impressões imediatas e pelos acontecimentos imprevistos, pautando-se sempre pela paixão.

José Carlos Oliveira (1934-1986)
Foi defensor do livre-pensamento, sem temer polêmicas.

As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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