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Peixe da bacia amazônica é recordista mundial de longas distâncias

Se existisse uma competição mundial de longas distâncias em água doce, a dourada (Brachyplatystoma rousseauxii) seria a grande campeã. A conclusão é de um estudo internacional que mapeou o ciclo de migração desse peixe que só existe na bacia do Rio Amazonas.

A pesquisa, que teve seus resultados publicados na revista Scientific Reports, do grupo Nature, foi liderada por cientistas do Museu Paraense Emilio Goeldi (MPEG), Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Em seu ciclo de vida, a dourada chega a percorrer 11,6 mil quilômetros exclusivamente em água doce – uma marca que não é alcançada por nenhum outro animal, segundo os autores do estudo.

A migração épica da dourada começa com os animais já adultos, que partem do estuário do Rio Amazonas, perto do Oceano Atlântico, e sobem o rio até as áreas de desova na cordilheira dos Andes.

Segundo os pesquisadores, os peixes adultos que sobem aos Andes jamais retornam à foz do Amazonas, mas os peixes que acabaram de nascer o fazem, migrando milhares de quilômetros na direção contrária, para completar o ciclo. No estuário, os filhotes se tornam adultos e recomeçam a jornada.

Além da dourada – que é um dos peixes economicamente mais importantes da região -, os cientistas estudaram também outros três peixes semelhantes da bacia amazônica.

“Essa é a primeira vez que uma pesquisa científica abarcou toda a gama dessas espécies de peixes, alguns dos quais se espalham entre os Andes e o estuário do Amazonas, chegando ao Oceano Atlântico”, disse o autor principal da pesquisa, Ronaldo Barthem, do MPEG.

“Esses resultados podem agora ajudar a traçar estratégias efetivas de manejo desses peixes, que são importantes para a indústria pesqueira da região”, afirmou Barthem.

O estudo fez parte de um projeto internacional coordenado pela Sociedade de Conservação da Vida Selvagem (WCS, na sigla em inglês), da ONG The Nature Conservancy (TNC) e o Centro Nacional de Análises e Sínteses Ecológicas, dos Estados Unidos e da Universidade da Califórnia em Santa Bárbara.

Segundo os autores da pesquisa, os planos para a construção de inúmeras barragens, as operações de mineração e o desmatamento podem colocar em risco a longa migração da dourada e das outras espécies, afetando a indústria pesqueira.

“Uma das maiores ameaças à dourada e outras espécies de peixes é o desenvolvimento de infraestrutura na região dos Andes, que poderá ter um pesado impacto na área de desova desses animais”, disse outro dos autores do estudo, Michael Goulding, da WCS.

Enquanto as rotas de migração de peixes como o salmão e as enguias são bem conhecidas, os movimentos migratórios da dourada têm sido menos compreendidos e mal documentados, segundo os autores, embora já se suspeitasse que esse peixe tivesse um dos maiores ciclos de migração em água doce no mundo.

Para confirmar a hipótese, os cientistas mapearam os movimentos de longa distância de quatro espécies do mesmo gênero – a dourada (B. rousseauxii), o babão (B. platynemum), o zebra (B. juruense), e a piramutaba (B. vaillantii) – e utilizaram informações sobre a presença de peixes adultos, filhotes e larvas ao longo do Amazonas.

Os pesquisadores também analisaram estatisticamente as migrações rio abaixo dos filhotes e larvas a partir das cabeceiras dos afluentes do Amazonas até a sua foz.

Os resultados revelaram que a dourada adulta leva de um a dois anos para viajar rio acima, do estuário até a área de desova na região andina. Os autores destacaram também que a pesquisa servirá como fundamento para futuros estudos mais aprofundados.

Segundo eles, experimentos com peixes marcados e análise de isótopos nos depósitos de cálcio no ouvido do peixe poderão ser usados para estudar os padrões de migração da dourada e o ritmo sazonal desses movimentos.

“Muitas questões ainda permanecem em aberto sobre esse peixe incrível. Uma delas é: por que eles fazem uma viagem tão longa para se reproduzir e depois voltam ao local de nascimento para desovar. Agora temos uma linha de base que nos ajudará a direcionar novas pesquisas e esforços de conservação”, afirmou Goulding.

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