Economia

Políticas de moradia não são gasto, são investimento

Para Manish Srivastava, de 50 anos, especialista no mercado imobiliário global, os governos de países que ainda têm uma grande demanda por habitação, como o Brasil, devem começar a ver o financiamento da casa própria mais como solução do que como problema. O indiano, que é professor da Universidade de Nova York, acompanhou de perto o estouro da bolha imobiliária americana em 2008 e diz que ainda há lições a aprender da crise.

Ele virá ao Brasil para o Summit Imobiliário 2017, evento promovido pelo Estado em parceria com o Sindicato da Habitação de São Paulo (Secovi-SP), no dia 4 de abril. A seguir, os principais trechos de sua entrevista.

Que lições ficaram do estouro da bolha imobiliária de 2008, nos Estados Unidos?
A crise nos Estados Unidos foi, de muitas formas, parecida com o que aconteceu na década de 1930. Havia muito dinheiro barato disponível, que ajudou a inflar bolhas de especulação. Imaginar que algo parecido com aquele cenário poderia se repetir nos próximos anos é exagero. Apesar disso, os fatores que levaram à crise não se resolveram por completo e ainda há lições a aprender, como o maior controle do crédito.
Também pesa o fato de o americano jovem, que está começando a formar a sua família, estar menos interessado em se endividar para comprar a casa.

Foi a crise imobiliária que causou essa mudança?
Manish Srivastava: Ela pode ter acelerado esse processo de mudança cultural, mas a questão é que ser dono da própria casa é parte do sonho americano só dos mais velhos. Os filhos dessa geração, que estão na casa dos 20 e 30 anos, preferem alugar imóveis e investir em outros mercados do que repetir os erros dos seus pais, e cair no manejo artificial de hipotecas.

O setor imobiliário do Brasil também passa por um momento difícil. Os mercados de países emergentes terão o que comemorar em um futuro próximo?
Manish Srivastava: Sim. Economias como a do Brasil têm uma grande vantagem, mesmo em relação a nações desenvolvidas, mas sem tantas fontes de recursos naturais. O desafio é como manejar melhor os recursos e fazer com que trabalhem a favor do país, ajudem a criar e fortalecer instituições que realoquem rendimentos e respondam rapidamente às necessidades da população. Mas esse é um desafio mesmo para países ricos, como os Estados Unidos.
Nos próximos dez anos, vamos ver uma grande mudança em emergentes, como a Índia, sob o ponto de vista de dar melhor qualidade de vida para os cidadãos. O Brasil não pode ficar para trás, ele tem mais recursos naturais, mais talentos.

Como resultado da crise, o crédito imobiliário ficou mais escasso no País. O Brasil está lidando com o financiamento para moradia de um jeito errado?
Manish Srivastava: A demanda em países como o Brasil é historicamente alta e essa questão não irá se resolver da noite para o dia. O Estado tem de regulamentar o mercado, para facilitar que as pessoas consigam ter uma moradia. O problema do Brasil, de dificuldade de acesso ao crédito imobiliário, é semelhante em outros países em desenvolvimento, como a Índia – embora os indianos estejam manejando o acesso ao crédito para a compra de imóveis com mais sucesso. O que os governos precisam ter em mente é que programas de moradia não são gasto, são investimento. É uma decisão política, e as pessoas, quando garantem suas casas, podem se sentir cidadãos – e motores de crescimento econômico – mais completos.

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