De exames de imagens a testes genéticos precisos. Os avanços científicos na Medicina não são poucos. Mas o desafio central continua o mesmo: cuidar do paciente, o que significa, além de diagnóstico e tratamento, proporcionar bem-estar e autonomia. Ligada a uma tradição tecnicista, a Medicina se volta agora para a humanização, e especializações na área tentam dar conta da necessidade de treinar o olhar e os ouvidos dos médicos para compreender a pessoa que está por trás da doença.
Cursos de pós ligados à humanização preenchem as lacunas que ainda existem na graduação, dizem especialistas. A médica Priscilla Fiorelli, de 29 anos, conta que não teve, durante o curso de Medicina, disciplinas voltadas para a humanização. “A única que chegava mais perto era a de Psicologia. Mas desde que entrei na Medicina sempre quis seguir o paciente a longo prazo.”
Priscilla buscou o curso de Bases da Medicina Integrativa, no Albert Einstein, pioneiro no Brasil. “A proposta é ter uma abordagem voltada para a pessoa. O foco é no bem-estar global – físico, emocional, social e espiritual -, por meio do cuidado próprio e da autonomia, na possibilidade de o paciente participar”, diz a coordenadora do curso Denise Tiemi Noguchi.
Na formação, os alunos aprendem, além dos tratamentos convencionais, a indicar outros tipos de terapias como ioga e meditação. Para isso, têm, na grade da pós, oficinas. “Eles têm 16 horas de aula de ioga, por exemplo. Se o profissional não experimentar, como vai poder indicar?”, explica Denise Tiemi.
Para Priscilla, conhecer as possibilidades ajuda na atuação profissional. “Na prática agora, uso a meditação junto da acupuntura. Vi que uma potencializa a outra”, conta a médica, especializada em Clínica Geral. Os atendimentos em seu consultório, diz ela, duram de uma a duas horas. “Não tem consulta de 15 minutos.”
Diálogo
Outro foco da Medicina que se propõe a ser mais humanizada é melhorar a comunicação dos profissionais da saúde com os pacientes e a família. Para isso, assim como alunos do curso de Medicina Integrativa, estudantes de outras pós do Einstein passam por um centro de simulação, em que treinam como abordar o paciente. “Dividimos os alunos em grupos pequenos e um deles interage em tempo real com um ator. Depois, a gente discute e revê como foi a comunicação, o que deu certo e quais foram as dificuldades”, diz Thomaz Bittencourt, médico do Centro de Simulação Realística do Albert Einstein.
Para a psicóloga Ana Merzel, comunicar más notícias aos pacientes e seus familiares é prática comum a muitos profissionais de saúde, mas nem todos têm formação para isso e acabam fazendo de forma pouco cuidadosa. “O profissional fala de uma maneira que o paciente não consegue entender e, com isso, encerra a conversa bem rapidinho”, explica Ana, que coordena o curso de atualização em Comunicação de Más Notícias, do Hospital Albert Einstein.
A formação inclui a discussão de casos reais entre os alunos e até atividades sobre linguagem. “A forma como a gente fala é importante porque pode criar uma comunicação dúbia”, explica Ana. O curso, mais curto do que uma pós-graduação, pode ser feito presencialmente ou a distância e atrai estudantes de diferentes especialidades.
Gestão
Além de conhecer os conceitos do atendimento mais humanizado, um desafio é colocá-los em prática e torná-los uma política nos serviços de saúde. A questão é assunto do curso de pós-graduação em Gestão da Humanização em Serviços de Saúde, oferecido pela Escola de Educação Permanente do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).
Na especialização, os alunos discutem como tornar a gestão dos serviços de saúde mais participativa – envolvendo, além dos profissionais, a visão dos próprios pacientes sobre o atendimento. Também desenvolvem ferramentas de gestão, como indicadores para avaliar as ações de humanização na área onde atuam.
Para a ginecologista Lisandra Stein, que fez a pós, a formação dá base para a atuação profissional. “O que mais me chamou a atenção foi a possibilidade de embasar a integração da humanização no atendimento do dia a dia”, diz ela, que coordena os grupos de Cirurgia Fetal e de Atendimento Integral à Gestante de Fetos com Malformação do Hospital das Clínicas.
Aprender sobre indicadores de humanização, segundo ela, também é essencial. “Transmitir essa informação do atendimento para uma quantificação que faça sentido para o gestor do hospital é um desafio e é muito importante. É implementar uma ação e avaliar de que forma isso se relaciona com a satisfação dos pacientes.”
O curso, com aulas a distância e encontros presenciais, já recebeu alunos de várias partes do País e tem previsão de voltar a ser ofertado no ano que vem.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.