A fixação de preços para os serviços de transporte, determinada na negociação do fim da greve dos caminhoneiros, é alvo de três ações de inconstitucionalidade que poderão ser levadas ao plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) após o segundo turno. Dependendo do desfecho, há risco de uma nova paralisação de caminhoneiros, que não querem abrir mão da garantia de renda mínima. É uma “bomba-relógio” que o novo presidente poderá ter de desarmar antes mesmo de subir a rampa do Palácio do Planalto, no primeiro dia de 2019.
Consulta feita pelo Estado e declarações dos próprios candidatos indicam que eles não estão dispostos a manter a medida, apesar de agora já se conhecer o potencial efeito negativo de uma paralisação nas rodovias para a economia.
Líder nas pesquisas, o candidato Jair Bolsonaro (PSL) não respondeu aos questionamentos da reportagem. Mas já se declarou contrário à tabela de preços mínimos do frete rodoviário, em respeito à posição de seu escolhido para o Ministério da Fazenda, Paulo Guedes. “Tabelar, aí não dá certo”, disse, em 29 de agosto, em sabatina realizada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). “Isso vai na contramão da pessoa que eu confio para tratar nossa economia.”
A resposta enviada pela assessoria do candidato do PT, Fernando Haddad, busca uma posição neutra. “É preciso haver um equilíbrio entre a competitividade da economia e a remuneração justa dos caminhoneiros, de maneira que a retomada do crescimento econômico permita a ampliação da renda dos trabalhadores.”
O candidato Ciro Gomes (PDT) classificou o tabelamento de “excrescência”, durante o fórum da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), em junho. Geraldo Alckmin (PSDB) afirmou que o tabelamento é um “retrocesso”, na sabatina da CNI.
Outros candidatos de perfil liberal, como João Amoêdo (Novo) e Henrique Meirelles (MDB), criticaram as distorções causadas no mercado pela atuação do governo, ao estabelecer a tabela. Essa posição foi expressada até por postulantes mais à esquerda, como Marina Silva (Rede). “Foi numa medida estapafúrdia, que afeta toda a cadeia produtiva de forma adversa”, respondeu sua equipe. O candidato do Podemos, Álvaro Dias, acha que a medida pode fazer sentido numa situação de emergência, mas não pode ser mantida no longo prazo.
Diálogo com eleito
A paralisação dos caminhoneiros colocou a categoria, que reúne 3 milhões de trabalhadores, na lista de prioridades dos políticos brasileiros. Esse grupo, que ameaçou o governo Michel Temer, ainda não se posicionou oficialmente sobre nenhum candidato. Enquanto não toma uma decisão, espera começar a dialogar com os possíveis futuros presidentes ainda durante a disputa do segundo turno.
“Vamos aguardar o que acontece em 7 de outubro”, disse o presidente do Sindicato dos Transportadores Autônomos de Carga (Sinditac) de Ijuí (RS), Carlos Alberto Litti Dahmer, referindo-se ao resultado do primeiro turno. “A partir do segundo turno, vamos discutir com cada um não só o piso do frete, mas também a renovação da frota, o retorno da aposentadoria aos 25 anos de serviço, a política de preços da Petrobrás.”
Na sua avaliação, a fixação de preços mínimos para o frete rodoviário é uma conquista da qual os caminhoneiros não vão abrir mão. “O candidato que se colocar contra isso poderá ficar contra a categoria”, comentou. “E poderá ter a resposta, primeiramente, nas urnas e, depois, num eventual governo, se mexer com isso.”
O caminhoneiro Alexandre Fróes, de Santa Catarina, disse que a categoria ainda não formalizou apoio a um candidato porque não quer discutir promessas. Ao contrário de Litti, acredita que o momento para dialogar seja após as eleições. “Aí vamos ver se o presidente vai ser a favor ou contra”, disse, referindo-se à fixação de preços mínimos para o frete rodoviário. “Dependendo, pode ser que a gente vá para a briga de novo.”
“Vejo dificuldade em tudo”, disse o presidente do Sindicato dos Caminhoneiros Autônomos de São Paulo, Norival de Almeida Silva, o “Preto”. “É difícil voltar à discussão sobre ter ou não o piso mínimo, e é difícil mantê-lo.”
O conflito entre caminhoneiros e empresas, principalmente no agronegócio, evidencia a questão. O tabelamento não “pegou”, pois tem muita gente burlando a tabela. Isso mantém no ar a ameaça de novas paralisações. Essa tensão fez, por exemplo, o governo iniciar este mês operações de fiscalização sobre o frete.