O senador Bernie Sanders anunciou ontem que desistiu da corrida presidencial, abrindo o caminho para o ex-vice-presidente Joe Biden disputar a eleição de novembro contra o presidente Donald Trump. Apesar de um bom começo nas primárias, Sanders sofreu derrotas seguidas que deram a Biden uma vantagem inalcançável em número de delegados.
Em pronunciamento online, Sanders disse ontem que Biden é "um homem decente" com quem pretende trabalhar, atitude diferente da tomada por ele em 2016, quando estendeu a disputa contra Hillary Clinton. "Não posso continuar uma campanha que não se pode vencer e interferirá no importante trabalho que temos nesta hora difícil", afirmou. "Unidos, vamos derrotar Donald Trump, o presidente mais perigoso da história moderna americana."
No discurso de ontem, Sanders repetiu parte dos mantras de campanha, como saúde pública universal e gratuita. Rotulado de radical, ele viu suas ideias serem abraçadas, em maior ou menor grau, por outros pré-candidatos do partido durante as prévias democratas.
Trump não escondia de ninguém que preferia ter Sanders como adversário, para manter a polarização política. O senador se autodenomina um "socialista democrata", o que facilita a estratégia de enfrentamento adotada pelo presidente. Um sinal da preocupação da Casa Branca com Biden foi o pedido para que a Ucrânia investigasse o filho dele, Hunter Biden, o que esteve na origem do pedido de impeachment aprovado na Câmara e rejeitado no Senado.
As pesquisas eleitorais variam muito nos EUA, porque o voto não é obrigatório e cada instituto adota um modelo diferente. Na média, porém, Biden tem uma vantagem de cerca de 5 pontos porcentuais. No entanto, a eleição americana é decidida em um colégio eleitoral onde cada Estado tem direito a uma quantidade de votos, divididos de acordo com a população.
Por isso, as pesquisas eleitorais estaduais são mais úteis como termômetro da disputa. Nelas, o presidente está um pouco à frente em Estados importantes como Flórida, Pensilvânia e Ohio, mas perde em outros, como Michigan, Wisconsin e Carolina do Norte.
Para o professor da Universidade George Washington, Maurício Moura, ainda não está claro o quanto a saída de Sanders fortalece Biden, pois ninguém sabe como será a campanha durante a pandemia. "Todas as campanhas já fizeram um movimento fortíssimo para trabalhar 100% digital, republicanos e democratas estão focados em desenvolver métodos para que os eleitores votem antecipadamente", afirma.
Além disso, o eleitor de Sanders, de perfil mais jovem e progressista, não costuma ser o mesmo de Biden, visto como um candidato de centro. "Pelo menos dois terços dos eleitores de Sanders precisam votar em Biden. Essa equação é fundamental para os democratas", disse Moura.
Em fevereiro, Lilly Alegria, filha de imigrantes da Guatemala, que vive em Grand Rapids, no Estado de Michigan, disse ao Estado que votaria em Sanders porque era contra a política migratória de Trump. Ontem, ao saber da desistência de seu candidato, colocou-se como indecisa. "Vou pensar, saber mais sobre os pontos positivos e negativos de Biden. Ainda não sei", disse.
Em razão da pandemia, as campanhas deixaram de fazer comícios e usar voluntários. Trump vem aproveitando a quarentena para ter uma exposição diária na TV, nas quais faz um balanço sobre a crise. O "sumiço" dos candidatos democratas – natural, pois Biden, de 77 anos, e Sanders, de 78, estão no grupo de risco – fez crescer as especulações de que o governador de Nova York, Andrew Cuomo, poderia concorrer à presidência. Até agora, ele é o único democrata com uma exposição de mídia próxima à de Trump.
Cuomo, porém, nega a ambição. Enquanto isso, a aprovação de Trump vem subindo com as aparições diárias na TV, com coletivas que duram duas horas, até mesmo nos fins de semana. Resta saber se e quando esses índices se refletirão nas pesquisas eleitorais.