A decisão tomada ontem pelo plenário do plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) serviu não apenas para definir, por 9 votos a 1, que o narcotraficante André do Rap deve retornar à prisão, mas também para fixar o entendimento da Corte de que nenhum criminoso poderá voltar às ruas de forma "automática", vencido o prazo de 90 dias da prisão preventiva.
A sessão, apesar da quase unanimidade dos votos, foi tensa em vários momentos. Derrotado em sua decisão de liberar o traficante, líder do Primeiro Comando da Capital (PCC), agora foragido, o ministro Marco Aurélio Mello desferiu duras palavras contra o ministro Luiz Fux, que cassou sua decisão no dia seguinte, ressaltando que o presidente deve ser "algodão entre cristais e não pode atuar de forma trepidante". "Não pode ser em relação a seus iguais um censor, levando ao descrédito o próprio Judiciário."
Em uma declaração ainda mais dura, o decano acrescentou que, pela primeira vez, o tribunal está admitindo esse "superpoder" pelo presidente, realçando que Fux foi "autoritário no que cassou a decisão de um colega". O magistrado acrescentou que continua convencido do "acerto da liminar" que soltou o traficante André do Rap. "Se alguém falhou não fui eu. Não posso ser colocado aí como bode expiatório, considerada uma falta de diligência, como disse o ministro Gilmar Mendes, do juiz de origem, do Ministério Público e na falta de diligência da representação da própria polícia", disse.
Em resposta a Marco Aurélio, Fux disse que "Vossa Excelência não tem razões para me categorizar como totalitário nem para presumir que outros casos como esse ocorrerão". O ministro afirmou, também, que a exceção que motivou a decisão foi a alta periculosidade do preso e o risco de fuga. "Peço a Vossa Excelência, em nome da nossa amizade antiga, que tenhamos respeito um ao outro e também aos nossos conceitos. Com a devida vênia para mim no caso específico representaria autofagia não defender a imagem da corte e do Supremo Tribunal."
Fux não saiu imune às críticas de outros ministros, como Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski. Os dois afirmaram que presidentes do Supremo não têm permissão para suspender liminares de outros colegas em nenhum caso. O presidente ressaltou, por sua vez, que o STF exerce "função pedagógica perante 20 mil juízes para coibir as centenas de habeas corpus na lista de espera".
O julgamento tem a importância histórica de definir como deve ser interpretada uma modificação na legislação processual brasileira trazida com a aprovação do Pacote Anticrime, em dezembro. A nova regra legal prevê que as prisões preventivas devem ser revisadas a cada 90 dias para evitar que presos fiquem presos ilegalmente. Pela tese definida no plenário do Supremo, mesmo que esse prazo não seja respeitado, não deve haver a revogação automática da prisão, mas, sim, o juiz deve ser obrigado a reavaliar a legalidade e atualidade dos fundamentos da prisão.
<B>Bolsonaro</B>
À noite, o presidente Jair Bolsonaro falou sobre o assunto em live. "Quando saiu a decisão de um ministro, eu apanhei. Sou o culpado de tudo o que ocorre no Brasil. Agora, nove ministros falaram que ele deveria estar preso. Quem está certo, quem está errado? Eu jamais colocaria em liberdade uma pessoa como essa", afirmou. "Não vou ser injusto com ninguém. Sérgio Moro (ex-ministro) foi brilhante quando estava na Justiça e resolvemos isolar lideranças do crime organizado. Foi um sucesso retirar o comando do crime organizado de presídios para levá-los a locais onde não controlariam o crime."
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>