O Pleno do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) voltou atrás na exclusão sumária do Grêmio na Copa do Brasil. Mas, ainda assim, eliminou o time gaúcho da competição. Isso porque os auditores puniram o clube com a perda de três pontos – e como o Santos venceu o jogo de ida por 2 a 0, não há mais como reverter o resultado em campo. O clube gaúcho ainda teve mantida a multa de R$ 50 mil. Devido a uma “falha processual”, os torcedores que proferiram as injúrias racistas ao goleiro Aranha poderão voltar a frequentar os estádios normalmente.
Punidos inicialmente com o afastamento de estádios por 720 dias, os torcedores identificados tiveram sua pena anulada, já que nenhum nome foi citado na denúncia – o que, por lei, impede qualquer punição. Assim, a menos que a procuradoria do STJD ofereça nova denúncia, eles poderão voltar às arquibancadas.
Já o quarteto de arbitragem teve seu recurso parcialmente aceito. O árbitro Wilton Pereira Sampaio, denunciado por não registrar os atos em súmula, foi multado em R$ 800 e suspenso por 45 dias. Os auxiliares Kleber Lucio Gil e Carlos Berckenbrock foram absolvidos, enquanto o quarto árbitro Roger Goulart foi penalizado em R$ 500 e afastados dos gramados por 30 dias.
Relator do processo, o auditor Paulo César Salomão Filho considerou que o caso era grave, mas fez ressalvas. “Não eram cinco pessoas xingando, ofendendo o goleiro, como disse a defesa. Mas também não eram milhares como dito pela procuradoria”, comentou. “Não considero o Grêmio um clube racista, assim como não considero o povo do sul racista. Mas não é esse o enfoque do meu voto”, explicou. Ele resolveu manter a multa de R$ 50 mil, mas em vez da exclusão direta do clube, votou pela perda de três pontos. Os demais auditores presentes seguiram seu entendimento.
O auditor Flávio Zveiter, assim como havia feito no caso envolvendo injúrias raciais ao zagueiro Paulão, do Internacional, sugeriu que a multa seja revertida a entidades que combatam ao racismo, e não à CBF.
JULGAMENTO. Em sua explanação, o procurador-geral do STJD, Paulo Schmitt, foi incisivo. “O CBJD foi modificado em um de seus artigos, que foi alterado exclusivamente para coibir a prática discriminatória”, disse, fazendo referência ao artigo 243-g, o qual o clube foi denunciado. “Esse tema (racismo) não tem serenidade. Jamais haverá serenidade nesta temática.”
Schmitt também falou sobre comentários de advogados ligados ao direito desportivo, que demonstraram temor sobre o precedente que se abriria a partir da exclusão de clubes por atitudes de alguns torcedores. “Estamos falando em excesso de torcedores. E isso não tem relação direta com quantidade, e sim de qualidade, de conteúdo”, afirmou. “Não se preocupem com precedentes, porque não haverá precedentes. A procuradoria estará atenta.”
Assim como no julgamento em primeira instância, a defesa do Grêmio foi dividida por dois advogados, Gabriel Vieira – do quadro do clube – e Michel Assef Filho, que costuma defender o Flamengo no STJD.
Vieira argumentou que o Grêmio vem trabalhando contra o racismo desde 2005, com uma campanha que, segundo ele, “foi considerada de vanguarda”. Assim, disse que o clube fez tudo o que lhe coube. “O Grêmio agiu antes, dez anos antes. O Grêmio agiu durante o jogo, passando vídeos nos telões. O Grêmio agiu depois da partida, ajudando na identificação dos torcedores. O que mais estava ao alcance do Grêmio?”, indagou.
Segundo o advogado, a punição imposta pela 3ª Comissão Disciplinar traz graves prejuízos ao clube. “Perda de patrocínios, pessoas se desvinculando do clube… O Grêmio está sendo escrachado nas redes sociais”, afirmou.
Gabriel Vieira também fez referência a Martin Luther King, “citado diversas vezes desde o episódio”. E deu atenção especial a uma citação do ativista negro: “Ao fim, o que fica e o que fere não é o barulho dos que querem o mal, mas o silêncio dos que querem o bem”, pedindo, assim, que não deixassem o Grêmio com a pecha de clube racista.
Já Michel Assef Filho citou punição imposta pelo próprio STJD ao Paraná na Copa do Brasil deste ano – o clube foi apenas multado por atitudes racistas de dois de seus torcedores. “Qualquer um lá fora acha que foi um absurdo o Grêmio ser excluído pela ação de cinco torcedores num universo de 32 mil torcedores”, afirmou.
Para Assef Filho, “faltou bom senso (à 3ª Comissão Disciplinar)”. Na avaliação dele, a decisão de excluir o Grêmio da Copa do Brasil é desproporcional . “E se fosse a torcida inteira, o que se faria? Excluiria o Grêmio dos quadros da CBF? Porque não tem mais para onde ir!”, destacou.
Presente ao primeiro julgamento, o presidente do Grêmio, Fábio Koff, também esteve na sessão do Pleno. Ele chegou ao plenário do STJD às 9h22, quase uma hora antes do início – o presidente da corte, Caio Cesar Rocha, abriu o julgamento às 10h13. Diferentemente do julgamento da primeira instância, porém, ele não se manifestou.
RELEMBRE – No dia 3 de setembro, o Grêmio havia sido excluído da Copa do Brasil por decisão unânime da 3ª Comissão Disciplinar. Na ocasião, os cinco auditores também multaram o clube gaúcho em R$ 50 mil. Os torcedores identificados pelos atos de injúria racial foram proibidos de frequentar estádios por 720 dias, enquanto que o árbitro Wilton Pereira Sampaio foi multado em R$ 800 e suspenso das atividades por 45 dias. Já os auxiliares Kleber Lucio Gil e Carlos Berckenbrock, além do quarto árbitro Roger Goulart, foram penalizados em R$ 500 e afastados dos gramados por 30 dias. Na ocasião, as penas do quarteto de arbitragem acabaram dobradas por eles terem sido punidos em dois artigos.