O Parlamento Europeu aprovou nesta quarta-feira, 12, a abertura de um procedimento de intervenção ou, caso necessário, de limitação do direito de voto da Hungria na União Europeia por “ameaça sistêmica” contra as liberdades e o Estado democrático de direito.
Por maioria qualificada – 448 votos a favor, 197 contra e 48 abstenções -, os eurodeputados consideraram que o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orban, maior nome da ala populista de extrema direita, autoproclamada “anti-imigração”, viola o Artigo 7 do tratado do bloco.
Assim, cabe ao Conselho Europeu, que reúne presidentes e primeiros-ministros, manifestar-se, em data ainda a ser marcada, sobre se as políticas adotadas pela Hungria colocam em risco os “valores da UE”. Para ser aprovada, a avaliação terá de obter maioria de 23 dos 28 chefes de Estado e de governo.
O grupo também terá de se pronunciar sobre as formas de controle que serão exercidas com relação às reformas já adotadas e as que venham a ser avaliadas pelo Parlamento húngaro, assim como eventuais sanções.
Pelo Artigo 7 do Tratado Europeu, o país que violar princípios como independência dos poderes, liberdade de imprensa, autonomia acadêmica ou livre iniciativa de ONGs, como fez a Hungria, corre o risco de ter seu direito de voto na UE suspenso. Para evitar a punição, Orban teria de desfazer as reformas mais problemáticas.
Caso ele não recue, o direito de voto seria suspenso se houver unanimidade. Neste caso, o problema seria convencer a Polônia, que também enfrenta um processo semelhante, aberto em 2017 pela Comissão Europeia.
Na prática, caso seja punida, a Hungria viveria uma espécie de banimento político temporário, além de correr o risco de enfrentar represálias econômicas, como a suspensão dos repasses de fundos europeus.
Entre 2014 a 2020, o país será o sexto maior beneficiário da ajuda de Bruxelas aos membros mais pobres. Só em verbas de sete organismos, entre os quais o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (Feder), o Fundo Social Europeu (FSE) e os Fundos de Coesão (FC), a Hungria receberá € 25,4 bilhões – ou 3,2% do PIB. No total, incluindo a Política Agrícola Comum (PAC), o total transferido equivale a 4,3% do PIB húngaro.
Além dos recursos, outro fator que incomoda os dirigentes europeus são as denúncias de manipulação de licitações públicas. Segundo a Comissão Europeia, 36% das concorrências abertas no país têm um único candidato – enquanto a média europeia é de 17%.
Nos bastidores da UE, o objetivo é, antes de aplicar sanções, trazer a Hungria – e a Polônia – de volta ao Estado democrático de direito. Nesta quarta, porém, a primeira reação do governo húngaro não foi boa.
O chanceler, Peter Szijjarto, definiu a votação como uma “vingança” dos países “pró-imigração” liderados pelo presidente da França, Emmanuel Macron. Ele acusou o Parlamento Europeu de trapacear ao não considerar as abstenções como votos válidos na conta dos três quartos necessários para aprovação da medida.
Macron, que aceitou o desafio de Orban, colocando-se como o líder da Europa liberal contra o populismo de extrema direita, felicitou os eurodeputados. “Ao defender o Estado de direito na UE, o Parlamento Europeu reafirmou os valores essenciais da Europa”, disse o presidente. “Essa aliança de valores e do progresso é o projeto que nos guia, que eu defenderei sem trégua.”
Para o cientista político francês Jean-Yves Camus, um dos maiores especialistas em populismos e extrema direita na Europa, Orban recebeu uma advertência clara. “Infelizmente, ele leva a cabo uma política incompatível com um engajamento de direita, pelo menos na Europa Ocidental”, avalia.
Além da UE, Orban enfrentará outra pressão nas próximas semanas. Na votação desta quarta, parte dos eurodeputados do Partido Popular Europeu (PPE), formado por legendas nacionais de direita, votou contra o governo húngaro. Segundo Camus, uma das possibilidades é de que seu partido, a União Cívica Húngara (Fidesz), seja excluído do PPE. A alternativa seria ingressar no nascente Movimento para a Europa de Nações e de Liberdades (MENL), que reúne os principais grupos populistas e de extrema direita do bloco. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.