Assim como rugia o refrão da canção tema do velho guerreiro, creio que meus sete leitores devem sentir uma certa nostalgia do programa que praticamente dominou e ditou regras no mercado musical brasileiro por longa data. O velho jocoso, libidinoso, engraçado e caricato, cercado por suas belas chacretes que eram na época o sonho de consumo de qualquer homem, levava o caos visual e uma orgia musical para as telas da Rede Globo, naquela época líder absoluta em audiência.
Muita gente foi lançada pelas batutas do velho guerreiro. Nomes como Roberto Carlos, Fábio Junior, Alceu Valença e Raul Seixas pediam benção para senhor Abelardo Barbosa, o eterno chacrinha.
O filme Alô, Alô, Terezinha, em cartaz nos cinemas, não é uma cinebiografia de Chacrinha, como aponta o cartaz publicitário. Mas sim um documentário sobre o Programa do Chacrinha. Nele – divertido, diga-se de passagem – desfilam figuras bizarras como o calouro Abacaxi e outros sem nenhuma vocação, mas com uma pretensão ainda latente herdada dos quinze sagrados minutos de fama. Artistas consagrados dão seus depoimentos sobre a figura de Chacrinha e contam divertidos causos de bastidores, mas as grandes vedete do filme – sem trocadilhos – são as chacretes.
Estas mulheres com corpos esculturais e donas de uma sedução capaz de deixar um eunuco excitado dominaram os sonhos eróticos de praticamente toda a população masculina – e feminina em alguns casos – se tornando marca registrada quando o assunto era sensualidade. Diferente das bailarinas robóticas de axé music ou das masculinizadas funkeiras, e até mesmo no pior dos casos, alpinistas sociais que se utilizam de uma situação infame dentro de uma faculdade com tendências nazistas de comportamento para se transformar em símbolo sexual decadente de uma nação incoerente, as chacretes tinham brilho, tinham características marcantes e acima de tudo bom humor em suas personalidades modeladas pelo mestre Abelardo, pastoril da TV.
A situação que estas mulheres se encontram hoje em alguns casos chega a ser deprimente. Mas, mesmo envelhecidas, com seus corpos outrora esculturais e hoje parecendo mais um rabisco de pintor amador, ainda mantêm algo que não se apagou com o tempo: o brilho nos olhos somado ao bom humor. Chacrinha selecionava bem seu grupo, diferente de hoje, que você vê apenas corpos sem expressão, sem humor, sem identidade.
Quantas vezes você não se confundiu com uma bailarina de axé? Afinal até o nome de algumas é o mesmo, para confundir – ou não confundir – mais ainda. Em matéria de música e de programas de auditório, a confusão é maior e a saudades de tempos remotos fervilha em nossos corações. A música vive o seu pior momento de todos os tempos, em que a criatividade, a inteligência e sobretudo a originalidade foram esmagadas e toda esta gosma resultante socada goela abaixo dos pobres telespectadores lunáticos que aceitam sem queixas aquilo que lhes é imposto.
Apresentadores de TV apáticos, que hoje dominam o horário, seguem completamente isentos de talento e de carisma. Talvez por isto necessitem constantemente do saco de bondades financiado por patrocinadores para “presentear” espectadores sorteados com casas novas, carros novos entre outros produtos fabricados – porém não tendo capacidade alguma de presentearem seu público com humor, diversão e simpatia, uma qualidade sutil que sempre foi peculiar a homens que faziam até mesmo de um programa banal de auditório, arte bruta que era lapidada na mente de cada espectador, assim como este queira. Ah que saudades do cassino do Chacrinha, onde a casa ganhava, mas nós, pobres jogadores, ao menos éramos bem recebidos e nos divertíamos à beça!
Maurício Nunes é autor do livro Sob a Luz do Cinestar e também mantém o site www.aerosilva.com