Variedades

Salve-se quem puder, Nicolau está à solta

Pode até ser cruel, reconhece o diretor Laurent Tirard, mas quatro anos após o sucesso planetário de O Pequeno Nicolau, que ele adaptou das bandes dessinées (comics) de René Goscinny e Jean-Jacques Sempé, o eterno menino está de volta e, claro, com outro ator. Sai Maxime Godart e entra Mathéo Boisselier, porque a essência do Petit Nicolas é ser sempre aprendiz aos olhos do público, adultos e crianças que o desfrutam (consomem?) desde que surgiu nas tiras, em 1956. O novo Nicolau é ainda mais imaginativo e o filme em cartaz consegue ser até melhor que o anterior, mas algo se passou e os números de público encolheram, como Tirard tenta explicar numa entrevista por telefone.

“O Pequeno Nicolau fez mais de 6 milhões de espectadores na França e o dobro disso no mundo. Havia o sabor da novidade, de ver o herói de Goscinny ser interpretado por um garoto de verdade. Para As Férias do Pequeno Nicolau, o desafio era, em parte, fazer com que o público se esquecesse do intérprete anterior e aceitasse o novo ator que faz o papel.

Mas havia um outro desafio, maior ainda. Na França, há muita resistência da intelectualidade a aceitar qualquer manifestação que veja com delicadeza o período anterior a Maio de 68. Mais que 1789, Maio foi, no imaginário de intelectuais, a verdadeira revolução, mesmo que, no fundo, tenha sido um projeto. Essa maneira idealizada de encarar o passado não cai bem.”

O repórter levanta a possibilidade de ter sido outra coisa. Afinal, quando As Férias do Pequeno Nicolau chegou aos cinemas, Cannes e a televisão já haviam celebrado o fenômeno francês do ano. Quem poderia imaginar que Bruno Dumont, autor de filmes torturados como Flandres, A Humanidade e Camille Claudel, iria fazer uma comédia, e com crianças, e que Le Ptit Quinquin iria estourar na TV e arregimentar a crítica nos cinemas? Para Cahiers du Cinéma, foi o filme do ano. Na trama de Dumont, o policial Van der Weyde e seu parceiro Carpentier investigam o mistério de uma vaca morta. A investigação é acompanhada por crianças lideradas por Quinquin e sua namoradinha. São os terrores da pequena cidade, vivem aprontando.

Quinquin é o anti-Nicolau. Quem sabe se foi por causa do sucesso do Ptit Quinquin, que o Petit Nicolas viu seu público encolher pela metade – 3 milhões – na França?

Tirard não acredita, e lamenta. Confessa que se empenhou muito mais no novo filme. E se O Pequeno Nicolau já bebia na fonte de Meu Tio, de Jacques Tati, o diretor conta agora que, de volta a Tati, a fonte não poderia ser outra que não As Férias de M. Hulot. “Hulot é um pouco uma criança num corpo de adulto, Nicolau talvez seja o inverso. No primeiro filme havia a escola, a cidade, tudo remetia a Meu Tio, queria mudar.

Férias, praia

Não poderia fugir de Les Vacances de M. Hulot, com o acréscimo da cor.” Para o diretor, a cor é fundamental. “Desde Goscinny, Nicolau é indissociável do vermelho – o rouge Nicolas.” Hulot é o herói solitário, que se multiplica ou entra em choque com a multidão. Nicolau vive em grupo – na escola, na praia. “Formatar o elenco infantil foi difícil, mas prazeroso. Até por eles, gostaria que o sucesso tivesse sido maior.”

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