Puxados pelo mercado internacional, os preços em reais das matérias-primas brutas, que incluem minério de ferro, cobre, soja, bovinos, entre outras importantes commodities, deram um galope em janeiro. Em 12 meses, registraram a maior alta da série iniciada em agosto de 1995.
Entre fevereiro de 2020 e o mês passado, a cotação em reais dessas matérias-primas no atacado subiu 71,61%, segundo dados da Fundação Getúlio Vargas (FGV), apurados para o cálculo do Índice Geral de Preços-Disponibilidade Interna (IGP-DI). Foi um avanço de mais de dez pontos porcentuais em apenas um mês e uma mudança de tendência. Em dezembro, o ritmo de alta havia perdido força em relação a novembro.
"Os preços em alta dessas commodities, que são a base de muitas cadeias de produção da economia, sobrecarregam vários segmentos", alertou o economista André Braz, coordenador do Índice de Preços ao Consumidor da FGV. "É um impacto difuso, porque, no caso das commodities metálicas, pega boa parte da cadeia industrial", concorda o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale.
O reflexo direto da escalada das cotações das matérias-primas no dia a dia é mais pressão de custos na indústria, que pode resultar em novos reajustes de preços ao consumidor. O leque de produtos cujos preços podem ser afetados pela escalada das matérias-primas é amplo: vai de insumos usados na construção civil, na indústria química até o carro zero.
Mas o estrago mais visível e imediato é na mesa do brasileiro, no tradicional prato feito. Em 12 meses até janeiro, arroz, feijão preto, carne e ovo subiram 74,14%, 54,24%, 22,82% e 10,13%, respectivamente, segundo dados da inflação oficial, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do IBGE.
Não é de hoje que a comida tem sido a vilã da inflação. Em 12 meses até janeiro, a alimentação no domicílio acumula alta de quase 20% no IPCA. É um resultado quatro vezes maior do que a inflação geral no mesmo período (4,56%).
No mês passado, os preços do grupo alimentação e bebidas no indicador até desaceleraram em relação a dezembro. Mesmo assim, registraram aumento na casa de 1% em apenas um mês. Também em janeiro os alimentos responderam por quase a totalidade da inflação geral do mês (0,22 pontos de 0,25%). "Acima de 1% em um mês na alimentação, preocupa", diz Braz.
<b>Peso no bolso</b>
Na cesta básica da Fundação Procon de São Paulo, os preços de 28 itens que compõem a lista de alimentos também subiram mais de 1% no mês passado. A cesta de comida que custava, em média, R$ 883,28 em dezembro, atingiu R$ 893,37 em janeiro e comprometeu mais de 80% da renda das famílias que vivem com um salário mínimo. Para os mais pobres, o gasto com alimentos consome a maior parte da renda e sobra muito pouco para as demais despesas básicas.
Entre os alimentos que mais contribuíram para alta de preços da cesta básica do Procon, estão aves e embutido. Milho e soja, que ficaram 68,9% e 96,3% mais caros no atacado nos últimos 12 meses, são usados para alimentar os animais.
Diante de tantas pressões, economistas já começam a revisar para cima as projeções de inflação para 2021. No Boletim Focus, do Banco Central, da semana passada o mercado projetava 3,62% para a mediana do IPCA e, nesta semana, subiu para 3,82%. Há um mês a expectativa era de uma alta de 3,50%.
As projeções do mercado estão acima de 3,75%, o centro da meta. "Para mim, 3,75% é piso, a inflação será pressionada não só por alimentos", diz Braz. Por enquanto, ele projeta um IPCA em torno de 4% para este ano.
Mais pessimista, o economista Fábio Silveira, sócio da MacroSector, espera inflação "desconfortável" de 4,5% para 2021, a mesma marca de 2020. Na sua avaliação, o principal motivo é a pressão do câmbio acumulada ao longo de 2020, de mais de 30%. "As empresas estão tentando repassar para o varejo, mesmo com a demanda fraca."
Vale, da MB Associados, é outro economista que está pessimista com a inflação. "É muito provável que veremos as três grandes cadeias de commodities – agropecuárias, metálicas e petróleo – causarem pressão inflacionária ao longo do ano", diz. A consultoria tem a expectativa de que a inflação fique em 3,8% em 2021, mas já considera aumentar essa projeção.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo</b>.