Economia

Doenças psíquicas crescem e geram afastamentos e aposentadoria por invalidez

Os casos de transtornos psiquiátricos e doenças mentais no ambiente de trabalho estão crescendo no Brasil. É o que revela a Previdência Social, que registrou no ano passado o afastamento de 75,3 mil trabalhadores em razão de quadros depressivos, com direito a recebimento de auxílio-doença, o que representa 37,8% de todas as licenças médicas motivadas por transtornos mentais e comportamentais em 2016.
 
Segundo especialistas, o ambiente de trabalho pode acarretar uma série de problemas de saúde para os funcionários de empresas públicas e privadas. A Organização Mundial de Saúde (OMS) revela que até 2020 a depressão será a doença mais incapacitante do mundo. A Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) estima que entre 20% e 25% da população tiveram, têm ou terão um quadro de depressão em algum momento da vida.
 
A advogada Érica Coutinho, especialista em Direito do Trabalho do escritório Roberto Caldas, Mauro Menezes & Advogados, explica que problemas gerados no meio ambiente do trabalho provocam uma série de problemas como estresse, ansiedade, transtornos bipolares, síndrome de Burnout – caracterizada por estresse profissional, exaustão emocional e tensão exorbitante gerada pelo excesso de trabalho –, esquizofrenia e transtornos mentais relacionados ao consumo de álcool e cocaína, entre outros males.
 
Em 2016, foram registrados mais de 199 mil casos de pessoas que se ausentaram das empresas públicas e privadas por sofrerem dessas enfermidades. Esse número supera o total registrado em 2015, que foi de 170,8 mil casos de afastamentos, segundo a Previdência Social.
 
“As origens da depressão relacionadas ao ambiente do trabalho, embora possam ser múltiplas, têm alguns caminhos conhecidos: cobrança de metas excessivas e/ou inatingíveis; episódios de assédio moral; incentivo exacerbado à competitividade entre trabalhadores; necessidade de cumprimento de jornadas extenuantes; ausência completa de sentido nas atividades laborais; ameaças constantes de demissão; utilização massificada de ideias corporativas etc.”, alerta a advogada.
 
Para a especialista, tais situações colocam o funcionário em constante frustração e funcionam como verdadeiros gatilhos para o desenvolvimento da doença.
 
Para identificar se está prestes a ingressar num quadro semelhante, o trabalhador deve ficar atento a algumas situações. Os especialistas indicam que falta de motivação, mudanças de humor, tristeza, transtornos neuróticos, alterações do sono e o uso de substâncias psicoativas, como o álcool e drogas, estão entre as principais características destas doenças que causam incapacidade para o trabalho no Brasil. “Esses sintomas são responsáveis pela depressão e síndromes, como a do pânico, doenças que afetam profundamente a qualidade de vida do trabalhador”, afirma o doutor em Direito do Trabalho e professor da pós-graduação PUC-SP Ricardo Pereira de Freitas Guimarães.
 
O professor afirma que se tornou cada vez mais comum o afastamento do trabalhador em razão de quadros depressivos e síndromes provocados pelo estresse e exaustão, como a do pânico e a de Burnout. “Apesar do crescimento de casos de depressão no ambiente do trabalho, o trabalhador só será afastado se conseguir comprovar a causa ou concausa ligada ao ambiente do trabalho. Ou seja, ele deve reunir provas e laudos médicos que comprovem que o quadro depressivo está diretamente ligado ao trabalho e não a fatores externos, como problemas familiares, traumas pessoais, entre outros”, pontua.
 
De acordo com o advogado Fabiano Dorotheia, especialista em Direito Previdenciário do Baraldi Mélega Advogados, os casos de depressão implicam em sérias consequências tanto para o empregado quanto para o empregador. “É importante que as empresas concentrem seus esforços para que o assunto seja abordado de forma preventiva junto aos seus empregados, visando a conscientização sobre o assunto, especialmente com os empregados em cargos de liderança. O ideal é que todos os funcionários estejam atentos à ocorrência de situações que possam dar origem a causas de depressão, de modo a garantir um ambiente de trabalho saudável para todos”, orienta.
 
Freitas Guimarães informa que, em casos de depressão e síndromes provocadas por estresse ou maus tratos no trabalho, a empresa pode indicar um acompanhamento do trabalhador um médico psiquiatra.
 
“O médico psiquiatra deve examinar o trabalhador e confeccionar um laudo observando se as causas da doença estão vinculadas ao relacionamento no trabalho”, revela.
 
Na visão de Diego Monteiro Cherulli, vice-presidente da Comissão de Seguridade Social da OAB-DF, diretor de assuntos parlamentares do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP) e secretário-geral do IBDPREV, situações de incapacidade laborativa surgem da parca fiscalização do ambiente de trabalho, que não mantém a proteção do risco social como regra máxima de proteção do trabalhador e do cidadão. “A legislação tributário-previdenciária é inteligente ao beneficiar as empresas que investem na melhoria do ambiente de trabalho, ou puni-las em caso de não cuidarem da segurança do trabalhador”, observa.
 
Para combater esse mal, segundo Érica Coutinho, é urgente que as empresas levem a sério os transtornos psiquiátricos de seus funcionários e analisem suas estruturas organizacionais com cautela. “É importante também que as áreas responsáveis por gestão de pessoas sejam lideradas por profissionais capazes de lidar com esse tipo de situação e que trabalhem para deixar um canal aberto de comunicação que seja confiável e discreto”, alerta.
 
 
 
Afastamento e perícia
 
O trabalhador que sofre de depressão ou qualquer outro transtorno psíquico provocado pelo ambiente de trabalho deve ser afastado pela empresa, que precisa agendar uma perícia no Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) para comprovar o grau de sua incapacidade.
 
João Badari, especialista em Direito Previdenciário do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados, reforça que o INSS fará a perícia para constatar a incapacidade, “devendo o segurado levar todos seus laudos médicos, atestados, receitas de remédios e outras provas que comprovem o seu quadro depressivo ou qualquer outra doença relacionada aos maus tratos no ambiente de trabalho”.
 
De acordo com o INSS, as doenças psicológicas têm o mesmo procedimento que as físicas ou os acidentes. Depois que o segurado solicita o benefício, fica a cargo da perícia médica decidir se há invalidez ou não.
 
Segundo Badari, os peritos do INSS indicam, na maior parte dos casos, a concessão de auxílio-doença, devido à dificuldade em caracterizar a depressão como incurável.
 
O advogado Fabiano Dorotheia ressalta que o trabalhador segurado do INSS pode requistar a aposentadoria por invalidez quando o quadro de sua doença for grave. “O procedimento para dar entrada ao pedido de aposentadoria por invalidez, no caso de doenças psicológicas, é o mesmo adotado para os demais tipos de doenças. O segurado será submetido à perícia médica, que será responsável pela avaliação quanto a existência e tipo incapacidade laborativa, o que resultará na aposentadoria por invalidez caso seja constatada a incapacidade total e permanente”.
 
Entretanto, destaca o especialista, os segurados com doenças psicológicas acabam enfrentando maiores dificuldades para conseguir o benefício previdenciário, “diante da complexidade que envolve os diagnósticos”.
 
Perícia judicial
 
E como se trata de casos delicados, muitas vezes, segundo os especialistas, o Poder Judiciário acaba sendo palco de discussões sobre o direito ou não do segurado se aposentar por invalidez por decorrência de doenças psíquicas.
 
João Badari explica que caso o benefício seja negado administrativamente pelo INSS, o segurado pode recorrer à Justiça.
 
 
“Sem dúvida, o trabalhador segurado do INSS pode se socorrer ao Judiciário, que marcará uma nova perícia, porém com um perito judicial e não mais do INSS. Nesses casos os peritos tendem a ser mais criteriosos e analisam melhor o paciente e os laudos apresentados. O Judiciário tem aceito os pedidos de auxílio doença e de aposentadoria por invalidez, até mesmo na forma acidentária, quando o funcionário adquire a doença em razão do seu trabalho”, pontua.
 
 

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