Dá para encaixar uma vida de apartamento de três quartos em menos de 30 metros quadrados? Para a aposentada Regina Ferreira, de 64 anos, a troca para uma quitinete pouco acima dessa medida exigiu muitos “desapegos”, que foram do rack da sala até metade das calças jeans. A paulistana enfrentará, contudo, mais uma mudança em 2018: deixará o local, em que vive há seis anos em Campos Elísios, por um studio de 14 m² no Bom Retiro, ambos no centro de São Paulo. “Menos é mais. A gente tem de aprender a viver com criatividade”, defende.
Regina define a mudança como um “novo desafio”. Para ela, a palavra-chave é “adaptação”. “Eu tinha muita coisa que não precisava”, explica ela, que recentemente aderiu a grupos de escambo no Facebook para dar destino ao que não usa mais.
Quando pronto, o studio de Regina (além de outros 14 vizinhos) será a menor unidade habitacional do País, segundo a incorporadora Vitacon – com preço de R$ 6,3 mil por m². O recorde deve ser batido pela própria empresa, que lançou em agosto o Nova Higienópolis com apartamentos de 10 m², para 2019, e valor previsto de R$ 99 mil.
Desde 2012, foram lançados 6.029 apartamentos com área útil inferior a 30 m² em São Paulo, dos quais 1.479 (24,5%) têm menos de 20 m², segundo levantamento do Sindicato da Habitação de São Paulo (Secovi). Dados da entidade e da Empresa Brasileira de Estudos de Patrimônio (Embraesp) mostram que, das unidades lançadas com até um dormitório na cidade, 15% têm menos de 30 m² e 7,3% são inferiores a 20 m².
Para compensar o espaço reduzido, investe-se em áreas compartilhadas, como lavanderia, escritórios no modelo “coworking” e academia de ginástica, além de apostas no comércio, nos serviços do entorno e até nas opções de transporte público. Por isso, a maior parte se concentra no centro e na região do Brooklin e da Vila Olímpia, na zona sul.
Para o professor de Antropologia da Universidade de São Paulo (USP) José Guilherme Magnani, nos microapartamentos a casa se converte em um “refúgio”, um “lugar de absoluta vivência individual”.
Moradores
Segundo as incorporadoras Vitacon, Setin e TPA Empreendimentos, referências nesse mercado, o principal público-alvo são estudantes, jovens adultos, divorciados e idosos, que preferem viver perto do trabalho e de serviços. Esses imóveis também atraem moradores de outras cidades que ficam na capital só em dias úteis.
É o caso do administrador de empresas Cristiano Oliveira, de 39 anos. Há dois meses em São Paulo, ele viaja para Taubaté, no interior, em todos os fins de semana para ficar com a mulher e o filho recém-nascido. Seu período de permanência no apartamento é principalmente noturno, período em que se exercita na academia, faz refeições rápidas, toma banho e descansa. “Precisava de um lugar pequeno e só para mim”, diz ele, que paga R$ 3 mil de aluguel, além de condomínio (R$ 500).
Em todos os casos, os imóveis são pensados para só um morador – público que cresceu de 9,8% para 14,5% da população de 2004 para 2015, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Quitinete
Fora das grandes incorporadoras, empresas de menor porte também investem em unidades de tamanho reduzido, como a Semiphi, que aluga unidades em pequenos prédios do centro e da zona oeste. Em Santa Cecília, na região central, por exemplo, a estudante de Cinema Caroline Milani Lopes, de 21 anos, vive em uma quitinete de 15 m², reformada para esse tamanho em 2013.
“Geralmente, no meu caso, um apartamento convencional precisaria ser dividido com alguém. Preferi não dividir e alugar um espaço pequeno, para ter privacidade.” Ali, a escrivaninha serve para estudar, trabalhar e comer. Já as roupas ficam em uma arara. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.