O Ministério da Saúde anunciou nesta terça-feira, 31, um plano de ação para tentar reduzir o avanço da sífilis no Brasil. No ano passado, a doença alcançou níveis epidêmicos e continua a crescer no País. Nas duas últimas décadas, já causou a morte de mais de 2.100 bebês.
Os casos da doença aumentaram em todos os níveis. Em 2016 e 2017, o número de casos da infecção entre adultos subiu 27,8%, passando de 68.526 casos para 87.593. Entre gestantes, o aumento foi de 14%, passando de 32.561 para 37.436. A forma congênita, quando a infecção é transmitida da gestante para o bebê ainda no útero, também aumentou, mas de forma menos expressiva: 0,4%.
A estratégia anunciada nesta terça reforça as ações lançadas no ano passado, quando um pacto para reduzir os casos entre gestantes, seus bebês e parceiros e também entre a população adulta foi anunciado pelo governo. A medida visava aumentar a testagem e o início precoce do tratamento.
Atualmente, cerca de 37% das gestantes iniciam o tratamento da doença no primeiro trimestre da gestação. O porcentual ainda é considerado baixo, uma vez que as taxas de mortalidade de bebês que adquiriram a doença da mãe, ainda no útero, é quase 13 vezes maior do que a meta traçada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). No País, a cada 1 mil crianças nascidas, 6,8 morrem pela doença. A meta de eliminação da sífilis é de que essa relação não ultrapasse 0,5 por 1 mil nascidos vivos.
“A sífilis é uma doença negligenciada tanto pelo profissional de saúde quanto pela população”, constatou a diretora do departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde, Adele Benzaken.
Segundo ela, essa situação precisa mudar rapidamente. “A sífilis mata bebês, provoca abortos e, no caso de adultos, pode provocar lesões no cérebros e problemas nos ossos”, completou.
Para tentar conter esse avanço, o governo anunciou a compra de 3 milhões de doses de medicamentos para gestantes e população adulta, quantidade suficiente para atender um ano da demanda. O governo deve fazer ainda uma campanha permanente de prevenção. A prioridade será dada para 100 cidades que apresentam o maior número de casos da doença. A estratégia passa ainda pelo treinamento de profissionais de saúde.
O ministro da Saúde, Ricardo Barros, resistiu em falar em epidemia, como fez no ano passado. Segundo ele, agora a “situação está controlada”. Adele, no entanto, ainda vê a sífilis como uma epidemia.
Avanço
Entre 2010 e 2016, casos de sífilis congênita praticamente triplicaram no País. Há sete anos, 6.946 infecções foram contabilizadas e a projeção para este ano é de 17.818 casos. Se confirmado, o número ainda vai ser maior do que o registrado em 2014, que teve 16.278 registros. “Por enquanto não falamos em queda de casos, mas em redução no ritmo do avanço”, disse Adele.
A sífilis congênita é uma doença grave e que pode ser evitada com o tratamento da gestante logo no início da gravidez. Justamente por isso, os dados são considerados importantes não apenas para verificar as tendências da doença, mas para se avaliar a qualidade das ações de diagnóstico precoce e prevenção.
Adele atribui os altos índices de detecção da sífilis nos segundo e terceiro trimestres da gestação a dois fatores: o ingresso tardio da gestante no pré-natal e ainda a necessidade da melhoria do sistema de detecção. Ela observa, no entanto, que a situação já foi pior. Dados divulgados no ano passado indicavam que 50% dos casos de sífilis em gestante eram detectados no terceiro trimestre de gestação, quando as chances de proteger o bebê são bem menores do que no primeiro trimestre.
Adele atribuiu o avanço da sífilis a uma conjunção de fatores. Um dos principais foi a falta – entre 2014 e 2016 – de um medicamento para combater a doença durante a gestação, que é aplicado de forma injetável. Ela citou ainda a redução do uso de preservativos entre a população brasileira e até mesmo regras mais rígidas nas farmácias para a venda de antibióticos.
“É uma medida necessária, não estou criticando, pois o uso de antibióticos de forma indiscriminada pode levar à resistência”, completou.
Ela pondera contudo que, com o uso de medicamento, ainda que de forma incorreta, a população que não sabia estar com sífilis acabava sendo tratada, mesmo sem saber.