Avaliando o nível de qualidade da formação de professores no País, Bernadete Gatti, pesquisadora da Fundação Carlos Chagas e especialista no assunto, afirma que as licenciaturas têm currículos muito frágeis, as ementas e bibliografias são genéricas e não dão formação suficiente. “Há uma redução de formação de conhecimento oferecido em boa parte das instituições. Elas têm tirado horas de formação disciplinar para atividades complementares, seminários culturais que a gente não sabe bem o que é. As instituições não estão encarando a formação desse profissional com seriedade. Vai de qualquer jeito, como se qualquer um pudesse ensinar. Não é verdade.”
Em 2008, Bernadete analisou a formação inicial das licenciaturas e afirma que desde então duas atualizações na pesquisa que mostraram o mesmo panorama: “O currículo continua tradicional, com estrutura do início do século 20. Não tem 10% de formação em educação, de metodologia, prática de ensino, didática. Esse aluno vai para uma escola sem saber onde está, o que é uma rede, uma sala de aula. As licenciaturas nunca foram um foco de política coerente”.
Ainda segundo a especialista, a maioria dos países tem faculdade ou centro que forma professor. Nós não. “Cada licenciatura está no nicho e não se encontram. A ideia nos outros países é que tem uma base formativa comum para todos e depois diversifica a formação. Defendo um centro de formação, para onde convergiriam os institutos básicos. Estudos têm mostrado que os docentes das faculdades de formação de professor têm dificuldade de ensinar. Até em instituições públicas. Temos percebido isso principalmente por causa do programa de iniciação à docência do MEC (Ministério da Educação), o Pibid. No Pibid tem de fazer um projeto para atuar na escola, que envolve o aluno, o professor supervisor e a escola. Às vezes, ele vem de área que não tem licenciatura e está tomando um choque.”
Para explicar o que ocorre no Brasil, Bernadete afirma que outros países se preocuparam com a preparação do professor paralelamente com a reforma curricular. E o Brasil não conseguiu pensar assim. “A formação inicial é da competência do MEC. Mas o problema é que nunca tivemos uma política para atuar nacionalmente. Precisamos de uma política que pudesse atuar nessa direção. Porque vai ter de mexer com instituições públicas e privadas. E praticamente 75% dos cursos estão nas privadas. Um instituto superior de educação ficaria caro, porque teria de manter a estrutura.
Para melhorar a relação entre a universidade e a escola, ela observa que as condições de formação deveriam melhorar, sobretudo os programas de estágios, “o estágio curricular não tem projeto claro, acompanhamento efetivo nem avaliação consistente. Precisaríamos de financiamento para os estágios”.
Bernadete acredita que a questão salarial e de carreira tem que ocorrer paralelamente, “temos a Lei do Piso, que ajudou muito para algumas partes do Brasil, porque a gente tem diferenças. Tem de mudar a formação, mas também fazer estrutura de carreira mais condizente. A carreira não é só salário inicial. Pela pesquisa que fizemos de atratividade, vimos que o jovem pensa na projeção a longo prazo. Qualquer profissional atua mais tranquilamente com melhor salário e carreira. Mas a gente tem dificuldade de olhar o professor como um profissional. Não tem prestígio. Eu sei que o custo do setor público seria bastante elevado, mas gastamos com tanta besteira. A União precisa pôr mais dinheiro no Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação). A educação determina melhoria na saúde, no cuidado do meio ambiente. Aprendi que não adianta discurso. Vamos ver para onde vai o dinheiro. Onde está o dinheiro é a verdadeira política. Onde está e como é usado”.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.