A situação observada nas creches terceirizadas visitadas pelo Estado descumpre uma série de recomendações previstas pelo Ministério da Educação em um documento assinado pelo prefeito Fernando Haddad (PT), quando ministro, em 2006. O documento Parâmetros Básicos de Infraestrutura para Instituições de Educação Infantil define, passo a passo, como devem ser instaladas as unidades em todo o País.
Elaborado em parceria com secretarias municipais de Educação, com apoio de arquitetos, engenheiros e educadores, o documento estabelece, por exemplo, que uma creche deve ter sua construção planejada por profissionais. A determinação está logo na introdução do material, que exige ainda a apresentação de um projeto executivo com o “detalhamento técnico e as especificações de materiais e acabamentos”.
Regra que passa longe de mais da metade dos prédios que funcionam como creches em São Paulo. Na rede terceirizada, que atende hoje 58% das crianças, os imóveis são adaptados. Para atender à demanda, a Prefeitura aprova o uso de prédios construídos para outro fim, como igrejas.
Outra recomendação do MEC pouco seguida se refere ao cuidado com os espaços. Segundo o documento, as crianças devem ser atendidas em local “silencioso, preservado das áreas de grande movimentação, com conforto térmico e acústico”. Em uma das unidades visitadas, na região central, as salas são divididas por muretas, sem o isolamento de som indicado.
Há ainda previsão de “área externa”, como um parque ou jardim – outro item não cumprido em ao menos três unidades visitadas pela reportagem nas duas últimas semanas. O “parque” de uma delas fica dentro da sala.
Também são previstas portas e cabines individuais nos banheiro. Em duas das creches visitadas, porém, os vasos são colados uns aos outros em um ambiente completamente aberto e próximo das alas das crianças mais velhas. Em um deles, nem sequer havia tampa nos vasos.
Desenvolvimento
As diferenças entre a teoria e a prática podem prejudicar o desenvolvimento das crianças, na análise da pesquisadora em Educação da Fundação Carlos Chagas Maria Malta Campos. Ela ressalta que para ser positiva a interação que elas têm na creche é preciso que alguns limites sejam respeitados, como “as condições mínimas de infraestrutura, qualificação de pessoal e de gestão”.
Para o professor de Políticas Públicas Salomão Ximenes, da Universidade Federal do ABC (UFABC), a expansão dos convênios acontece sem acompanhamento efetivo da qualidade. “As conveniadas (terceirizadas) são admitidas, mas como uma medida emergencial para atender a essa pressão de demanda. Isso não autoriza que o Município faça convênios com creche que não atende aos requisitos estabelecidos pelo MEC”, diz.
Ximenes afirma que há uma espécie de loteria social, que define quem vai para a creche direta e quem vai para a terceirizada. “Atende-se com padrões muito desiguais. É uma discriminação em desfavor de algumas crianças”, diz.
Legislação
Uma das soluções passa por mudanças na legislação, afirma o vereador Andrea Matarazzo (PSD). Projeto de sua autoria aprovado na Câmara em janeiro, que ainda aguarda regulamentação, cria um alvará de funcionamento especial para creches, a fim de garantir a segurança dos prédios. Já Toninho Vespoli (PSOL) defende a retomada da rede, por meio da ampliação de creches diretas. Para o parlamentar, os convênios não podem se tornar política única. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.