Em um evento neste domingo, 28, em memória das vítimas do Holocausto, líderes da comunidade judaica cobraram o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para que reveja o apoio do Brasil à denúncia contra Israel por genocídio, que foi apresentada pela África do Sul à Corte Internacional de Justiça, em Haia, diante do conflito que se intensificou no Oriente Médio depois dos ataques terroristas do Hamas, em outubro do ano passado, em solo israelense.
Presidente da Confederação Israelita do Brasil (Conib), Cláudio Lottemberg disse que convidou o presidente Lula e o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, para o evento deste domingo, mas não obteve retorno.
"Eu, como brasileiro, fico frustrado, porque o Brasil sempre teve posição bastante equilibrada e tentando criar espaço para poder conciliar e participar de um cenário de construção, de entendimento. Infelizmente, desta vez, não é o que está acontecendo. E não é só o governo que fica passivo e no fundo apoiando, como a questão da África do Sul, mas a gente vê manifestações antissemitas e é frustrante ver líderes da envergadura daqueles que ocupam o Poder Executivo não se sensibilizarem. Tivemos um evento e eles foram convidados. É ruim, porque misturam situações. Nós temos uma questão de que o Brasil pode ter críticas ao governo de Israel, mas nada tem com o antissemitismo", disse Lottemberg.
Lottemberg classifica o atual momento mundial como delicado e, no Brasil, diz tentar manter o diálogo com o governo federal e esperar que o "bom senso" prevaleça. "O próprio julgamento que foi iniciado (em Haia) apontou que Israel tem o direito de se defender e prega pela devolução dos reféns", completou. No momento, 136 pessoas são mantidas sob o poder de integrantes do Hamas.
A comunidade judaica também espera que a Justiça brasileira puna antissemitismo com rigor numa tentativa de diminuir as manifestações criminosas contra o povo judeu. O ex-presidente do PT José Genoino, que defendeu boicote contra empresas de judeus em uma live, será processado. A comunidade judaica classifica como antissemita a fala do ex-deputado federal. "Ministros disseram que ele está sendo vítima. Não está sendo vítima. Ele será processado. Se ele tiver razão, a Justiça falará em favor dele. Entretanto, se ele estiver cometendo (crime), ele vai responder por isso", disse Lottemberg.
O presidente da Federação Israelita do Estado de São Paulo (Fisesp), Marcos Knobel, afirmou ao <b>Estadão</b> que o aumento de denúncias por antissemitismo cresceu quase 1000% desde o ataque do Hamas em outubro. "É um fenômeno muito específico. O povo judeu foi perseguido na época da inquisição por questões religiosas. No Holocausto, o povo judeu e outras minorias foram perseguidos por questões raciais. E agora, pela ligação que o povo judeu tem com o Estado de Israel, esse antissemitismo é disfarçado na figura de um antissionismo. Então, a gente vai analisando que cada momento tem sua particularidade. Agora, vemos aumento de quase 1000% de antissemitismo no Brasil. Nós não somos contra ter posição em favor da causa Palestina. Nós somos contra em detrimento da aniquilação do Estado de Israel. Isso que não vamos deixar acontecer", disse.
<b>Conib lança plataforma de combate ao antissemitismo</b>
A Conib lançou também neste domingo uma plataforma como parte de um projeto de combate ao antissemitismo e ao discurso de ódio no Brasil. O projeto está ancorado nos seguintes pilares: letramento, educação e conscientização; dados, pesquisa e monitoramento; avaliação e melhorias de políticas públicas e do ambiente regulatório e análise e adoção de medidas legais.
Rony Vainzof, secretário da Conib, lembrou que "o maior crime contra a humanidade da história, o Holocausto, não foi um acontecimento casual e repentino. Foi resultado de longo e sistemático antissemitismo fomentado sobretudo por discurso de ódio. Assim, a plataforma visa conscientizar e demonstrar o perigo desses atos de ódio e que o antissemitismo é inconciliável com os padrões sob os quais se erguem os direitos humanos e a democracia".
Conforme o monitoramento digital, a partir de comentários e menções em redes sociais, houve aumento de 576% de manifestações antissemitas desde o começo do conflito até 24 de janeiro de 2024. Somente de outubro a dezembro de 2023, o aumento de denúncias foi de 913%, quando comparado ao ano anterior.
<b>Governo brasileiro defende medidas cautelares contra Israel</b>
Na última sexta-feira, 26, o governo brasileiro divulgou nota para defender cumprimento de medidas cautelares de decisão da Corte Internacional de Justiça que pediu respeito à Convenção da ONU contra o genocídio na guerra que Israel trava contra os terroristas do Hamas em Gaza. O gesto do governo Lula de apoiar a ação movida pela África do Sul foi considerado divergente da tradição da política externa brasileira no conflito e duramente criticado.
"O governo brasileiro tem a convicção de que as medidas cautelares contribuirão para garantir o cumprimento da Convenção e a proteção dos direitos do povo palestino, bem como o necessário e imediato alívio humanitário, conduzindo à pronta cessação das hostilidades", diz trecho da nota do Itamaraty.
<b>Leia a nota na íntegra:</b>
O governo brasileiro acompanhou atentamente, hoje, o anúncio da decisão da Corte Internacional de Justiça (CIJ) sobre o pedido de medidas cautelares efetuado pela África do Sul e direcionado a Israel, no âmbito do caso "Aplicação da Convenção para a Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio na Faixa de Gaza".
Ao destacar o caráter juridicamente vinculante da deliberação da Corte, o governo brasileiro ressalta a importância do pleno e imediato cumprimento da decisão.
O governo brasileiro tem a convicção de que as medidas cautelares contribuirão para garantir o cumprimento da Convenção e a proteção dos direitos do povo palestino, bem como o necessário e imediato alívio humanitário, conduzindo à pronta cessação das hostilidades.
O governo brasileiro recorda, ademais, a importância da imediata liberação dos reféns remanescentes em poder do Hamas.
O Brasil reitera a defesa de um Estado palestino economicamente viável convivendo lado a lado com Israel, em paz e segurança, dentro de fronteiras mutuamente acordadas e internacionalmente reconhecidas, que incluem a Faixa de Gaza e a Cisjordânia, tendo Jerusalém Oriental como sua capital.