Ao marcar depoimentos simultâneos no inquérito do golpe, a Polícia Federal (PF) agiu estrategicamente para evitar a combinação de versões e pegar eventuais contradições nas respostas. Quando a força-tarefa de delegados ficou frente a frente com os investigados, 15 deles decidiram ficar em silêncio, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
As defesas justificaram que não tiveram acesso a todo o conteúdo da investigação. O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), liberou compartilhamento dos autos com os advogados, mas mantém o sigilo sobre documentos relacionados a diligências em andamento e sobre a delação do tenente-coronel Mauro Cid.
O direito ao silêncio está previsto na Constituição. Investigados e testemunhas têm a prerrogativa de não responder a perguntas se entenderem que as respostas podem incriminá-los.
Veja a lista de quem ficou em silêncio no inquérito do golpe:
<b>Jair Bolsonaro</b>
Até o momento, há dois indícios que complicam a situação do ex-presidente. O primeiro é um áudio enviado por Mauro Cid que sugere que Bolsonaro ajudou a redigir e editar uma minuta de golpe. O segundo é o depoimento do general Marco Antônio Freire Gomes, ex-comandante do Exército, que atribui ao ex-presidente a articulação de reuniões com comandantes das Forças Armadas para discutir "hipóteses de utilização de institutos jurídicos como GLO (Garantia da Lei e da Ordem), estado de defesa e sítio em relação ao processo eleitoral". A defesa de Bolsonaro foi procurada mas ainda não se manifestou.
<b>Walter Braga Netto</b>
Mensagens apreendidas pela PF mostram que o ex-ministro da Casa Civil liderou uma campanha velada, mas agressiva, de pressão a oficiais das Forças Armadas que rejeitaram aderir ao plano golpista. Em um dos diálogos, em dezembro de 2022, Braga Netto afirma que a "culpa pelo que está acontecendo e acontecerá é do general Freire Gomes". "Omissão e indecisão não cabem a um combatente", acrescenta o ministro.
<b>Augusto Heleno</b>
O ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional defendeu, em reunião ministerial, que o governo deveria "virar a mesa" antes das eleições e sondou a Agência Brasileira da Inteligência (Abin) sobre a possibilidade de "infiltrar" agentes nas campanhas dos adversários de Bolsonaro.
<b>Paulo Sérgio Nogueira</b>
Segundo relatos dos ex-comandantes Marco Antônio Freire Gomes (Exército) e Carlos Baptista Júnior (Aeronáutica) à Polícia Federal, o então ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira, convocou os chefes militares para a reunião onde foi apresentada a proposta de golpe.
<b>Almir Garnier</b>
O ex-comandante da Marinha teria colocado as tropas à disposição de Bolsonaro, de acordo com os comandantes do Exército e da Aeronáutica em depoimento à PF.
<b>Marcelo Costa Câmara</b>
O ex-assessor especial de Bolsonaro foi apontado pela PF como o responsável por um núcleo de inteligência paralela do presidente. Ele teria ajudado a monitorar ilegalmente o ministro Alexandre de Moraes.
<b>Filipe Martins</b>
Preso na a Operação Tempus Veritatis, o ex-assessor da presidência para assuntos internacionais teria levado a Bolsonaro a minuta de decreto de golpe que viria a ser discutida em reuniões com oficiais das Forças Armadas, segundo a Polícia Federal.
<b>Amauri Feres Saad</b>
O advogado foi apontado como um dos autores da minuta golpista.
<b>José Eduardo de Oliveira e Silva</b>
O padre é citado no relatório da investigação como membro do "núcleo jurídico" do plano de golpe. Ele teria participado de uma reunião golpista no Palácio do Planalto, em novembro de 2022, e segundo a PF tem "diversos vínculos com pessoas e empresas já investigados em inquéritos correlacionados à produção e divulgação de notícias falsas".
<b>Ailton Gonçalves Moraes Barros</b>
O major da reserva do Exército, que já havia sido preso na investigação dos cartões de vacina, teria ajudado a pressionar e a coordenar ataques a comandantes que não queriam aderir ao plano golpista.
<b>Angelo Martins Denicoli, Helio Ferreira Lima e Mário Fernandes</b>
Os militares do Exército são apontados na investigação como membros de um "núcleo de desinformação", que teria produzido e espalhado notícias falsas para deslegitimar o processo eleitoral e, ao mesmo tempo, manter bolsonaristas mobilizados em acampamentos próximo aos quartéis. O objetivo, segundo a PF, seria "criar o ambiente propício para o Golpe de Estado".
<b>Rafael Martins de Oliveira</b>
Conversas obtidas pela PF mostram que o major das Forças Especiais do Exército ajudou a organizar protestos no Congresso Nacional e no Supremo Tribunal Federal (STF) no dia 15 de novembro de 2022, Data da Proclamação da República. Segundo a PF, ele fazia parte do "núcleo operacional" que dava suporte a ações golpistas.
<b>Ronald Ferreira de Araújo Junior</b>
O tenente-coronel do Exército teria circulado documentos "complementares" à minuta golpista e que, na avaliação dos investigadores, também seriam usados para justificar o golpe. A Polícia Federal localizou arquivos como "Anexo A – Levantamento de ações do STF em desfavor do governo federal" e "Anexo B – Levantamento de ações do TSE em desfavor do candidato Jair Bolsonaro".