O Ministério da Saúde requisitou os estoques da indústria de medicamentos usados para intubar pacientes, como sedativos, anestésicos e bloqueadores musculares, que passaram a ficar escassos em alguns locais do País após a explosão de casos de covid-19 nas últimas semanas. Segundo a pasta, a ordem de entrega dos fármacos foi feita na quarta-feira, 17, e deve suprir a demanda do Sistema Único de Saúde (SUS) por 15 dias, com 665,5 mil comprimidos.
Diversos hospitais e regiões do País têm apontado falta ou preocupação sobre risco de desabastecimento. Secretário-executivo do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), Mauro Junqueira afirma que a alta de casos "voltou a trazer risco" de falta do produto. Ele afirma que o ministério fez entrega de medicamentos no fim de semana para garantir o uso em hospitais por 20 dias. "Pedimos para suspender cirurgias eletivas, para que não haja concorrência por estes medicamentos", disse.
O ministério também tem ordenado a entrega dos estoques de oxigênio de algumas empresas. A Frente Nacional dos Prefeitos (FNP) cobrou nesta quinta-feira, 18, ações do governo Jair Bolsonaro para evitar a falta desse insumo.
O Conselho Federal de Farmácia (CFF) manifestou em, nota, "extrema preocupação a falta de medicamentos essenciais à qualidade da assistência e a manutenção da vida de pacientes em estado grave". Conforme o órgão, há relatos de falta de bloqueadores neuromusculares, sedativos e outros medicamentos usados em terapia intensiva, como o midazolan, para entubação, e imunoglobulina, indicado para amenizar os sinais e sintomas da artrite reumatoide.
Segundo José de Arimatea Rocha Filho, farmacêutico hospitalar e membro do CFF, o Sul tem a pior situação. "Santa Catarina estava bastante crítica e o Rio Grande do Sul também", diz. Ele trabalha no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco, que, segundo ele, tem estoque desses tipos de medicamento por até 40 dias e já precisou ajudar outros hospitais da região.
No Hospital Paraná, em Maringá, o estoque de bloqueadores neuromusculares terminou na terça-feira16, . "Ninguém morreu por isso, mas atrapalha muito o tratamento. Dificulta sincronizar o paciente com o respirador, a ventilação mecânica fica prejudicada", disse um médico da unidade, que preferiu não se identificar. Um intensivista do Rio Grande do Sul disse que os estoques de rocurônio, um tipo de relaxante muscular, estão baixos em hospitais de Porto Alegre.
O presidente do Conasems, Wilames Freire, disse que o órgão pediu ao ministério que acione a Organização Panamericana da Saúde (Opas), braço da Organização Mundial da Saúde (OMS) no continente, para a facilitar a importação dos remédios. "Estamos em uma situação que está se agravando a cada momento", afirmou. A pasta da Saúde está em um momento de troca de comando, coma saída do general Eduardo Pazuello, cuja atuação foi alvo de crítica de especialistas, e a chegada do cardiologista Marcelo Queiroga.
"A gente está com as dificuldades que o Brasil inteiro está. Está faltando anestésico, medicamentos de intubação, até mesmo mão-de-obra", comentou o prefeito de Araçatuba (SP), Dilador Borges (PSDB). "Estamos lutando com as ferramentas que temos", disse.
O governo federal já teve de requisitar estoques do "kit intubação" entre junho e setembro de 2020, quando houve falta destes medicamentos em diversos locais. Sem o produto, equipes médicas têm dificuldade de intubar um paciente, por exemplo. Após este período, os medicamentos voltaram a ser comprados pelos prestadores de serviço do SUS. Em nota, o ministério informou que monitora os estoques dos Estados.
A Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp), em reunião nesta quinta-feira, 18, com a Anvisa e outras entidades representativas do setor, relatou a falta de medicamentos essenciais para o tratamento de pacientes acometidos pela Covid-19 no Brasil, como os sedativos necessários para intubação.
A entidade fez uma pesquisa entre seus associados – um recorte com 40 respondentes – que indicou baixa dos estoques. Alguns medicamentos têm reserva de apenas cinco dias, em média, como é o caso do propofol, artracúrio e cisatracurio. Segundo a Anahp, a Anvisa se comprometeu em facilitar processos como medida emergencial, além de revisar resoluções que dizem respeito à importação dos medicamentos.
<b>Indústria diz que não há falta de produção</b>
O presidente do Grupo FarmaBrasil, que representa a indústria nacional de medicamentos, Reginaldo Arcuri, afirma que não há falta de produção. Ele diz que a indústria precisa receber demanda "clara e organizada". "O grande problema é que os hospitais demandam a sua necessidade para ser entregue tudo de uma vez. Ou querem, por razões até justificadas, fazer um estoque. Você não consegue atender todos os pedidos em período curto. O que precisa é articular", disse.
Já o presidente do Sindusfarma, Nelson Mussolini, reconheceu que o uso dos produtos está acima "de qualquer estimativa". Ele afirmou que a indústria "está trabalhando para atender as necessidades" do País. Disse também que "se preocupa" com requisições de estoques, "pois isso pode desorganizar o mercado".
Em nota, o Ministério da Saúde afirma que as requisições não atingem produtos já vendidos pela indústria a Estados e municípios.