Bons tempos aqueles em que os estudantes tinham causas nobres a defender. Fui militante estudantil no final dos anos 80 e início dos 90. O Brasil passava por um processo de redemocratização. Estávamos engatinhando ainda em relação às reivindicações e às liberdades que conquistávamos no sentido de protestar por aquilo que queríamos.
Como aluno de uma universidade pública, a Estadual de Londrina (UEL), no Paraná, íamos às ruas para defender a gratuita no ensino superior, lutávamos contra idéias privatizantes, reivindicávamos recursos para os cursos e a autonomia da instituição frente ao Governo do Estado, o grande mantenedor. Não era fácil. O poder de mobilização era limitado até pelo layout do campus, que mantinha o isolamento das dezenas de cursos e suas áreas. Como se apregoava na época, tudo pensado pela ditadura militar a fim de manter a lei e a ordem.
Lembro que havia uma lei que proibia a polícia militar de entrar nas dependências da universidade. Mas não se tinha naquele momento tantos problemas com segurança pública. Tudo acontecia na mais perfeita calmaria. O campus acaba sendo um território livre, nem por isso era um local para todo tipo de bandalheira. Lógico que tinha quem puxava um fumo lá dentro, não sejamos hipócritas. Mas nenhuma aberração, que pudesse considerar o local como um antro ou algo parecido.
Uma das bandeiras de nosso movimento estudantil (nem de longe era a principal), em nome da liberdade plena, era a permissão para a comercialização de bebidas alcoólicas lá dentro. Hoje, até questiono isso. Afinal, não era necessário beber lá dentro. Mas queríamos ter essa possibilidade. Simples. Mas o movimento estudantil tinha sentido de ser.
Nesta sexta-feira, logo pela manhã assisti pela televisão uma luta campal na USP em São Paulo. Tudo porque a polícia militar flagrou alguns estudantes fumando maconha dentro do campus. Imediatamente, os estudantes se rebelaram. Houve quebra-quebra, viaturas danificadas, uso da força policial e, no final, ocupação de parte das dependências da universidade. A bandeira: impedir que a PM entre no campus. Só esquecem que a presença da polícia foi uma reivindicação da comunidade que demonstrou fragilidade, após um dos alunos ser morto numa tentativa de assalto.
Foi possível ver no ato desta sexta-feira uma grande mobilização estudantil por uma causa duvidosa. Não vi nada parecido, por parte desses ou de outros estudantes, nesses anos todos em que agentes públicos arrombam nossos cofres. Curioso, não?
Ernesto Zanon
Jornalista, diretor de Redação do Grupo Mídia Guarulhos, escreve neste espaço na edição de sábado e domingo
No Twitter: @ZanonJr