Correção: 5G coloca Bolsonaro em saia justa política

<i>A nota enviada anteriormente, na segunda-feira, 13, continha uma incorreção. O texto havia informado que a Nokia é sueca é que Ericsson é finlandesa. O correto é exatamente o contrário. Segue texto corrigido:</i>

A liderança da chinesa Huawei na tecnologia 5G pôs o presidente Jair Bolsonaro em uma saia justa política. Pressionados pelos Estados Unidos, que acusam a companhia de atuar como um instrumento de espionagem do governo chinês, vários países do mundo decidiram proibi-la de fornecer equipamentos para as futuras linhas da telefonia de quinta geração.

Entre os governos que tomaram a medida estão Canadá, Austrália, Nova Zelândia, Índia e Japão. O Reino Unido havia imposto um teto de até 35% na participação da Huawei em suas redes, mas há expectativa de que as restrições evoluam para banimento. Alemanha, França e Espanha, por sua vez, optaram por não restringir a atuação da companhia até agora.

No Brasil, essa decisão será de Bolsonaro, a quem caberá a edição de um decreto sobre o tema. Como toda política pública, cabe aos ministérios envolvidos opinar sobre o assunto, pois a decisão, qualquer que seja, terá que ter respaldo técnico, legal e jurídico. Pasta mais diretamente relacionada ao assunto, o recém-criado Ministério das Comunicações tem um posicionamento lacônico.

"A eventual imposição de limitações a um fornecedor de equipamentos de telecomunicações perpassa diversos órgãos de governo para além do Ministério das Comunicações, como o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), o Ministério da Economia e o Ministério das Relações Exteriores, cabendo a decisão final ao presidente", informou a pasta.

O <b>Estadão/Broadcast</b>, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado, procurou sete ministérios na última semana para perguntar a opinião deles sobre o tema. O GSI e os ministérios da Economia, da Agricultura e de Ciência, Tecnologia e Inovações preferiram não comentar, assim como a Casa Civil, a quem cabe reunir a posição dos diferentes ministérios. O Ministério de Relações Exteriores não respondeu.

<b>Guerra de bastidores</b>

Se publicamente os ministérios não se pronunciam sobre o tema, nos bastidores há uma guerra sobre o tema. O ministro de Relações Exteriores, Ernesto Araújo, ligado à ala ideológica, tem deixado clara sua posição a favor de um alinhamento aos Estados Unidos e contrário à China em suas redes sociais. Sobre a pandemia do novo coronavírus, chamado por ele de "comunavírus", ele considera haver um plano para implantar o comunismo em organismos internacionais.

Já o vice-presidente Hamilton Mourão, por exemplo, já deixou claro ser contra qualquer restrição à Huawei. No ano passado, ele viajou à China, onde se encontrou com o vice-presidente da companhia e reiterou haver um clima de confiança com o país asiático. O tema também preocupa a ministra da Agricultura, Teresa Cristina, já que a China é o principal destino das exportações de soja. Qualquer barreira à Huawei pode ter consequências diretas sobre o agronegócio brasileiro.

Liberal, o ministro da Economia, Paulo Guedes, tem dito que quer as três fornecedoras – além da chinesa Huawei, a finlandesa Nokia e a sueca Ericsson – competindo para oferecer o melhor serviço ao País.

<b>Nórdicas</b>

Curiosamente, os EUA não têm mais um grande fabricante e contam principalmente com os serviços das duas empresas nórdicas. A Lucent foi comprada pela francesa Alcatel e, depois, pela Nokia; a Motorola saiu do mercado de equipamentos centrais; e a Standard Electric, que inclusive tinha fábrica e escritório no Rio, descontinuou o negócio de telecomunicações. As americanas Cisco e a Qualcomm permanecem no setor, mas não fazem equipamentos centrais.

Sobre a acusação de espionagem, Juarez Quadros, ex-presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e ex-ministro das Comunicações, tem uma visão realista. "Todos poderiam espionar. A verdade é que temos de proteger as redes de telecomunicações a evitar situações de conflito. Então teríamos que impor salvaguardas que protejam o Brasil desse risco", afirmou.

Quadros avalia que o ideal seria o governo elaborar uma política pública que estabeleça protocolos de segurança de modo a evitar conflitos geopolíticos. "Se é para restringir, que se façam os atos necessários, porque estão ausentes leis, decretos e portarias nesse sentido. E é preciso ter embasamento legal e jurídico para uma decisão como essa."

O presidente da consultoria Teleco, Eduardo Tude, afirma que a pressão norte-americana vai contra a cadeia de suprimento global do setor e, se for bem-sucedida, certamente levará a aumento de preços. Ele destaca que a americana Apple, por exemplo, produz o iPhone na China. "Voltar a uma fase pré-globalização, em que cada país produz seu equipamento, reduz os ganhos de escala. Isso vai se refletir em preços mais altos. Será pior para todos", diz o analista.

Na avaliação dele, o Brasil tem muito a perder caso se curve à pressão dos Estados Unidos. "Não vejo por que não devamos resistir. A política externa brasileira deve buscar uma posição de neutralidade. Numa briga de gigantes, não devemos nos posicionar de um lado ou de outro", afirma.

<b>Regra de segurança do Brasil não reprime nem privilegia empresas</b>

Mesmo com a pressão norte-americana e a liderança chinesa no 5G, até agora o governo não editou nenhuma norma que restrinja a atuação da Huawei no Brasil. Em março, o GSI editou uma Instrução Normativa (IN) sobre segurança cibernética, com requisitos mínimos para o 5G. Entre as diretrizes está a garantia da integridade, confidencialidade e privacidade.

A norma do GSI também orienta as operadoras a contratar, dentro de uma mesma área geográfica, equipamentos de, no mínimo, dois fornecedores distintos. A prática, no entanto, já é adotada pelas principais teles brasileiras para 2G, 3G e 4G, por estratégia comercial. Essa Instrução Normativa está em análise na Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).

Também está na Anatel a análise do edital do leilão do 5G, pelo direito de explorar frequências para transmitir o sinal. A disputa é restrita às teles – como Claro, Vivo, TIM, Oi e Algar, além de prestadores de pequeno porte – e não diz respeito a equipamentos usados.

Apesar das promessas de que a disputa ficaria para 2020, internamente, a agência sempre trabalhou com o prazo de 2021, corroborado pelo ministro das Comunicações, Fábio Faria.

Nos bastidores, as teles são contra a restrição de atuação da Huawei no Brasil, onde a empresa chinesa já está há 20 anos. A estimativa é que a chinesa esteja presente em algo entre 40% e 50% das redes do País. Além disso, boa parte da estrutura atual pode ser reaproveitada no 5G.

<b>Câmara teme retaliação ao agronegócio</b>

A Câmara dos Deputados deve entrar no debate sobre a Huawei e a segurança das redes 5G. Presidente da Comissão de Agricultura e das Frentes Parlamentares Brasil-China e dos Brics, o deputado Fausto Pinato (PP-SP) afirma que essa decisão deve ser tomada em conjunto entre Executivo e Legislativo. "Vou sugerir ao presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ) que crie uma comissão para darmos transparência total a esse processo de 5G no nosso país. Temos que visar o que realmente seja o melhor pro Brasil", disse.

Pinato afirma que o Brasil deve tomar a melhor decisão em termos econômicos e tecnológicos no que diz respeito ao 5G, "independente de ideologias". "Se não há consenso sobre o que fazer, vamos fazer um debate franco", afirmou. Para Pinato, a ala ideológica está levando o governo "para o buraco". "O vice-presidente e a ministra Teresa Cristina não vão aceitar isso", acrescentou.

O deputado defende um debate técnico e transparente sobre o tema e afirma que o Brasil não deve ceder a pressões ou paixões. "A China não é nenhuma santa, mas os EUA têm interesse nessa causa. Não podemos fazer algo só porque o Trump (presidente dos EUA, Donald Trump) disse. O mesmo Trump que briga com a China comprou respiradores de lá e depois faltou pra todo mundo. Não é briga nossa", afirmou. "Vamos entrar nessa briga para não ganhar nada e ainda por cima prejudicar o agro?", questionou.

<b>Estados Unidos apertam teles contra Huawei</b>

Os Estados Unidos têm intensificado movimentos contrários à chinesa Huawei e pressionado operadoras em todo o mundo. Declarações públicas do secretário de Estado norte-americano, Michael R. Pompeo, foram distribuídas pela Embaixada dos EUA no Brasil com esse teor. A Huawei se defende das acusações e afirma nunca ter tido incidentes relacionados à segurança em 30 anos de operação em mais de 170 países.

Em nota oficial, Pompeo defende a adoção de "fornecedores confiáveis" para o 5G. "A maré está se voltando contra a Huawei à medida que cidadãos de todo o mundo estão acordando para o perigo do estado de vigilância do Partido Comunista Chinês", afirma.

O secretário cita medidas anunciadas pela República Checa, Polônia, Suécia, Estônia, Romênia, Dinamarca, Letônia e Grécia. Ele menciona ainda iniciativas adotadas por teles na França, Índia, Austrália, Coreia do Sul, Japão, Reino Unido e Canadá. A nota destaca ainda que a Telefônica, dona da Vivo, também teria se comprometido a não usar equipamentos de fornecedores "não-confiáveis".

A Huawei afirma ser uma empresa privada, com muitos empregados como investidores, além de investidores privados. Por ter capital fechado, ela não tem, porém, o mesmo grau de transparência das nórdicas Ericsson e Nokia, listadas em bolsa e com balanço auditado por empresas independentes.

A empresa atua há 22 anos no País. "A segurança cibernética e privacidade do usuário são o principal foco de atenção da Huawei", reitera. A companhia fornece equipamentos para mais de 500 operadoras em todo o mundo e afirma ter 91 contratos confirmados no 5G até o primeiro trimestre deste ano.

Pesa contra a Huawei a Lei de Inteligência Nacional, de 2017, segundo a qual toda organização deve apoiar e cooperar com a inteligência do Estado. Para os críticos, essa legislação obrigaria as empresas que atuam no país a repassar informações ao comando do Partido Comunista, dentro e fora da China.

Sobre a suspeita, a Huawei afirma que suas soluções "estão de acordo com as leis de cada país em que atua" e que não trabalha "com qualquer governo ou instituição no sentido de criar backdoor para produtos ou serviços". A Huawei informa que tem trabalhado para achar formas de "gerenciar" as restrições propostas pelos EUA.

As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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