Opinião

Falta água, memória e compromisso com a verdade

Coluna do jornalista Ernesto Zanon que lembra quem são os verdadeiros responsáveis pelo abastecimento de água à população de Guarulhos

O episódio que envolve a falta de água em Guarulhos, além do problema em si vivenciado pela população, expõe algo tão grave quanto não ter o precioso líquido nas torneiras. A falta de memória recente até de pessoas que se sentem preparadas e estão envolvidas diretamente com a questão ajuda a divulgação mentirosa e aproveitadora de verdadeiras mentiras.

A mídia, geralmente formada por jovens jornalistas que pouco leem e que quase não têm compromisso com o passado recente, presta um desserviço à sociedade ao reproduzir, sem se remeter aos fatos, as notas de desculpas por parte dos verdadeiros responsáveis pelos problemas.

Tornou-se lugar comum nos últimos dias dizer que a culpa pelo desabastecimento em Guarulhos se deve única e exclusivamente ao Governo do Estado, que comanda a Sabesp (empresa estadual). Entretanto, poucos levam em consideração o fato de que o Saae (empresa municipal) é de responsabilidade da Prefeitura, sob o comando do PT há 13 anos.

A falta de memória, por exemplo, exclui o fato de o atual prefeito Sebastião Almeida ter sido o superintendente do Saae, em 2001, justamente no momento em que a cidade mudava radicalmente de administração. Quando tudo era atribuído a uma tal de herança maldita. Quando as promessas dos novos donos do poder ainda tinham crédito.

Assim, para refrescar a memória até de alguns políticos (esses têm seus motivos para deixar de lembrar certas coisas), vai uma contribuição. “É uma vergonha Guarulhos depender da água da Sabesp”. Esta frase foi pronunciada por Almeida em sua primeira entrevista coletiva como superintendente do Saae, no início de 2001. Ou seja, ele sabia do problema e deixou o tempo passar sem diminuir essa dependência. Hoje, só sabe cobrar o Governo do Estado, que apenas vende a água à empresa municipal, que a revende mais cara ao consumidor.

Na Câmara Municipal, nesta terça-feira, os vereadores ligados ao prefeito não economizaram palavras para atacar o Governo do Estado, seguindo o script petista iniciado semana passada quando o candidato do partido ao Palácio dos Bandeirantes, Alexandre Padilha, esteve em Guarulhos desfiando críticas ao atual governador. Esses, alguns quase iletrados, precisam justificar a que vieram. Em vez de prestar contas aos eleitores, babam para o governo municipal, como se a população não soubesse quem deveria lhes fornecer água.

Já a mídia, algumas vezes, prefere – por motivos que extrapolam o interesse do leitor – ignorar o que passou e jogar o jogo proposto pela atual administração. Não dá para culpar repórteres ou editores. Mas ninguém pode dizer que não sabia. Ninguém apaga o que está escrito.

Nesta história toda, espera-se que o consumidor – a parte mais fraca dessa corrente e a que sofre os problemas na pele – tenha boa memória. Difícil, por exemplo, enfiar goela abaixo do guarulhense a balela de que o rodízio de água só existe porque a Sabesp está sonegando água. Isso ninguém engole. Nem a seco. 

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