Variedades

Galerias nacionais criam postos avançados e se associam a estrangeiros

A veterana galerista Luisa Strina, há 42 anos no mercado, lembra com nitidez o primeiro esforço mundial para tirar a arte brasileira, africana e asiática do limbo. “Foi a exposição Le Magiciens de La Terre”, diz. Realizada em 1989 com curadoria do historiador Jean-Hubert Martin, ex-diretor de vários museus importantes e um dos primeiros a olhar sem preconceito para a produção contemporânea dos latinos. Martin incluiu na mostra francesa, exibida simultaneamente no Pompidou e na Grande Halle de La Villette, em Paris, obras de Mestre Didi e Cildo Meireles ao lado do alemão Anselm Kiefer, do inglês Richard Long, do russo Ilya Kabakov e do chinês Yang Jiechang, entre outros 101 artistas.

Em 1989, a participação artística brasileira era ainda tímida no Exterior. Em São Paulo, seis ou sete galeristas começavam a criar mercado lá fora para artistas conhecidos apenas entre colecionadores – como o próprio Cildo Meireles, apoiado por Luisa Strina, e Ernesto Neto, representado pelo marchand Marcantonio Vilaça (1962-2000). Dos anos 1990 em diante, instituições como a Tate de Londres e o MoMA de Nova York voltaram os olhos para a arte contemporânea brasileira. Nos anos 2000, esse interesse se consolidou com a compra de obras e realização de exposições, entre elas a mostra Century City: Rio de Janeiro 1950-64, de 2001, que marcou a criação, no ano seguinte, de um comitê para a aquisição de arte latino-americana na Tate Modern.

Tanya Barson, uma das curadoras do museu londrino, veio pela primeira vez ao Brasil em 2002 e, desde então, intermediou a compra de obras referenciais da arte feita no Brasil. “Não estamos criando uma coleção de arte brasileira ou latino-americana, mas construindo uma narrativa plural sobre a modernidade”, diz a curadora, destacando no acervo as monotipias de Mira Schendel, a instalação Babel (2001), torre com 900 aparelhos de rádio criada por Cildo Meireles, comprada recentemente, e a instalação Tropicália (1967), de Hélio Oiticica, avaliada em US$ 5 milhões.

Retrospectivas

Oiticica (1937-1980) não conquistou apenas Londres. Em setembro, o Carnegie Museum, em Pittsburgh, inaugura a primeira retrospectiva do artista nos EUA, Hélio Oiticica: To Organize Delirium, que cobre o período em que o carioca morou em Nova York (1971-1978) e de sua volta definitiva ao Rio (1978-1980). O marchand Daniel Roesler, que instalou uma filial da galeria criada por sua mãe, Nara Roesler, em Nova York, está negociando obras de Oiticica com o Museu de Arte Moderna de Nova York (o preço médio de uma peça dos anos 1960 hoje ultrapassa US$ 1 milhão).

Outro artista representado por Nara Roesler, o paraibano Antonio Dias, que dividia seu ateliê entre Milão e Colônia e está presente em coleções europeias como a Daros Latin America, ganha, a exemplo de Oiticica, uma mostra individual americana em 2017, no Philadelphia Museum of Art, que tem em seu acervo obras referenciais de Duchamp como O Grande Vidro.

“Não mudou a percepção dos colecionadores ou dos curadores de museus nos EUA nem o preço dos artistas brasileiros está baixo para seus padrões”, observa Daniel Roesler. “Simplesmente eles perceberam que nomes como Antonio Dias, Oiticica e Palatnik fazem falta em seus acervos”, justifica. Para se ter uma ideia, uma obra de Antonio Dias dos anos 1960 não sai por menos de US$ 1 milhão. Roesler chama atenção para o crescente mercado asiático, que começa a comprar brasileiros – o Long Museum de Shangai comprou recentemente uma obra de Vik Muniz. “A China está criando muitos museus particulares, mas é difícil negociar por causa da barreira da língua, pois não se cria uma relação de confiança”.

Algumas galerias brasileiras optaram por uma representação estrangeira, associando-se a marchands de outros países, como fez Raquel Arnaud ao firmar parceria com a galeria da francesa Denise René (1913-2012), que organizou em Paris mostras do escultor Sergio Camargo e Waltercio Caldas. “Já temos uma longa história desde que vendemos para a coleção de Patricia Cisneros em 1990”, conta Raquel.

“A arte brasileira passou a ser vista com outros olhos, não mais como arte exótica”, afirma a marchande Socorro de Andrade Lima, sócia da Millan, citando um dos artistas mais premiados da galeria, Artur Barrio (prêmio Velázquez), que ganha uma retrospectiva no museu Reina Sofia, de Madri, em março de 2018.

Outra veterana que está sendo redescoberta é a pintora Judith Lauand, representada pela Galeria Berenice Arvani, que recentemente fez duas exposições lá fora, uma na galeria Stephen Friedman, de Londres, e outra com a Driscoll Gallery de Nova York. A marchande também vendeu um relevo do construtivista Rubem Valentim (de 1967) para o Museu de Marrakech. Ainda em colaboração com galerias estrangeiras, a paulistana Almeida e Dale promove em Londres a primeira mostra de Volpi na Inglaterra. “Tivemos a visita de vários curadores de museus, entre eles um da Áustria, que já mostrou interesse em comprar”, revela Carlos Dale, um dos sócios da galeria.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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