O governo organizou uma ofensiva para derrubar ações de geradores que ainda travam o mercado de energia. A Advocacia Geral da União (AGU), a Procuradoria da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e a Consultoria Jurídica do Ministério de Minas e Energia (MME) entraram com um pedido para suspender uma liminar no Superior Tribunal de Justiça (STJ) que pode gerar um efeito dominó no setor.
A liminar é da Associação Brasileira de Geração de Energia Limpa (Abragel) e está nas mãos da ministra do Laurita Vaz, que deve julgá-la nos próximos dias. Qualquer decisão que a ministra tome será relevante, pois a ação em questão é a que está na maior instância judicial e pode criar um precedente para as decisões de primeira e segunda instâncias.
O processo diz respeito ao risco hidrológico, problema derivado da seca que atingiu o País nos últimos anos. Dezenas de liminares ainda travam 40% do volume de contratos comercializados na Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), o que representa em torno de R$ 1 bilhão por mês.
A força-tarefa da AGU, Aneel e MME entrou com petição no STJ para derrubar a liminar da Abragel no início de junho. O ministério, a Aneel e a CCEE se reuniram com os geradores na semana passada para propor a desistência das ações em troca de um acordo para parcelar os valores devidos. Como não houve concordância dos produtores, o governo decidiu apostar todas as fichas na derrubada da liminar.
Na avaliação de uma fonte envolvida nas negociações, a judicialização no setor elétrico está num patamar insustentável. Para o governo, as questões técnicas precisam ser discutidas na esfera administrativa, pois as liminares representariam uma vitória de pirro, revertida depois de um tempo.
O argumento do governo é o de que as liminares promovem uma “situação judicial favorável (e injusta) em favor dos agentes econômicos requerentes e desencoraja-os a aderir ao caminho legal”. “Assim, a lei não pode operar seus efeitos saneadores; o rombo financeiro no mercado de energia elétrica persiste; e retorna o risco de nova onda de ações judiciais sobre o tema, a qual seria catastrófica, uma vez que não há mais outra solução legal e administrativa a ser dada para o problema”.
Já na avaliação dos geradores, a proposta do governo para resolver o problema do risco hidrológico no mercado livre é ruim porque impõe muitos gastos, como a obrigação de comprar energia de reserva e a destinação de parte da energia gerada pelas as usinas para o consumidor. Os produtores argumentam que só devem suportar “custos relativos à falta de chuvas, e não custos e riscos de natureza política”.
Risco Hidrológico
Todo o problema está relacionado à gestão do setor elétrico nos anos de seca. Embora o sistema mandasse as hidrelétricas gerarem energia, para poupar água dos reservatórios, o governo decidiu acionar termelétricas. Assim, as usinas foram obrigadas a produzir menos energia do que o volume estabelecido em contrato e tiveram que comprar o que não entregaram no mercado à vista, a preços elevados.
No ano passado, mais de 100 produtores e associações de hidrelétricas entraram com ações para limitar ou eliminar prejuízos decorrentes dessa decisão. Com a falta de pagamentos por parte dos devedores, a CCEE não recebia recursos para liquidar as operações. Em seguida, os credores, como geradores térmicos, conseguiram liminares para ter preferência no recebimento dinheiro. Com a enxurrada de liminares, no fim do ano, o mercado ficou completamente paralisado e a inadimplência atingiu 78%.
Na época, o governo editou uma medida provisória com uma proposta para repactuar a dívida ao longo dos próximos anos. Em contrapartida, era necessário desistir das ações judiciais. Houve quase 100% de adesão no mercado regulado, que atende as distribuidoras e os consumidores residenciais.
Já a proposta para o mercado livre, em que os contratos são fechados diretamente entre geradores e indústrias, não teve nenhuma adesão, e as liminares são mantidas até hoje. A ação da Abragel, que representa pequenas centrais hidrelétricas, é uma delas. A entidade conquistou o direito de limitar o risco hidrológico de seus associados a 5%, quando o risco atingiu 15%, na média de 2015.
A Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Energia Elétrica (Apine) e empresas como Cemig e Light também possuem liminares nesse sentido.