Há sinais de mudança para um Estado mais condutor da economia

Apesar de ter se doutorado em Chicago, Ricardo Ffrench-Davis sempre foi contra os princípios do liberalismo e, agora, comemora o que vê como "sinais de mudanças em direção a um Estado com um papel mais condutor da economia, regulador dos mercados e promotor de desenvolvimentos produtivos que gerem mais empregos". Opositor de privatizações por acreditar que elas não promovem investimento produtivo, o ex-economista-chefe do Banco Central chileno e hoje professor da Universidade do Chile afirma que as estatais precisam se desburocratizar e investir em inovação.

<b>No mundo todo, os governos estão mais ativos na economia. Essa tendência continuará?</b>

Em meio à incerteza atual, há sinais no mundo de mudanças em direção a um Estado com um papel mais condutor da economia, regulador dos mercados e promotor de desenvolvimentos produtivos que gerem mais empregos. A redução da desigualdade também se alcança com estruturas produtivas inclusivas. Isso foi o que fez a Europa Ocidental no pós-guerra e também Coreia do Sul e Taiwan. Vejo uma consciência crescente em relação à gravidade da volatilidade excessiva dos capitais financeiros, seu papel especulativo e daninho para os investimentos produtivos e para a inovação. Essa volatilidade cria booms, seguidos por recessões. E isso hoje é criticado até mesmo pelo FMI e por prêmios Nobel de Economia. A América Latina deveria observar mais isso.

<b>Os chilenos aprovaram a elaboração de uma nova Constituição. É provável que, com essa Constituição, o Estado cresça. Como avalia a decisão dos chilenos?</b>

O resultado foi promissor. Espero que o Estado recupere as funções essenciais que a ditadura lhe tirou e cuja ausência é a causa da situação crítica que o Chile vive hoje. A nova Constituição não resolve os problemas, mas pode nos libertar de amarras regressivas, apagar os resíduos ditatoriais e a sombra de Pinochet. Pode dar espaço para as forças democráticas iniciarem uma nova etapa de desenvolvimento, que requer um crescimento vigoroso, inovador e inclusivo. É fácil destruir devido ao mal-estar com o declínio econômico, social e político dos últimos anos. É difícil construir e ser persistente ao longo do tempo. O debate começou. O Chile tem uma nova oportunidade de retomar o caminho de desenvolvimento que escolheu em 1990.

<b>Como vê as medidas econômicas dos primeiros anos do governo Bolsonaro?</b>

Elas incluem uma cópia lamentável dos erros da ditadura no Chile. Vocês fizeram uma reforma da Previdência. Nós estamos agora corrigindo a reforma da ditadura (que criou o sistema de capitalização). Entendo que Bolsonaro pretende fazer privatizações. Há algumas empresas estratégicas que acho lamentável privatizar, como de energia elétrica e água. Mas há coisas que penso que o Estado não precisa fazer, como produzir macarrão ou estar em pequenas e médias empresas. Isso distrai as autoridades das prioridades. O problema é que, em vez de os recursos privados serem destinados a novas empresas ou à expansão das atuais, eles acabam indo para comprar o que já existe, através das privatizações. A mensagem é que não vai haver incentivo ao investimento produtivo. É preciso incentivar a produção e a criação de novas empresas privadas. Além disso, as empresas nas mãos do Estado têm de fazer um esforço de inovação e de desburocratização, ao invés de apenas vendê-las massivamente.

As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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