Estadão

Ministro do TCU manda procuradores da Lava Jato devolverem R$ 2,5 milhões

O ministro Bruno Dantas, do Tribunal de Contas da União, determinou a devolução de valores gastos com diárias e passagens a procuradores da extinta Operação Lava Jato. Em despacho proferido nesta terça-feira, 9, o ministro apontou que o modelo de funcionamento da força-tarefa viabilizou uma indústria de pagamento de diárias e passagens a certos procuradores escolhidos a dedo, o que é absolutamente incompatível com as regras que disciplinam o serviço público brasileiro .

"Resta configurado dano ao erário decorrente de ato de gestão ilegítimo e antieconômico. Diante desse cenário, cumpre à Corte de Contas adotar as medidas a seu cargo para recuperar gastos que não foram geridos conforme a boa e regular gestão dos recursos públicos, em especial considerando os princípios da economicidade e da impessoalidade", registrou o ministro em seu despacho.

Dantas ainda indicou que deverão responder pelo dano tanto os agentes responsáveis pelos atos irregulares quanto aqueles que dele se beneficiaram de maneira imprópria , de acordo com os valores que excedem as despesas que teriam ocorrido caso adotado outro modelo, como a mera remoção dos interessados a atuar na Operação .

Nessa linha, o ministro determinou que sejam calculados os prejuízos ligados ao modelo escolhido pela força-tarefa – com pagamento de diárias e passagens em vez da remoção dos procuradores – e ainda ordenou a citação das pessoas responsáveis pela proposta de tal ajuste, mencionando diretamente a análise sobre o papel de Deltan Dallagnol, ex-chefe da força-tarefa que deixou o Ministério Público Federal e deve entrar para a política, disputando uma vaga à Câmara dos Deputados em 2022. Em caso de uma eventual condenação, Deltan pode ser declarado inelegível, após o trânsito em julgado do processo.

Dantas também mandou citar o procurador-geral que autorizou a constituição da força-tarefa, Rodrigo Janot, considerando não haver restado descartada a possibilidade de ela ter sido criada com o viés de beneficiar os procuradores envolvidos . Além disso, os Procuradores-Gerais e Secretários-gerais que autorizaram os pagamentos das diárias e passagens também serão chamados a prestar informações no âmbito do processo.

O despacho foi proferido após representações do Ministério Público de Contas e de Parlamentares que apontavam supostas irregularidades na gestão administrativa da Operação Lava Jato. Ao avaliar o caso, Dantas considerou que o modelo adotado pela força-tarefa garantia aos procuradores participantes o auferimento de vultosas somas a título de diárias, sem que tenham sido minimamente analisadas alternativas mais interessantes sob a perspectiva do Estado .

No documento de nove páginas, o ministro do TCU indicou que levantamento realizado por sua assessoria, composta de Auditores Federais de Controle Externo concursados, encontrou despesas que saltam aos olhos . Dantas cita os casos dos procuradores Diogo Castor de Mattos, que recebeu R$ 387 mil em diárias para atuar na Lava Jato de 2014 a 2019 em Curitiba, mesmo residindo naquela capital à época , e Orlando Martello Junior, oficialmente lotado em São Paulo, mas casado com uma procuradora residente em Curitiba , sendo que seu deslocamento à capital do Paraná entre 2014 a 2021 resultou no pagamento de R$ 461 mil em diárias, além do dispêndio de R$ 90 mil em passagens.

"Há, ainda, o caso de Carlos Fernando do Santos Lima, que atuou na Lava Jato de 2014 a 2018 e recebeu R$ 361 mil a título de diárias, além de ter dado ensejo ao pagamento de passagens que somaram mais de R$ 88 mil; de Antonio Carlos Welter, que recebeu R$ 506 mil em diárias e deu origem a gastos de R$ 186 mil com passagens; de Januário Paludo, a quem foram pagos R$ 391 mil em diárias e que deu causa ao pagamento de R$ 87 mil em passagens, entre outros", segue o ministro.

Somente os casos citados indicam despesas de mais de R$ 2,5 milhões. Na avaliação de Dantas, ficou evidente que o modelo da extinta força-tarefa atenta contra o princípio da impessoalidade, tanto por privilegiar os agentes administrativos em detrimento do interesse público, quanto por não adotar critério imparcial para a escolha desses mesmos agentes .

"Denota-se que um pequeno grupo de procuradores, que de modo algum retrata a imensa maioria dos membros do Ministério Público Federal, tivesse descoberto uma possibilidade de aumentar seus ganhos privados e favorecer agentes amigos, no âmbito da atividade funcional de combate à corrupção, admitindo-se como práticas naturais o patrimonialismo, a personalização e a pessoalidade das relações administrativas. Criavam-se, então, regras particulares e se toleravam os benefícios pontuais, evidentemente não extensíveis à sociedade como um todo ou mesmo aos demais membros do Ministério Público Federal", ponderou Dantas em seu despacho.

<b>COM A PALAVRA, A FORÇA-TAREFA </b>

Até a publicação desta matéria, a reportagem buscou contato com a extinta força-tarefa, mas sem sucesso. O espaço permanece aberto a manifestações.

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