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Mudar SP passa por diálogo com movimentos, diz urbanista

Ele concorda que a probabilidade de São Paulo eliminar seus graves problemas “não é muito grande”, vê com bons olhos a ideia de transporte público grátis e tem ressalvas a projetos pontuais de embelezamento das cidades e às parcerias público-privadas (PPPs). Autoridade mundial em temas referentes às transformações urbanas, o geógrafo marxista britânico David Harvey, professor da City University de Nova York, veio ao Brasil para debates e conferências em Brasília, Recife, Fortaleza, Curitiba e São Paulo.

Autor de livros como Cidades Rebeldes (Martins Fontes, 296 páginas, R$ 34,90) e o recém-lançado Para entender o Capital: Livro II e III (Boitempo, 392 páginas, R$ 58), ele concordou em responder perguntas sobre São Paulo de arquitetos e urbanistas convidados pelo jornal O Estado de S. Paulo.

São Paulo

“Sempre há possibilidades e eu penso que é importante, portanto, explorar o máximo possível delas. As possibilidades não se traduzem em probabilidades. De modo que a probabilidade de São Paulo sair dessa situação não é muito grande”, diz Harvey sobre a cidade eliminar seus graves problemas. “Em parte, me parece que a única maneira de grandes conurbações como a região de São Paulo poderem ser transformadas é trabalhando com elementos de dentro, com os movimento sociais, com os movimentos de protesto, e buscando caminhos para algum tipo de transformação da vida cotidiana e algumas reformas parciais. Não é impossível surgir um movimento desse tipo que faça parceria com o Estado. Minha maneira preferida de pensar nisso é dizer que, em vez de o Estado batalhar contra muitas organizações sociais, ele deveria tentar se estabelecer como um parceiro potencial. Portanto, sim, há possibilidades. Quais são as possibilidades de São Paulo, eu não sei. Do que as pessoas dizem, me parece que não são muito grandes (risos), mas há possibilidades”.

Coexistência

“É possível criar redes culturais ou de interesse dentro de uma cidade que não seriam encontradas de outra forma. Temos de estar de olho nesses novos tipos de estrutura. Imagino uma universidade pública e gratuita dispersa pela cidade, uma aula em cada lugar, Economia em uma praça, Cultura Popular em outra…”

Centro

David Harvey não acha que a expulsão da população de baixa renda para as periferias seja algo inexorável, “ela tende a acontecer, mas a Prefeitura tem de encontrar maneiras de lutar contra a lógica da expulsão para mudar esse resultado. A questão é como fazer isso. Sinto-me inclinado à ideia de que seria necessário criar formas de propriedade de imóveis que não pudessem ser comercializadas, que as protegeria assim da especulação. O poder público poderia escolher certas áreas ou prédios e dizer que não podem ser comercializados no livre mercado. Há vários lugares no mundo que fazem isso, como as co-ops nos Estados Unidos – são cooperativas de habitação que, quando você sai, só ganha de volta o valor que você pagou corrigido pela inflação, sem nenhum tipo de juros ou valorização que poderia tornar aquele imóvel alvo do mercado imobiliário. Outra ideia é a propriedade comunitária, em que se decide que certa área é de propriedade da comunidade e também não pode ser comercializada nem valorizada.”

Transporte grátis

“Há muitas coisas que poderiam ser feitas em curto prazo. Acho que uma delas é a regulação do tráfego”, sugere Harvey como possível alternativa para melhorar a qualidade de vida em São Paulo. E complementa, “devem ser garantidos a fluidez e o conforto e, em alguns casos, a solução depende da municipalização destas estruturas para que os investimentos sejam feitos independentemente dos lucros envolvidos. Também acho ótima a ideia de que se ofereça transporte grátis, sendo estruturado como parte vital de algum programa mais complexo”.

Embelezamento

“Acho que essa ideia de embelezamento da cidade, tentando criar ambientes mais agradáveis, principalmente na requalificação de escalas menores como nos pocket parks, são em geral boas iniciativas para melhorar a qualidade de vida na cidade. Entretanto deve haver cuidado, devemos fugir da ilusão de que uma requalificação estética resolve também as questões sociais. É claro que, se você cria um parque adorável, integrado aos valores da comunidade na qual está inserido, há grande possibilidade de que seus efeitos sejam duradouros.
Contudo, não há como impedir a alta nos valores do imóveis ao redor, e esse é sempre o perigo de qualquer melhoria feita na cidade: o lugar melhora, valorizando tudo o que está ao seu redor; os valores sobem, algumas pessoas não podem mais pagar para morar ali, outra são convidadas a vender seus imóveis para a especulação…”

PPPs

“As experiências nas cidades americanas mostram que essas parcerias tendem a levar o setor público ao risco do privado, da busca pelo lucro. Talvez existam situações em que as PPPs trabalhem para o desenvolvimento do que é público. Mas eu suspeito que a maioria das vezes funciona da maneira inversa. Projetos desse tipo envolvem tecnologias dominadas pelo setor privado e essa expertise pode ser usada para oprimir e subjugar o lado público. Enormes contratos estão sendo dados para o setor privado e em muitos casos não funcionam. E o setor privado acaba não sendo responsável por limpar a sujeita deixada para trás.”

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