Estadão

Myra Ruiz faz show com reflexões vividas durante o isolamento

Foi em 2014, quatro anos após retornar ao Brasil e ter composto o elenco de dois musicais, que a atriz e cantora paulistana Myra Ruiz chamou a atenção para seu trabalho ao interpretar Nina, uma das protagonistas de In The Heights – Nas Alturas. Ruiz angariou uma série de elogios, repetidos quando a artista subiu ao palco do Teatro Porto Seguro na pele da prostituta Saraghina em Nine – Um Musical Felliniano, sob a direção de Charles Möeller e Claudio Botelho.
Estrelando um dos solos mais elogiados da montagem, a artista começou a traçar caminho estelar no teatro musical brasileiro, culminando no sucesso massivo de sua performance como a bruxa má do oeste Elphaba, na temporada paulistana do blockbuster da Broadway Wicked.

Ao lado de Fabi Bang, Mira construiu legião de fãs que a alçaram ao primeiro escalão do teatro musical no Brasil. "Sinto que sou parte de uma transição entre gerações. Eu vim da galera que fez teatro musical meio espontaneamente, que não se formou necessariamente para isso, mas que surgiu por conta da demanda do mercado e, de repente, virou artista", conta a atriz que, durante a pandemia, descobriu um novo talento: educadora.

"A pandemia me trouxe isso, e meus alunos são pequenos alienígenas que são megatalentosos. Eles cantam, dançam e interpretam muito bem. Brinco dizendo que, graças a Deus, nunca vou precisar competir com eles, porque com treze anos e esse talento todo, imagina aos trinta. Enxergo este mercado com muita esperança, e espero que, com a nova leva de artistas, nós também sejamos mais criativos, com muitas mulheres diretoras e compositoras compondo o mercado com veteranos tão incríveis."

Além das aulas, o isolamento também trouxe uma série de questionamentos que a artista compila em Myra Vol II: Melancolia Eufórica, seu terceiro show solo (o segundo transmitido online), que acontece apenas neste sábado, 19, às 20 h (ingressos em www.sympla. com.br).

Idealizado quando a cantora abandonou o colo familiar, onde havia se instalado no início da pandemia, e retornou a seu apartamento em São Paulo, o show busca pôr em cena o universo particular de Ruiz que, pela primeira vez desde março de 2020, se viu completamente sozinha por um longo período, apenas com suas lembranças e pensamentos.

"Sou muito nostálgica, acho a nostalgia gostosa, não me faz mal. Ela faz a gente olhar para nosso presente às vezes até com mais amor, mas também nos leva a muitas lembranças. E eu queria dividir com o público esse universo que é tão meu, tão particular que criei no meu quarto, na minha casa", diz.

"Eu pensava em como as pessoas estão. As que estão isoladas ainda, como é para elas? Sei que cada um está num barco diferente nessa pandemia, mas não era nesse lugar, era uma questão mais interna. Então, comecei a entender o quanto de alegria tem na tristeza e vice-versa, e me veio o desejo de levar música para as pessoas novamente. É o momento de a gente olhar para várias questões do nosso País, da falta de rumo do governo, e aí comprei a ideia."

A música que busca levar ao público foi também essencial para sua própria sobrevivência. Isolada, a artista encontrou conforto ao ouvir repetidamente todas as manhãs A Noite Vai Chegar, o hit de 1977 lançado por Lady Zu como um dos grandes sucessos das pistas na década de 1970, e responsável pela esperança que brotou na artista.

A canção reflete parte do repertório do novo espetáculo transmitido do palco do Teatro Faap. No roteiro, títulos como Starman, de David Bowie, Levitating, de Dua Lipa, e Sorte e Azar, do grupo Barão Vermelho. "O objetivo é sempre dividir temas da minha vida com o público. Fazer minha arte e perceber o quanto esses temas são universais, o quanto essa conexão é gerada a partir do show. Isso é o que me interessa. E a gente tenta fazer com que, por ser online, isso nunca se perca numa coisa só visual. Apesar de não ter o olho no olho pessoalmente, eu quero que as pessoas sintam esta conexão."

Focando no momento pós-pandemia, Ruiz já planeja desenvolver projetos ao lado dos amigos Diego Montez e Thuany Parente: unir o repertório dos dois shows em um grande espetáculo e conciliar uma turnê com a agenda dos musicais que não vê a hora de voltar a fazer.

"Nós, artistas, não pudemos exercer uma coisa que é mais do que a nossa profissão, é o que a gente é. E foram meses muito estranhos, porque você se sente meio inútil, como se não pertencesse à sociedade. E meus shows me reavivaram. Ainda não é o ideal, não tem o calor do público, mas isso está nas trocas durante a pandemia. Eu devo isso a eles. É meu maior motivo de gratidão para levantar todo dia da cama. É a troca com o que eu posso chamar de meu público, certo? E eu sou muito grata porque eles fazem com que tudo seja possível", comenta.

As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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