Mundo das Palavras

Nojo de políticos

Habitualmente, se supõe que o uso de metáforas seja um privilégio reservado somente para os poetas. Guilherme de Brito, por exemplo, fez uso delas ao produzir aquele seu conhecido texto para uma música de Nelson Cavaquinho, no qual assumiu o papel de um homem que encontra, em algum lugar, sua ex-namorada. E, quer expressar a ela, com palavras, como se sentiu, naquele momento, ao comparar a permanência do sofrimento dele, pelo fim do relacionamento amoroso, com a aparência de bem-estar dela.


 


Brito poderia ter escrito, caso não quisesse se valer de nenhuma metáfora, simplesmente: “você está exibindo um bem-estar que perturba meu sofrimento”. No entanto, com muito mais força e expressividade, ele escreveu: “tire o seu sorriso do caminho, que eu quero passar com a minha dor”.


 


Em situação oposto à dos poetas estariam os jornalistas, segundo o senso comum. Afinal, eles são obrigados a usar as palavras com o máximo de exatidão, por imposições profissionais, ética e técnica. E isto, aparentemente, seria inalcançável através de um recurso típico da linguagem poética, como a metáfora.


 


Completo engano. Basta ler com atenção os textos de um antigo e consagrado jornalista como Joelmir Betting para que se perceba, facilmente, o poderoso efeito esclarecedor obtido com o uso de metáforas, em temas áridos de Economia. Ninguém questiona o valor das metáforas num texto jornalístico no qual aparecem frases com esta: “A Economia Mundial está numa corda bamba”. E esta: “Há uma nova onda de demissões”.


 


Igualmente úteis são as metáforas dentro do Jornalismo Político. Entendemos, com rapidez, a situação de um ministro quando os jornais dizem que já começou a “fritura” dele. Ou que surgiu no Congresso um novo “trem da alegria”.


 


Aliás, há poucos dias, o Jornalismo Brasileiro produziu um texto que, no futuro, poderá ser incluído em qualquer novo Manual de Jornalismo. Ele demonstrou não só a apropriação pelos jornalistas de um recurso de linguagem supostamente exclusivo dos poetas pelos jornalistas, como o efeito devastador que pode alcançar o emprego de metáforas na área do Jornalismo Político.


 


O texto foi assinado por Fernando de Barros e Silva. Mas, o comentarista político ressaltou que, nele, se valeu de uma charge de Angeli na qual o chargista criou metáforas visuais para mostrar uma correspondência entre o mundo da política e o crime organizado, no Brasil. A partir da charge, Fernando criou novas metáforas sobre os congressistas de Brasília.


 


Escreveu: “O baixo clero brasiliense talvez pudesse ser comparado à cracolândia onde vive em função do vício uma horda de zumbis irrecuperáveis”. Ele indagou: “Quem já não viu um deputado com crise de abstinência, atrás de cargos, verbas, favores, migalhas de poder?”. Depois, o jornalista acrescentou: “Os partidos (ou certos partidos) agem como facções, rivais ou associadas, disputando espaços de poder e benefícios num mercado ultracompetitivo”.


 


Antes, Fernando já tinha indagado: “Quem seria o PCC de Brasília? Quem é do Comando Vermelho?”


 


Oswaldo Coimbra é jornalista e pós-doutor em Jornalismo pela ECA/USP

Posso ajudar?