Opinião

QUEM É O INIMIGO, QUEM É VOCÊ?

Confira coluna do jornalista Ernesto Zanon sobre as manifestações contra aumentos de tarifas que se espalham por todo o Brasil

 

 

O que está acontecendo com o Brasil? Não vi ainda ninguém apresentar
uma definição clara sobre a sucessão de protestos que se espalham pelo país,
principalmente contra os recentes aumentos de tarifas de ônibus nas grandes
cidades. Talvez, ainda ninguém se deu conta nem de identificar contra quem se
está lutando.

Em 1989, senti na pele uma repressão policial. Estudante na
Universidade Estadual de Londrina, aderi a uma manifestação pacífica – que acabou
fugindo ao controle dos organizadores – que tinha como objetivo exigir da
prefeitura daquela cidade que revogasse a cobrança pela carteirinha de
estudantes, que dava direito à compra dos passes escolares com 50% de desconto.
Para os alunos, uma causa nobre. No entanto, o movimento escolheu o terminal de
ônibus, às 18h, horário de rush. Adivinhem o que aconteceu? O pau comeu.

Os PMs, sempre com o objetivo de manter a lei e a ordem,
partiram para cima dos manifestantes, que já não eram o grupinho de estudantes
com sua reivindicação particular. A população enfurecida pelos serviços mal
prestados resolveu colocar as mangas de fora e aderir ao protesto que tomou
grandes dimensões. Acabei dentro de um camburão tomado por gás lacrimogênio,
depois de levar cacetetadas por todo o corpo e fui parar em uma delegacia onde
passei a noite toda. No final, tudo acabou bem e serviu de experiência. Um
detalhe: não havia orquestração político-partidária por trás de nós.

 Era apenas uma
mobilização inocente de estudantes, muito diferente do que ocorre agora, quando
– antes de irem para as ruas – os manifestantes têm à sua disposição, na
internet, um verdadeiro guia com o modus operandi do movimento. Tem até
instrução de como se vestir e a reagir quando for abordado pela truculência
policial. Ah, sim. Se não houver polícia, o movimento não tem graça, não dá
mídia.

Fora que, após todo o leite derramado, temos diferentes
interpretações do mesmo tema. Como ninguém sabe contra quem está lutando,
percebe-se exageros de todos os lados. Quem gosta do PT, diz que a PM de SP,
nas mãos do PSDB, é violenta. Mas tem a PM do Rio, de responsabilidade do PMDB,
aliado do PT, que age da mesma forma. E a do RS, do mesmo PT… Já os tucanos
juram de pés juntos que os protestos são contra o prefeito do PT, que não
cumpre o que prometeu na campanha. Mas os aumentos se referem também às tarifas
do Metrô de responsabilidade dos tucanos…. E por aí vai.

Quem quer por a culpa na PM usa imagens de policiais pit
bulls em direção a mocinhas inocentes. Quem defende a corporação apresenta a
foto do PM com a cabeça rachada, acuado pela multidão enfurecida. Há argumentos
para todos os tipos de gostos. Basta escolher o seu.

O que poucos dizem é que o Brasil vive um momento terrível.
A volta da inflação começa a se traduzir nas ruas. Essa moçada que se revolta
ainda não tinha convivido com os tempos anteriores ao Plano Real quando um
preço não se repetia no dia seguinte. Nem imaginam o que era a hiperinflação
proporcionada pelo desgoverno de José Sarney, hoje um velho aliado do PT.

E se o aumento das tarifas
incomodasse tanto assim, por que ninguém falou um a quando o prefeito de
Guarulhos, Sebastião Almeida (PT), diferente de seus colegas de outras cidades
que seguraram os reajustes, repassou um aumento acima da inflação (de 10%)
ainda em dezembro, às vésperas do Natal? Ou a tarifa de Guarulhos, a R$ 3,30
por mais de cinco meses, não atingiu o bolso dos consumidores?

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