Virginia Woolf, Simone de Beauvoir e Clarice inspiram drinques na pandemia

Os mistérios de Clarice Lispector, as camadas de Virginia Woolf, a liberdade de Simone de Beauvoir. Do mergulho na personalidade e na obra dessas três autoras essenciais, o Eugênia Bar criou ou recriou, durante a pandemia, drinques que devem entrar no cardápio da casa quando ela puder voltar a atender o público em Pinheiros. Por enquanto, quem quiser experimentar e tentar decifrar esses traços literários pode pedir pelo delivery.

Inaugurado em 2018, o bar sempre teve uma relação muito estreita com a literatura, tanto que ele abriga uma boa biblioteca de livros escritos por mulheres e já foi palco de lançamento de obras de autoras. A ideia era que ele fosse um lugar onde mulheres pudessem tomar um drinque tranquilamente, sozinhas ou com amigas, e folhear um livro. Enfim, um lugar para elas – e aqui Viviane lembra o conhecido texto de Virginia Woolf (1882-1941): Um Teto Seu. "Ela falava da importância de a mulher ter seu espaço. Se ela não tem seu espaço criativo, ela não tem a liberdade de pensamento", comenta.

Virginia já era um drinque no cardápio do Eugênia, mas a editora Simone Paulino não sabia. Ela estava começando a preparar o primeiro livro de Virginia Woolf no catálogo da Nós, teve a ideia de fazer o Dalloway Day no Brasil e queria comemorar. Como não dava para sair, pensou em mandar um drinque para algumas amigas e celebrar virtualmente a chegada da autora inglesa à sua editora. "Contei essa história para a Viviane e ela disse que tinha o Virginia. Eu pirei. Mandei para as meninas com uma taça especial. Foi uma surpresa bem bacana. Mas o mais incrível foi que no drinque vai licor de flor de sabugueiro e no livro que eu tinha acabado de editar, um livro inédito no Brasil, Virginia falava da flor de sabugueiro. Achei superpoético tudo isso", conta a editora.

A receita vem do livro Free the Tipple: Kickass Cocktails Inspired by Iconic Women e é uma releitura de um coquetel dos anos 1920 chamado The Last Word, explica Viviane Ka, que é também escritora. "Esse drinque tem várias camadas de sabores para você descobrir. Tem o amargo e o doce. Virginia usou bastante o presente, passado e futuro juntos e as narrativas em várias vozes. Em As Ondas, por exemplo, que é narrado em quatro vozes, o leitor tem que ir descobrindo quem está contando." A inspiração, ela completa, vem dessas coisas mais sutis e mais sensíveis e traz o que a equipe acha que corresponde à personalidade ou à obra da autora homenageada. "É um convite para a sensibilidade."

Se Virginia Woolf é uma paixão mais recente na vida de Simone Paulino, Clarice Lispector (1920-1977) acompanha a editora desde sempre. E, no ano do centenário de uma das maiores escritoras brasileiras, por que não homenageá-la também com uma bebida? E a editora, que ia dar um curso no começo do mês sobre a autora nascida na Ucrânia e que chegou ao Brasil aos 2 anos, voltou a ligar para o Eugênia Bar para ver se era possível desenvolver esse drinque e mandar para os alunos. Clarice já existiu, porém, foi tirado do cardápio porque ainda não estava redondo, lembra Viviane.

"Quando Simone falou que era legal ter os drinques poéticos, fomos mais fundo nas pesquisas." Por pesquisa, entende-se: ler livros de literatura, consultar livros de coquetelaria, fazer testes, provar os sabores. O fechamento do bar pela pandemia atrapalhou o caixa, mas favoreceu a criatividade.

Para este drinque, foi usado morango macerado no vinagre de cidra. "Isso dá uma estranheza. A sensação na boca é diferente do que você cheirou. E a ideia era essa mesmo, remeter aos mistérios de Clarice. Vai ainda gim artesanal local, para trazer algo de sua identidade brasileira, e uma vodca russa feita na fronteira com a Ucrânia, e acompanha morango desidratado. Uma outra versão está em desenvolvimento e vai levar licor de jabuticaba – a fruta aparece em sua obra.

Para completar o trio poético, Simone foi criado a partir da imagem de Simone de Beauvoir (1908-1986) bebericando com os amigos filósofos numa tarde de verão na Paris dos anos 1930. Vai Liqueur dAbricot G.E. Massenez, vodca francesa Grey Goose e suco de limão-siciliano.

Cada um desses drinques custa R$ 35 e eles – e outros do bar – são entregues em garrafinhas às sextas e aos sábados, das 18h às 22h. Quem quiser também pode comprar uma das taças que a equipe garimpa em feirinhas e antiquários por algo entre R$ 20 e R$ 30. Pedidos especiais são aceitos durante a semana, bem como drinque on demand. Como Simone Paulino, o escritor Ricardo Lísias também encomendou um para um curso que deu em julho sobre Marcel Proust. Viviane voltou a ler o autor e sugeriu o Albertine, em homenagem à sua personagem. "Achei de fato um sabor difícil de definir, realmente contraditório." Como ela.

<b>Sem álcool</b>

Escritores têm inspirado, também, chás em cafés por aqui. Idealizado por Lais Trajano, The Feminist Tea tem 10 blends que levam nomes de mulheres. Clarice, Simone e Virginia estão lá. "O blend Virginia é relaxante, recomendado para ajudar no sono e para quem tem ansiedade e depressão. Esse chá, para mim, é a cara da Virginia Woolf: ele traz um mood mais invernal, introspectivo." Já a Combo Café e Cultura, livraria instalada numa banca nos Jardins, aposta em café. A cada três meses eles trocam o blend. O atual é o Fiódor. O anterior foi o Virginia.

PARA PEDIR EM CASA

Eugênia Bar. WhatsApp 11 93093-5419
Combo. Peça pelo Facebook
The Feminist Tea. www.thefeministtea.com

As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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