A jornada de trabalho dos brasileiros chegou, em 2015, ao menor valor já registrado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Levantamento feito pela reportagem do Estado com os dados mensais da Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do período entre janeiro e novembro de todos os anos da série histórica, isto é, de 2003 até agora, mostra que a média de horas efetivamente trabalhadas no Brasil chegou a 39,9 horas semanais neste ano. Em igual período de 2003, a média foi de 41,3 horas por semana. No ano passado, a média ficou em 40,2 horas trabalhadas por semana.
O número de 2015 é, também, o primeiro a ficar abaixo das 40 horas semanais, valor que é bandeira de todas as centrais sindicais do País. Há anos, os sindicalistas lutam para que o Congresso Nacional aprove emenda constitucional permitindo que a jornada semanal, fixada em 44 horas desde 1988, seja reduzida a 40 horas.
Segundo o professor da USP e coordenador do projeto “Salariômetro” da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), Hélio Zylberstajn, o mercado de trabalho brasileiro está atravessando uma “mudança estrutural histórica”, com a combinação de diversos fatores, como aumentos de produtividade, que reduzem a necessidade dos trabalhadores desempenharem suas funções por muitas horas consecutivas, além de conquistas sindicais, que vêm há anos inserindo nos acordos coletivos mecanismos de redução e controle da jornada.
“A marcha da recessão, que ficou clara neste ano, ainda vai se prolongar por um ou dois anos, e isso deve reduzir a jornada de trabalho ainda mais, com os acordos de lay-offs (suspensão temporária do contrato de trabalho) e com aumento das demissões de trabalhadores menos especializados, que cumprem jornadas maiores”, afirmou Zylberstaj. “Mas assim que a economia começar a se recuperar, a jornada deve aumentar até rapidamente, por fenômeno clássico: o empregador vai aumentar a carga horária de seus funcionários, num primeiro momento, e só vai contratar mais trabalhadores depois de ganhar confiança.”
Os sindicalistas, por outro lado, avaliam que boa parte da explicação para a queda na jornada de trabalho em 2015 vem da crise econômica, e menos pela tendência geral de redução na carga horária. “A jornada caiu muito por conta das demissões e dos cortes de horas trabalhadas nas montadoras e na indústria de autopeças”, avalia o secretário-geral da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Sérgio Nobre.
Segundo ele, a redução paulatina da jornada registrada até 2014 foi fruto da produtividade, do lado das empresas, e das conquistas sindicais, do lado dos trabalhadores, mas desde o início de 2015, a carga horária tem caído por razões mais negativas do que positivas.
“Até o ano passado, a jornada de modo geral caía por boas razões. As empresas não precisavam mais ficar com um mesmo trabalhador por 44 horas por semana e começavam a diminuir a carga”, disse Nobre. “Os sindicatos também foram conquistando jornadas menores. Estava dando certo, o que fortalecia a bandeira das centrais. Mas agora o quadro mudou.”
De fato, os dois únicos momentos em que a jornada semanal de trabalho subiu, desde 2003, foram em anos de crise econômica. Entre 2003 e 2007, a carga horária foi caindo ano a ano, saindo de 41,3 horas em média para 40,4 horas em média, respectivamente. Em 2008, no entanto, a jornada aumentou, registrando 40,7 horas. Naquele ano explodiu a crise econômica mundial. O outro momento de alta foi justamente no ano passado. A jornada caiu ano a ano entre 2009 e 2013, chegando a 40,1 horas, mas subiu um pouco, a 40,2 horas, em 2014, antes de cair novamente este ano.
Para o especialista João Saboia, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a crise de 2015 não pode, sozinha, explicar a redução da jornada. Sobre os dados do IBGE levantados pelo jornal O Estado de S.Paulo, Saboia comentou que “há uma tendência clara de redução da jornada no Brasil” e que a grave crise deste ano não alterou esse movimento estrutural.
“Houve um incrível aumento da formalização do mercado de trabalho no Brasil nesse período, especialmente entre 2004 e 2013. Quando o trabalhador sai da informalidade e passa a ter carteira assinada, a jornada dele passa a ser menor, porque há mais controle. Foi o que ocorreu: as pessoas estão trabalhando menos mesmo”, disse Saboia. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.