Economia

Demanda do setor aéreo deve seguir em queda, mas preço de passagens pode subir

A perspectiva de continuidade da fraqueza econômica do Brasil em 2016 deve seguir impactando o setor aéreo, fazendo com que a demanda por voos domésticos continue em queda no ano que vem. Com isso, as principais companhias do setor devem permanecer focadas em preservar seu caixa, dando prosseguimento ao corte na oferta de assentos. Contudo, caso o cenário econômico se deteriore ainda mais, outras medidas podem ser tomadas, como o reajuste nos preços das passagens e, em último caso, o corte de postos de trabalho.

Em meio à queda na demanda, o sócio da KPMG no Brasil, Marcio Peppe, destaca que em um cenário de forte desvalorização do real as aéreas precisarão lidar com a pressão nos custos. “Quando se tem o preço do combustível denominado em dólar, por mais que ocorra uma queda no preço do barril do petróleo, esse preço em dólar acaba gerando um aumento de custo em moeda nacional”, diz o sócio da KPMG, ressaltando que os contratos de arrendamento de aeronaves, com parcelas em moeda estrangeira, e os custos para manutenção de motores e aeronaves, também precificados em dólar, representam outras fontes de pressão para as empresas.

“Se considerarmos que a principal fonte de receita é a venda de passagens no mercado doméstico, em real, há um descasamento entre receitas e despesas”, afirma o sócio da KPMG.

Contornar esse quadro de demanda em baixa e custos em alta é “praticamente impossível” no curto prazo, segundo o coordenador técnico da Lafis Consultoria, Felipe Souza. Para ele, uma das poucas medidas que as empresas podem tomar para minimizar esse quadro são os cortes na oferta de assentos “a fim de se readequarem à nova relação entre a oferta e a demanda, na busca por maior rentabilidade”.

A Gol Linhas Aéreas já anunciou que estima uma queda de 4% a 6% no volume de decolagens no mercado doméstico para o primeiro semestre de 2016 ante o mesmo período de 2015. A TAM, por sua vez, afirma que irá promover uma queda de 6% a 9% na oferta doméstica ao longo de 2016, enquanto a Azul trabalha com uma perspectiva de redução de 4% a 5% na oferta doméstica no ano que vem.

“É cedo para dizer sobre maiores cortes na capacidade”, disse, em novembro, o presidente da Azul, Antonoaldo Neves. “Tínhamos nos preparado para crescermos 15% neste ano, mas crescemos 4%.”

“Quando falamos do setor aéreo e transporte de passageiros, tem que ficar cristalizado que existe uma interrelação com o desempenho da economia”, diz Peppe. “Considerando um agravamento no cenário econômico, a tendência é de que ocorra uma redução na demanda por passagens aéreas”, continua.

Aumento de preços

Segundo Souza, da Lafis, além do corte na oferta, uma possibilidade para as aéreas é o reajuste nos preços das passagens. “Em alguma medida, as operadoras precisam repassar aos consumidores o impacto da desvalorização cambial por meio do aumento da tarifa aérea, ainda mais em um cenário onde a margem operacional das aéreas se encontra em um patamar em que não é mais possível absorver novos aumentos de custos”.

Para Peppe, contudo, a possibilidade de aumento nas passagens pode ser pensada, mas a conjuntura econômica impede reajustes muito amplos. “A não ser em rotas de alta densidade, como uma ponte aérea, em que não necessariamente a pessoa tem a possibilidade de deixar de viajar”, disse. “Há a possibilidade de reajuste, mas acho que não deve ser tão significativo para recompor as perdas das companhias. Um aumento muito grande nos preços induz uma redução maior da demanda.”

Dados compilados pela Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear) mostram que a demanda doméstica por viagens aéreas recuou 7,9% em novembro deste ano na comparação com o mesmo mês do ano passado. Foi o quarto mês consecutivo de queda na demanda doméstica – em agosto, setembro e outubro foram registradas retrações de 0,6%, 0,8% e 5,7%, respectivamente.

Segundo o presidente da Abear, Eduardo Sanovicz, a tendência é de que a queda na demanda doméstica se acentue em dezembro e que o ano de 2015 se consagre como o pior na série histórica da entidade. “Não vemos um cenário de melhora em menos de 24 meses. Os números serão piores em 2016 e continuarão ruins em 2017, com certeza”, disse Sanovicz, em novembro.

Emprego

Segundo o sócio da KPMG, caso a situação econômica siga se deteriorando, a tendência é de redução na frota disponível, o que pode gerar o desligamento de parte das tripulações das aéreas. “Tirar uma aeronave da frota pode afetar até cinco tripulações, além da equipe de solo. No fim do dia, a tendência é que possa ocorrer no segmento de aviação uma redução no quadro de funcionários”, disse Peppe.

A hipótese de demissões, contudo, é rechaçada pela Gol. Segundo o vice-presidente financeiro e de relações com investidores da companhia, Edmar Lopes, a empresa não está demitindo funcionários, mas, neste momento, também não está contratando. “Conforme administramos o turnover e não repomos as vagas automaticamente, o quadro da companhia se reduz ao longo do tempo”, disse Lopes, durante reunião com analistas e investidores em dezembro.

Já o coordenador técnico da Lafis pondera que a necessidade de se manter um grande contingente de empregados qualificados nesse modal, como pilotos e equipes de manutenção, para garantir o bom funcionamento das operações pode advogar a favor dos trabalhadores. “O Brasil ainda apresenta um déficit destes profissionais qualificados e, caso as empresas optem por demiti-los, encontrariam dificuldades para recontratação em períodos de reaquecimento da demanda.”

Aportes

Para Souza, o aumento na participação de estrangeiros nas companhias aéreas brasileiras, como o verificado entre Delta Air Lines e Gol e HNA Group e Azul, pode ser uma alternativa interessante para aumentar a liquidez das aéreas em meio ao cenário de dificuldade.

“O mercado nacional ainda guarda grande potencial de expansão”, disse o coordenador técnico da Lafis, afirmando que empresas estrangeiras que visam o crescimento no mercado brasileiro podem se interessar em investir nas aéreas do País. “Esta poderia ser uma boa alternativa para as empresas nacionais, uma vez que receberiam um fôlego financeiro para honrar seus passivos e sustentar períodos de baixo crescimento da demanda e do faturamento.”

Já Peppe destaca que a entrada de participantes estrangeiros é interessante caso envolva a entrada de recursos na companhia. “A troca de ações entre o controlador e um novo investidor, se não gerar ingresso de recursos, seria trocar seis por meia dúzia, do ponto de vista de caixa.”

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