Economia

‘A sensação é de que o crime compensou’, diz presidente da Riachuelo

Um dos empresários que capitanearam o movimento em defesa do impeachment de Dilma Rousseff, no ano passado, o presidente da Riachuelo, Flávio Rocha, afirma que a delação da JBS, que jogou o governo Michel Temer em uma crise política e colocou em risco a aprovação das reformas previdenciária e trabalhista, é uma prova de que o crime, nesse caso, compensou.

Segundo Rocha, o fato de os irmãos Batista terem saído livres ao denunciar figuras como o Temer e o senador Aécio Neves (PSDB-MG) foi uma vitória da ala da sociedade que ele classifica de antirreformista – grupo em que inclui empresários alçados à categoria de “campeões nacionais” no governo Lula.

Leia os principais trechos da entrevista:

O sr. acha que as reformas ainda têm chance de sair?

Sim, as reformas têm chance de sair. Dados extremamente positivos estão sendo divulgados. Depois de 24 meses, tivemos o primeiro número realmente positivo do varejo nessa semana (o varejo teve o melhor resultado para abril em 9 anos). Acho que a crise política está se descolando da economia.

Pelo menos as reformas trabalhista e previdenciária saem?

Talvez a reforma previdenciária saia já muito combalida, muito fragilizada. Será preciso se retomar esse assunto em 2018 e 2019. Já a reforma trabalhista traz um grande avanço, principalmente para varejo e serviços, que tinham mais dificuldade com uma legislação de DNA exclusivamente industrial e de 70 anos atrás.

Mas não houve um retrocesso? A aprovação não está menos garantida?

Realmente foi um retrocesso, porque hoje temos três grupos bastante atuantes: os reformistas, que querem a solução estrutural definitiva; os jacobinos, que não querem resolver o problema, querem só vingança e acham que a corrupção se vence na questão policial; e os antirreformistas. Essa cumplicidade surpreendente do (Rodrigo) Janot com o (empresário) Joesley Batista representa a união de dois grupos que não estavam unidos até então. São os antirreformistas com os jacobinos. Isso isola os reformistas, é muito preocupante.

O sr. falava nos campeões nacionais como “empresários de conluio” com o governo…

Os empresários de conluio estão mostrando sua força, eles são os antirreformistas. Esse episódio (a delação da JBS) é uma vitória dos empresários de conluio. É uma situação muito perigosa porque passa a ideia de que a luta contra a corrupção avançou, quando na verdade ela recuou. Isso atrapalha na medida em que interrompe as reformas. E, queira-se ou não, o presidente Temer estava reunindo as últimas energias dele para lancetar o tumor. Ele fica fragilizado.

Existe um substituto para Temer no horizonte?

Não existe. Esse foi o fator que o fez resistir a todos esses embates, a ausência de uma alternativa de consenso.

A economia ainda tem chances de se recuperar no segundo semestre?

Claro que poderia estar melhor. A recuperação virá num ritmo bem mais lento. Eu acho que a retomada econômica estava claramente delineada, mas sofreu um baque. E (a delação da JBS) dá uma sensação de que o crime compensou, pois formou essa articulação vitoriosa. Se culminasse com a derrubada do governo reformista, daria uma triste sensação.

E o fato de os delatores da JBS terem saído livres? Isso incomoda o sr.?

Sem dúvida, porque são crimes muito sérios. Eu acho que isso que dá sensação de que toda essa articulação saiu vitoriosa.

Como o sr. vê o fato de Temer ter recebido Joesley no Jaburu?

A missão de Temer, se ele quiser entrar para a história, é aprovar as reformas. Mas isso passa pelo Congresso e, por isso, ele teve de se curvar e encontrar o homem que tinha mais influência no Congresso. O poder dele na política era quatro vezes superior ao da Odebrecht – a Odebrecht financiou 450 políticos; ele financiou 1.900. Temer não podia se indispor com ele (Joesley), teve de engolir esse sapo.

Existe a chance de Temer, com a crise, virar um “governo fantasma”?

Eu acho que, mesmo que o Temer saia combalido, o termo Sarneyrização, que tem sido usado, não se aplica. Isso porque Sarney tinha uma falta de agenda. Não é o caso agora, pois existe o projeto Ponte para o Futuro, que inclui as reformas. Pode ser que a crise vá alterar a velocidade de implementação, pois os antirreformistas tiveram uma vitória e conseguiram angariar uma parte da opinião pública. Isso é até compreensível, diante de toda a impunidade do passado. No entanto, neste caso, foi uma vitória do empresariado de conluio.

De maneira geral, o Brasil precisa cortar os privilégios a grupos específicos?

É essencial. Tome-se o exemplo da reforma da Previdência. A União gasta 20% do seu orçamento gigantesco para 1% da população. Temos de falar não em reforma da Previdência, mas em reforma da Previdência do funcionalismo público, pois o governo gasta o mesmo com 33 milhões de trabalhadores da iniciativa privada e com apenas 1 milhão de aposentados do setor público. Aí é que está o grande fator de ajuste. O governo é um Robin Hood às avessas. O trabalhador mais pobre paga impostos nos produtos mais básicos para sustentar a aposentadoria de uns poucos.

O resultado da eleição de 2018 preocupa?

Eu não compartilho com esse receio (de que apareça um salvador da pátria), porque o eleitor está melhor. Vai haver uma grande depuração. Talvez o que aconteceu na França seja uma antecipação do que pode acontecer aqui. Temos alternativas muito boas, acho que vai ser um reformista, um liberal. As lições deste triste período foram duras, mas ficaram.

E o sr. vai se candidatar?

Não. O que tenho dito é que o instrumento das mudanças são o indivíduo e a empresa. Acho que o empresário tem um papel político a desempenhar, mas sem sair dessa função empresarial. Não sou candidato.

E como fica o planejamento da Riachuelo com o cenário atual?

Quem paga o maior preço é o varejo menos organizado, mais fragilizado. Nós apresentamos um resultado excepcional no primeiro trimestre, e acreditamos que vai continuar agora. Tivemos mudanças internas muito bem sucedidas. Estamos até acelerando o programa de investimento. Quando você olha o horizonte mais de longo prazo, não há como não ser otimista. As mudanças na economia, se serão feitas agora ou depois de 2018, não serão consequência de um grupo palaciano circunstancialmente no poder. As mudanças serão consequência de uma mudança mais profunda que está acontecendo na raiz, na cabeça do eleitor.

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