Estadão

Cautela externa com juros e interna por âncora fiscal leva Ibovespa à queda

Os sinais de juros altos por mais tempo do que o imaginado em economias como a dos Estados Unidos e na Europa geram cautela nos mercados internacionais, o que contamina o Ibovespa. As commodities caem, em meio a temores de demanda encurtada. Com isso, as ações ligadas ao segmento cedem fortemente, com destaque para Vale, que ainda reage aos dados de produção e vendas do primeiro trimestre, em meio a uma leitura negativa dos números.

"O índice começou com uma queda meio tímida. O que mais está puxando, claro, é o recuo de Vale e Petrobras, que pesam quase 25% na carteira. Então, é normal essa desvalorização do Ibovespa. Tem os dados divulgados pela mineradora e ainda o recuo do minério de ferro caiu 0,96% em Dalian, na China. Vale já está sendo negociada a R$ 75", avalia Rafael Schmidt, operador de renda variável da One Investimentos.

Além disso, acrescenta a queda de quase 1,8% do petróleo no exterior, o que contamina as ações da Petrobras e do setor. "Os papéis de bancos também caem e pesam por conta do arcabouço fiscal. Gera um sentimento de conforto o fato de se ter uma regra, mas são regras que podem ser quebradas. Isso preocupa", completa Schmidt.

Jansen Costa, sócio fundador da Fatorial Investimentos, também reforça que em um primeiro momento, o arcabouço fiscal é bom por tirar um pouco das incertezas do radar. "Só que isso é uma visão de curto prazo. O sinal de descontrole dos gastos no médio e longo prazos desagrada. A perspectiva é que vem se confirmando que será um governo mais gastador", avalia Costa.

Após abrir em queda, aos 106.148,97 pontos, o Ibovespa cedeu mais e quase perdeu a marca dos 104 mil pontos. Na mínima intradia cedeu 2,04%, aos 104.002,75 pontos.

"O sinal de descontrole dos gastos no médio e longo prazos desagrada. A perspectiva é que vem se confirmando que será um governo mais gastador", avalia Costa.

Por aqui, o mercado ainda avalia com afinco os detalhes do novo arcabouço fiscal, enviado ontem ao Congresso Nacional. Além disso, fica no radar a tramitação da proposta na Câmara, um importante teste para o governo Lula. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) quer anunciar logo o nome do relator do arcabouço. Há favoritismo para que o relator seja do PP. O governo articula a aprovação de um requerimento para tramitação da lei complementar do arcabouço em regime de urgência.

O economista Álvaro Bandeira reconhece que a disposição em se votar o projeto rapidamente é algo positivo, mas o fato de a proposta conter 13 exceções e a dificuldade de se elevar receitas não recorrentes geram cautela. "Mas certamente algum limite de gastos é sempre melhor do que nenhum", diz em nota.

Ontem, o Ibovespa rompeu uma série de três quedas seguidas, fechando em alta de 0,14%, aos 106.163,23 pontos, ma hoje devolve, já voltando a cair na semana (-1,72%), após subir mais de 5% na passada.

"Há muitas dúvidas em relação ao cumprimento das metas do novo arcabouço e a cláusula que permite a não responsabilização pelo descumprimento das metas estipuladas é ruim", avalia Luiz Roberto Monteiro, operador da mesa institucional da Renascença. "O exterior não ajuda, as commodities caem e as ações da Vale segue perdendo suportes importantes", completa Monteiro, alertando que se o Ibovespa perder o suporte dos 104.100 pontos, pode ir para os 99.700 pontos", zona considerada crítica. Em Nova York, as bolsas caem, mas um pouco menos do que o Índice Bovespa.

Nem mesmo agradaram as palavras do secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron. Ele argumentou há pouco, à Globo News, que as exceções colocadas pelo governo ao limite de despesas do novo arcabouço fiscal são as mesmas previstas já no teto de gastos. Afirmou que o cenário central do governo aponta para a estabilização da trajetória da dívida pública a partir de 2027, considerando a curva de juros atual e a aprovação do novo arcabouço fiscal, apresentado ontem.

No exterior, os investidores seguem preocupados com a desaceleração global e com os juros altos, o que também é fator de cautela no Brasil. Por aqui, fica no centro das atenções a participação do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, em evento em Londres.

"Lá fora, a questão dos juros fica no radar em relação a aumento de juros na Europa e a pergunta é quando os Estados Unidos vão parar de subir", acrescenta o sócio fundador da Fatorial Investimentos.

No Reino Unido, o índice de preços ao consumidor (CPI) mais forte que o esperado reforça a cautela externa, diante de temores de que os juros tenham de ficar mais altos por mais tempo do esperado. Nos EUA, as atenções ficam no Livro Bege, balanços, também em meio a olhares sob a política monetária. As apostas seguem majoritárias para um aumento de 25 pontos-base dos juros pelo Federal Reserve em maio.

Às 11h37, o Ibovespa caía 1,56%, aos 104.510,41 pontos. Vale perdia 3,11%, Petrobras cedia 1,53% (PN) e 1,92% (ON), enquanto entre os grandes bancos o recuo girava em torno de 1%.

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