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Espaço Aberto – Impunidade de motoristas

Em Ribeirão Preto o motorista Marcos Aurelio Quintino, 42 anos, que atropelou e matou cinco operários na Anhanguera, teve alvará de soltura expedido em 72 horas, mesmo confessando que dirigia sob efeito de oito cápsulas de anfetaminas, o “rebite”. Nos Estados Unidos, a atriz Lindsay Lohan foi presa novamente porque, em liberdade condicional, sua tornozeleira eletrônica indicou que voltara a ingerir álcool. No Rio, o agora deputado federal Romario, parado pela Policia, se recusou pela segunda vez no ano, a fazer o teste do bafômetro. Nos Estados Unidos, o ator Mel Gibson, com apenas 0,12 ml de álcool no sangue, foi preso e depois pediu desculpas ao público pela TV.


Em São Paulo, Marcelo Malvio de Lima causou um acidente entre seu Porsche e  a camionete de uma advogada, que morreu, e recusou-se a  submeter ao bafômetro. Em Nova Orleans, o ator Nicolas Cage, apesar da fama, foi detido por embriaguez. Essa diferença entre a impunidade no Brasil e o rígido cumprimento de leis punitivas nos Estados Unidos e também em outros países, vem à baila quando, como presidente da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia – SBOT, testemunho a crescente revolta dos médicos que recebem nos Prontos Socorros os politraumatizados graves vítimas da “chacina do trânsito”, atingidas por motoristas bêbados, que não são punidos.


A indignação não é só dos ortopedistas, que se revoltam contra nossa legislação leniente.  Infelizmente, o problema do aumento da violência e da impunidade não se restringe ao trânsito. Recente pesquisa da CNI/IBOPE mostrou que 51% dos brasileiros defendem a prisão perpétua, enquanto 4 em cada 5 dizem evitam sair á noite devido à violência, e 83% defendem penas mais severas para os criminosos.Sou médico e não legislador, mas como cidadão vejo com crescente apreensão a dicotomia entre o que deseja a sociedade e o que fazem as autoridades. A sociedade deixou claro que não quer que criminosos se tornem parlamentares, mas a Justiça esvaziou o “Ficha Limpa”, num claro aviso de que a moral e a ética deste grupo é diferente daquela que os cidadãos comuns são obrigados a cumprir no dia-a-dia. A sociedade quer que criminosos contumazes e autores de crimes hediondos sejam presos, não para tentar uma recuperação impossível, como pregam os defensores dos “direitos humanos”, mas para que não tenham oportunidade de continuar a cometer os mesmos crimes hediondos.


Como cidadão eu temo pelo esvaziamento dos presídios através da libertação de apenados após o cumprimento de um terço da pena e do indulto de Natal; a prática já mostrou que fatalmente parte não voltará aos presídios e que parcela significativa aproveitará a liberdade para voltar a delinquir e a matar.A impunidade no Brasil é tão grande que em recente pesquisa elaborada pela SBOT, 31% dos jovens confessaram que dirigem “normalmente” depois de beber. Num debate sobre segurança nas estradas, recomendou-se placas figurativas ao invés de letreiros, pois sabidamente  “50% dos motoristas de caminhão não sabem ler”; como a fiscalização é falha e a obtenção de carteira de motorista é facilitada, continuam dirigindo. E provocando acidentes.Essa impunidade generalizada, contra a qual os ortopedistas e a sociedade se revoltam cada vez mais, talvez deixasse de existir se o legislador acompanhasse o cotidiano nas emergências e centros cirúrgicos, vendo o momento da confirmação da morte cerebral do acidentado.  Ou presenciasse o momento que a equipe de resgate pára de fazer a massagem cardíaca, que se tornou inútil, enquanto o BO registra apenas que o atropelador recusou o teste do bafômetro, pois a legislação determina que “ninguém é obrigado a fazer prova contra si mesmo”.  O bom-senso existe.  Empregá-lo é um dever do legislador.


 


Osvandre Lech 


Presidente da Sociedade Brasileira de Ortopedia – SBOT

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