O xerife dos fundos de pensão pretende ser mais rigoroso para evitar que se repitam casos de irregularidades no setor, como o déficit bilionário do Postalis, dos funcionários dos Correios. A Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) mapeou os planos que estão mais propensos a apresentar problemas e acompanha com lupa os investimentos, critérios para cálculos de benefício, gestão e dívidas.
Baseado na concepção internacional de supervisão baseada em riscos, a Previc adicionou a “predição” no processo de fiscalização das entidades, ao lado da orientação e da punição, com o objetivo de se antecipar aos fatos que resultam em problemas.
Para o órgão de fiscalização, é possível identificar um caminho perigoso de alto risco na forma como as entidades optam por administrar os investimentos.
“Nossa capacidade de reparar os danos causados aos participantes é muito pequena”, reconhece José Roberto Ferreira, diretor de análise técnica da Previc. Pelas regras atuais, o fundo precisa equacionar o saldo negativo, com contribuições extras dos participantes e empresas patrocinadoras, quando o déficit superar 10% das reservas ou depois de três anos consecutivos de resultado no vermelho.
No caso do rombo de R$ 5,6 bilhões do benefício definido dos funcionários dos Correios, que é o mais antigo da entidade, R$ 2,7 bilhões são derivados da má performance dos investimentos. A Previc aplicou sanções aos dirigentes do Postalis, mas mesmo assim não conseguiu evitar que os participantes também sejam obrigados a fazer contribuições extras, assim como os Correios, para saldar o déficit do plano.
No setor, a mudança de postura da Previc está sendo exemplificada com a decisão de intervir no Serpros, fundo de pensão dos funcionários do Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro). Durante seis meses, a entidade será comandada por um interventor escalado pela Previc. O órgão afirma que o sistema não apresenta problemas de risco agregado de insolvência. Além disso, diz que os 1.100 planos pagam há quase quatro décadas as obrigações assumidas com os participantes.
“A gente estava cansado de ouvir esse discurso, era preciso ver na prática”, disse José Ribeiro Pena Neto, presidente da Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp). “É preciso ter essa luz amarela para intervir e fazer as orientações necessárias de correção de rumo”, completou.
As modificações na supervisão também incluem um estreitamento do trabalho da Previc com o Banco Central, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e a Superintendência de Seguros Privados (Susep).
O governo também passará a exigir que os dirigentes passem por qualificação antes de assumir os cargos e comprovem experiência nas áreas financeira, administrativa, contábil, jurídica, de fiscalização ou de auditoria. Em breve, uma instrução normativa da Previc sobre o tema será divulgada.
“É um avanço a partir de uma tragédia”, disse Cláudia Ricaldoni, presidente da Anapar, associação que reúne os participantes de fundos de pensão. Para ela, o caso Postalis chegou ao ponto de exigir mais contribuições dos participantes e dos Correios porque as travas que impediriam investimentos arriscados foram insuficientes. “Todos erraram: Previc, Correios e participantes ao permitir sem nada fazer que o Postalis fosse tomando esses riscos desnecessários.”